Não confie em ninguém

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As medidas protetivas demoram até dois dias para serem sancionadas. Isso dependendo da vontade de quem as faz. Os meus olhos aquele dia estavam hiper vermelhos e sensíveis a luz e eu estava um pouco agitada. Tinha prometido que ia parar depois de ser demitida daquele jeito, mas não tive sucesso nem por um momento, menos de três horas depois eu tinha injetado de novo. Queria sair dali o mais rápido possível, antes que Zara chegasse da escola ou minha tia voltasse do trabalho dali dez minutos.

Comecei a juntar minhas coisas e vi que não eram muitas. Algumas camisetas, algumas calças e meias e blusas de manga longa. Carlos tinha pego o resto. As duas caixinhas douradas que eu tinha trazido de Cancún, ainda estavam dentro da cômoda. Acho que nem Zara, nem Elizabeth as receberiam. O calor estava insuportável e o suor pingava da minha testa. Estava chovendo. Eu estava ficando meio sem ar, então abri as cortinas e me sentei na cama de frente para a comoda. Uma foto do meu pai estava ali. Fazia um tempo que eu não o via e nem ia visita-lo. Talvez eu fizesse isso no fim de semana. O calor não cessava e minha boca começou a ficar seca. Eu estava pensando demais e tinha adquirido um gosto imenso por ficar com a mente vazia. Talvez devesse ter procurado centros de meditação, mas ali ao meu alcance estava uma coisa mais interessante. Tirei o fundo da gaveta de meias e vi duas seringas.

"Posso tentar imaginar Carlos" me assustei um pouco quando disse isso em voz alta, acho que porque não reconheci a voz rouca que falava por mim, mas isso logo passou e eu sorri e corri para a cozinha para pegar uma colher

Não sei quanto tempo passou, mas estava mais escuro. As coisas giravam de uma forma boa e eu via flores coloridas em volta do... meu pai?!

"O que faz aqui?" perguntei com a língua meio enrolada

"Tem alguém chegando" ele sorriu e me deu um beijo na bochecha.

Tropegamente me livrei das seringas e da colher enfiando-as dentro da bolsa com minhas coisas. Tentei me recompor o máximo que pude e quando me virei para pegar o porta retrato com a foto do meu pai, minha tia entrou no quarto. Não parecia surpresa em me ver ali

Não consegui dizer "oi". Se ela percebesse minha língua dormente ia ficar decepcionada, então acenei com a cabeça somente

"Não sabia que você vinha hoje" ela tinha recobrado um pouco da cor no rosto. Acho que é porque ela tinha se livrado de mim finalmente

"Quarenta e oito horas" foi tudo o que eu disse com a mesma voz que não reconhecia

"Talvez Anne, quem sabe..." ela parou no meio da frase quando viu as marcas em meus braços. Seu olhar quase me tocou. Arrancou os óculos escuros que eu estava usando e sua expressão não poderia ter ficado mais perplexa.

"Desculpe eu não posso, preciso ir embora" passei por ela arrastando a bolsa que sequer tinha rodas

Ela me segurou na saída

"Pare de se matar ANNE, pelo amor de Deus, PARE de se matar. Ouça, se você quiser, podemos procurar uma clinica para você. Sara já ofereceu a ajuda necessária porque os pais dela passam por isso, você bem sabe. Por favor Anne" ela implorou

Eu estava tão chapada que simplesmente sorri e acenei devagar, os olhos meio revirados e os braços moles. Será que ela sabia que Sara não queria me ver nem pintada de ouro?

"Obri.ga.da" balancei a cabeça de um lado para o outro.

Mesmo que na minha cabeça eu tivesse acabado de assinar minha sentença de morte, eu não conseguia sentir absolutamente nada, além de um grande vazio. Olhei nos olhos da minha tia e me lembrei de nossos momentos engraçados juntas e de como ela tinha me defendido a respeito de muita coisa sem saber que estaria completamente errada alguns meses depois. 

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⏰ Última atualização: Apr 18, 2019 ⏰

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