O dia já tinha ido embora. Abri um olho. Eu não conhecia aquele lugar. Uma cama confortável, um criado-mudo com uma jarra de água, uma cortina branca na janela de vidro escuro. Não tinha mais nada. Nem sofás, nem poltronas. Só uma cadeira em estofado velho na minha frente
Uma lágrima desceu do meu rosto. Eu não sentia mais muita dor, mas não conseguir abrir um dos meus olhos, me deixava extremamente humilhada.
"Você devia saber Anne" o mero zumbido da voz de Luís era o suficiente para me fazer chorar ainda mais. Nem percebi que ele tinha aberto a porta.
Ele tinha presenciado a minha humilhação e agora me tratava com condescendência. Tentei respirar fundo e tenho que admitir: péssima ideia. Acho que tinha quebrado algumas costelas, pelo menos era isso que indicava as faixas que eu sentia em meu tórax.
"Carlos é temperamental quando está drogado e não gostou nadinha da sua mãe ter colocado a medida protetiva." Ele continuou diante do meu silêncio
"Eu não tenho culpa se ela é daquele jeito" falar doía muito
"Ele não bateu em você por que ela é daquele jeito. Fez isso porque tem inveja disso" ele olhou a cadeira à frente e não me viu estreitar o olho que não estava roxo e inchado
Como assim inveja? Quem é que gostaria de ter uma mãe desvairada e louca como a minha? Pra começo de conversa, nem minha mãe ela era
"Não entendi" suspirei por fim
"Carlos foi criado sem mãe Anne. Ele sente que precisava da proteção dela igual a que você tem em casa. Queria que alguém estivesse disposto a brigar por ele assim como brigam por você"
"Igual a que eu tinha" corrigi " e aquilo não era proteção. Aquilo era uma prisão e não é como se alguém brigasse por mim e sim comigo" bufei dolorosamente
"De qualquer maneira. Carlos gostaria de ter passado por tudo o que você passa em casa. Ele queria brigar com os pais por não poder sair, ou não poder namorar uma garota mais velha. Ficar bêbado nos fins de semana e levar uma bronca enorme por causa de uma nota baixa. Carlos não teve isso e com certeza você tem de sobra" ele me olhou e me encolhi. A descrição que Luís estava fazendo me fazia ficar com pena de Carlos, não com raiva
"Mas isso não justifica nada" grasnei em resposta
"Talvez não, mas tente entende-lo. Ele cresceu sozinho em meio a orgia e drogas. Os pais não estão nem aí. A violência doméstica é normal para ele. Mas Carlos não é uma pessoa horrível. A maioria das coisas ruins que ele faz é sob efeito de narcóticos, você já deve ter percebido isso." Ele parou e colocou um pé na cadeira tirando do bolso um isqueiro e logo em seguida um cigarro.
"Você não pode fumar isso aqui" balancei a cabeça de leve
"Sabe onde estamos? Bom!" Ele assentiu "fico feliz que sua mente esteja intacta" ele fez o que pareceu um sorriso, mesmo assim acendeu o baseado e abriu a janela
"Eu estou vivendo em hospitais ultimamente meu caro, não tem como não reconhecer um "mas quero ir embora" levei uma mão a cabeça que rodava um pouco
"Você só terá alta amanhã" ele estava virado para a janela soltando a fumaça na noite escura
"É, eu já percebi" suspirei "mas nós não somos o tipo de pessoas que costumam esperar muita coisa" me ajeitei debilmente na cama
"Você é o tipo de garota que me atrairia se não fosse apaixonada por Carlos" ele sorriu e se voltou pra mim
"Danubia parece preencher esse requisito também" fiz um gesto com as mãos indicando o coração dele
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Doze Meses
Teen FictionO que acontece quando todos os princípios são abandonados? Quando tudo o que você acredita desmorona bem na sua frente? Os miolos de Anne estavam em conflito. Adolescente comum, ela se sente estranha com suas roupas e seu cabelo anelado. Acredita...