Vinte e três

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Assustada, Leonor abriu os olhos, afundando-se mais ainda na água. D. Constancio estava muito confortável sentado em uma cadeira perto da janela.

- O que vosmecê faz aqui? Não tem o direito de me ver assim.

- Ora minha cara... Vamos nos casar em poucos dias. Assim que seu pai voltar. Não há nada de mais eu ver minha noiva banhar-se.

- Tem sim! Vosmecê atenta contra a minha honra.

- Honra? – ele levantou-se e pegou um punhal no cinto. Leonor estremeceu com medo do que ele podia fazer. Havia um brilho estranho no olhar de D. Constancio. Um brilho malvado, perverso.

- Tenho certeza que aquele pirata viu bem mais do que eu.

- Não sei do que vosmecê está a falar. – Leonor olhou para a água.

- Sabe não? – ele encostou o punhal no queixo dela, forçando-a a levantar a cabeça. – O pirata que se bate por vosmecê. Sempre. Ele sempre está ali, disposto até a morrer por vosmecê.

- Continuo não sabendo do que vosmecê está a falar. Hoje, aquele pirata me ouviu gritar. Eu estava prestes a ser violentada e ele, com toda a coragem e cavalheirismo, me defendeu de um bruto. – o olhar de Leonor era duro para seu noivo.

- E tenho certeza que ele teve uma boa razão para fazer isso. Eu prestei atenção em vosmecês. Não pense que eu sou burro, menina. – ele passou o punhal pela pele de Leonor, sem feri-la contudo. – Agora preste atenção em mim. Você é minha noiva. – ele frisou bem a palavra minha. – E eu não vou admitir outro homem a toca-la. Se ele continuar lhe rodeando, poderá muito bem acordar na ponta de uma corda.

Leonor sentiu o coração parar ao imaginar Thomas pendurado numa corda. A vida esvaindo-se lentamente dele. Mas a moça não pronunciou nenhuma palavra.

- Está avisada, Leonor. Se prezar o que ele fez por ti, mantenha distância dele. Sabes que eu posso providenciar isso. – tão calmamente quanto entrou, D. Constâncio saiu do aposento.

Leonor deu um soco na água.

- Não! Não! Não! – ela murmurou contra o seu reflexo tremulante. Assim estava o seu coração. Tremulo de pavor porque aquele monstro tinha a sua vida nas mãos. E tinha o poder de destruí-la se cumprisse a ameaça contra Thomas.

Por amor a ele, Leonor teria que deixá-lo.

***

A noite caiu e a lua minguante era também amiga dos amantes. Principalmente daqueles que precisavam de seu manto escuro para esgueirar-se pelas paredes.

Ao atingir a mata nos fundos da casa, Leonor procurava por aquele por quem seu coração bateria mais rápido, mas também por quem ele sangraria sem parar.

Ela sentiu um toque em seus cabelos e soube no mesmo instante que era Thomas.

- Meu amor... – ela suspirou entre os braços fortes dele.

- Minha amada. – ele a trouxe para perto de si, sorrindo ao senti-la novamente entre seus braços.

- Vosmecê está bem?

- Sim. Não se preocupes. E você? Devia estar descansando. Depois de tudo que você passou hoje...

- Não poderia faltar à tua promessa. Não poderia passar essa noite sem sentir os teus braços ao redor de mim. – ela o abraçou forte.

A Terra e o Mar - o encontro de dois mundosOnde histórias criam vida. Descubra agora