A segunda visita

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Ele olha para a sala mas não vê ninguém.O grito pareceu ter vindo do seu quarto e ele vai investigar; quando olha, há uma pessoa na frente do grande espelho que há no cômodo.A pessoa está vestida com um manto branco e parada olhando para ele.Ela parece ser familiar.

-Calma amigo, se você vai roubar alguma coisa pode levar e ir embora, não vou resistir – diz Sócrates

-Roubar? – sorri o homem – Pelo contrário amigo, eu vim lhe trazer algo que você perdeu há algum tempo atrás.

- O que?

-Sua esperança.

Sócrates olha para o manto do indivíduo, e fica encarando-o por algum tempo.

- Você tá chapado cara? – pergunta Sócrates

- Você está perguntando de uma maneira indireta, se eu não estou conseguindo perceber a realidade direito?

- É... mais ou menos.

- Se for assim amigo, todas as pessoas estão chapadas, com variações de pessoa para pessoa, dependendo do seu grau de conhecimento.

- Acho que você bebeu muito amigo, e acabou comprando uma fantasia para alguma festa muito louca... enfim, saia da minha casa caso contrário eu vou chamar a polícia.

- Eu estou aqui há muito tempo meu caro... mais do que você imagina.

- Claro, a casa estava escura e você aproveitou.Vamos , vamos sai daqui.- Sócrates tenta puxar o homem, porém sua mão passa direto pelo corpo dele, como se ele fosse apenas uma imagem de holograma.

Sócrates fica espantado.O homem está olhando-o fixamente com um pequeno sorriso.Sócrates olha a estranha figura por um tempo, olha para as paredes e para o chão, tentando entender o que está acontecendo.

- Esse é o sonho mais doido que eu já tive!

O homem coloca o seu dedo indicador na testa de Sócrates.

- Dentro dos seus sonhos, o sentido do tato não funciona.

Sócrates fica perplexo.

- Quem é você? – pergunta assustado.

-Você quer saber por que chegou ao ponto de querer se matar?Quer saber por que você vive engolfado pela solidão?Quer tentar achar um outro caminho para poder continuar sua vida?

Sócrates abaixa o seu olhar.

- Não há motivo para minha vida continuar.

- Por quê?

- Porque não consegui realizar nenhum dos meus sonhos, sou um completo fracassado.

- E só porque não conseguiu fazer aquilo que queria, quer por fim a sua vida?E desde quando a realidade precisa prestar contas para os seus sonhos?Pelo contrário, são os seus sonhos que precisam prestar contas para a realidade.Quando as pessoas sonham, na maioria das vezes desconhecem como a realidade funciona e quais serão os obstáculos que vão enfrentar.No mundo das ideias pessoal existem apenas as regras que você conhece.Mesmo que você não tenha conseguido chegar aonde queria, existem vários outros caminhos que podem ser percorridos e podem lhe trazer tanta felicidade quanto o caminho que você idealizou.

O homem percebe que Sócrates ainda está com dúvidas.

- Para saber por que você chegou a essa situação é preciso que você conheça a si mesmo; é preciso que você entenda como as suas escolhas lhe afetaram.Você foi vítima de si mesmo; foi o principal culpado da sua frustação e seria o seu próprio assassino.

- Eu fui culpado?Eu tentei de todas as formas que pude!

- Eu disse que você foi o principal culpado, não o único.

- Como você sabe tanto?

- Eu acompanho você a muito tempo... para você poder saber o que eu sei, precisa conhecer uma pessoa melhor.

- Quem?

O homem gentilmente puxa Sócrates pelo braço e coloca-o de frente para o espelho; apontando para o reflexo, o homem diz:

- Ele.

Sócrates olha para seu próprio reflexo, e depois olha para o homem.

- Eu o convido a fazer uma viagem única, uma auto descoberta que pode ser ora prazerosa, ora dolorosa; convido-o a fazer com que os seus sentidos se voltem para dentro de você mesmo, fazendo-o com que enxergue o mundo interno da mesma maneira que o mundo externo ao menos uma vez; eu o convido a fazer com que sua consciência faça não uma reflexão, mas sim uma imersão sobre si mesmo.Eu o convido... a descobrir você mesmo.

Após falar, o homem entra no espelho, que por sua vez parece possuir uma superfície idêntica a da água; pequenas ondas se formam a partir do lugar que o homem de manto branco entrou, como um dedo que acaba de tocar a superfície de um lago.As ondas batem nas bordas do espelho e voltam para o meio, sumindo.Sócrates está parado, perplexo e assustado; ele olha para os lados e olha para o espelho.Ele encara o seu próprio reflexo como se fosse alguém que ele não conhece direito; lentamente, estende a sua mão e então toca a superfície do espelho, porém o dedo passa direto, não encontrando uma superfície sólida, mas sim líquida, com uma temperatura morna.Ele recolhe seu braço, respira fundo e entra no espelho.

Os EspelhosOnde histórias criam vida. Descubra agora