Sem Chão

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Saí para o calor do dia seguinte. Eu tinha olheiras roxíssimas por chorar a noite toda. Pelo menos, finalmente eu tinha achado um motivo para tanto ódio por parte da minha mãe. Claro, eu esperava qualquer coisa, como a depressão que ela tinha desenvolvido fosse a razão para ela me tratar mal às vezes, mas não esperava que uma coisa como aquela fosse revelada pra mim daquele jeito. Eu não sentia nada na verdade, acho que o torpor das lágrimas tinha engolido qualquer sensação de dor que eu pudesse ter. Mas era horrível, com certeza, e não era tudo. Ainda tinha meu pai usuário de drogas. Aquilo estava acabando comigo.

"Você parece cansada" Danubia disse ao entrar na sala

"Eu já disse isso a ela" Sara interveio

"Me deixem em paz, eu não preciso de babá!" Respondi seca

Eu não queria falar com ninguém. Eu só queria ficar ali, chorando e remoendo os fatos da tarde passada. Era terrível. Era opressor e estava me esmagando. Não me concentrei nas aulas do dia e Carlos também perguntara o que estava havendo. Eu o olhei, mas fiquei calada. Não sabia como e nem se era certo dividir uma coisa tão minha. O dia seguinte foi mais estranho ainda, eu não comi e mais uma vez não dormi. Fiz o máximo de esforço para evitar a todos de dentro de casa, mas não consegui

"O que houve com você querida?" Meu pai perguntou da porta do meu quarto

Não consegui olhar para ele

"Você está doente?" Ele se aproximou.

Mesmo ele tendo mentido pra mim durante dezessete anos, eu não o odiava e não queria vê-lo triste, ainda assim, eu não podia ignorar o fato da droga, suspirei e perguntei

"Porque haxixe?"

Ele ficou estupefato. Sem saída, seus olhos baixaram e logo ele cruzou as mãos sobre o colo e viu que não tinha alternativas a não ser contar

"Como soube disso?" Perguntou inseguro

"Eu ouvi sua discussão ontem. Estava na porta, não quis entrar para atrapalhar. Mas assim que ouvi haxixe, fiquei chocada o suficiente para dar uma volta e retornar mais tarde" menti. Ele já tinha problemas demais em casa para lidar com mais um

Ele pareceu aliviado. Estava na cara que não queria me fazer sofrer. Mal sabia ele que eu estava em pedaços

"Bom, é... bem, eu não tive escolha Anne, eu estava perdido" ele parecia se desculpar

"Sempre temos escolha meu rei" minha voz não era mais alta que um sussurro e uma lágrima escapou do meu olho "Você escolheu errado"

"Mas é difícil! Tente administrar uma família em crise, uma casa em decadência!" Ele se alterou e eu senti pena dele

Pela primeira vez, eu senti pena do meu pai. Isso era lamentável. O homem por quem eu devotava um enorme sentimento de respeito e gratidão, estava se destruindo sem pensar em ninguém, sem pensar em mim, sua própria filha

Lembrar que eu podia ser adotada era como uma facada. Mais uma vez eu não tive controle e algumas gotas molharam minha camisa vermelha.

"Foi por isso que não me deixou sair?" perguntei ligando os pontos

"É... sim, eles ameaçaram a familia, disseram que iam começar pela menina mais velha. foi horrível!" ele balançou a cabeça "Tudo por causa de um mal entendido"

"O que aconteceu?" Perguntei alarmada. começar pela mais velha, significava começar por mim!

"E-eu tinha uma divida, mas já consegui dinheiro suficiente para pagar, não se preocupe. vou resolver tudo" ele pegou minhas mãos "Eu sinto muito Anne, mas eu vou parar, eu juro!" Ele me abraçou e eu me afastei

Doze MesesOnde histórias criam vida. Descubra agora