Capítulo 16

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As palavras possuem poder. Elas têm uma força própria e invisível que fica ali, em algum lugar, pronta para ser sentida quando você finalmente diz. Se deixá-las na sua cabeça elas te corroem, atormentam e corrompem, mas quando ditas, o peso de todos os sons e significados saem de seus ombros porque agora o mundo ouviu a sua voz e você deve enfrentar as consequências reais de tais palavras.

Porque elas podem mover o mundo e mover a nós mesmos.

- Nós poderíamos passar para mi menor - repeti a melodia da música pela vigésima vez no violão, eu já não sentia mais a ponta dos meus dedos. - Ficou melhor, não ficou?

- Sabe o que ficaria muito bom? Dormir. - revirei os olhos, a música ainda não estava na metade! Não podíamos dormir! Mas Josh continuou - Liz, nós estamos exaustos! Não sei se consigo diferenciar um mi maior do menor.

- Nós não temos...

- Tempo, eu sei. Mas nós estamos presos aqui há doze horas, viramos a madrugada e os cochilos intercalados não servem para descanso. Eu só me sinto mais quebrado! - Johnny e Tom gemeram concordando. - Eu sei que no momento tudo o que você quer é se afogar no trabalho e esquecer da vida lá fora, mas do jeito que nós estamos, nada de produtivo vai sair daqui.

Josh tinha razão, fora que eu também me sentia cansada só não queria admitir isso. Não queria descer e encontrar minha tia e minha mãe no andar de baixo, não queria ouvir mais sermões e julgamentos por estar sendo processada por uma garota que me ofendeu e me agrediu enquanto eu estava na minha.

Elas não se importavam com a história, só sabiam que eu estava errada de qualquer forma.

Elas falaram tanto quando Isa teve que explicar o acontecimento. Continuaram a repetir como eu era irresponsável e cercada de más companhias, que eu jamais deveria ter aceitado a proposta da gravadora, que jamais deveriam ter me deixado assinar, já que eu era menor de idade. Repetiram várias vezes que eu era imatura, inconsequente e que ia acabar "como um monte desses famosos por aí", disse minha tia, e eu prefiro censurar o resto da frase para evitar ter que lembrar as palavras horríveis dirigidas a mim.

Palavras como: "viciada", "drogas" e "puta".

Eu não surtei, como era o esperado, mas eu bem ia me machucar se Johnny não tivesse segurado a minha mão quando comecei a cravar as unhas na coxa. Fora isso, eu estava estática, mas lembro da minha respiração ficar descompassada, porém, antes que eu pudesse começar a hiperventilar, Josh se pôs no meu campo de visão, encarando meus olhos e me chamando para subir.

Segui a passos lerdos com Johnny me puxando pela mão escada a cima, até o aquário. Johnny contou tudo o que pode entender para Tom, sussurrando no canto como se eu não pudesse ouvir. Josh apareceu de novo minutos depois com minha garrafa de água, mas eu já estava melhor. Ah, como estava!

Eu não ia surtar na frente de todo mundo, consegui engolir todas as minhas lágrimas e reprimir a vontade de socar e derrubar tudo até que não restasse mais nada em pé. De estática eu fui para feroz e resolvi por todo o gás, raiva e ressentimento, nas cordas do violão.

Em doze horas conseguimos uma melodia que ainda precisava ser melhorada e, após eu ter ficado calma o suficiente para traduzir todas as ofensas que sofri horas antes, Josh e eu conseguimos conectar nossos sentimentos e rabiscar alguns versos como sempre fazíamos.

Porque além de melhores amigos vindos de famílias completamente fodidas, nós também tínhamos que ser ótimos compositores juntos. A maioria das músicas dos meus dois álbuns e hits aleatórios foram compostos por nós dois.

Nós tínhamos uma conexão inegável, pessoalmente e profissionalmente. E o pessoal e profissional se misturavam de forma pura e harmoniosa contribuindo sempre para o crescimento do nosso trabalho, relacionamento e até o funcionamento da banda.

18 [Suspenso]Onde histórias criam vida. Descubra agora