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Christopher Wayne



Quando ouvi o som das vozes abaixo das escadas, a primeira coisa que me veio em mente foi a partida dela. Dulce sempre foi um poço de mistério para mim, mesmo quando eu achava que a tinha em minhas mãos, algo sempre nos afastava. Era como uma lei da física, onde o retorno é certo e intangível.

Pus uma blusa bem rápido deixando para terminar de abotoá-la no meio do corredor. Eu não queria correr e parecer desesperado, mas já estava fazendo isso involuntariamente. Assim que me contive na beira dos degraus eu a vi de longe, próxima da porta, arrastando a última mala. Ela não conseguiu evitar de olhar para cima, exatamente na minha direção. Nossos olhares foram lentos, demorados, um pouco deprimidos. Quase desci para tentar impedi-la mais uma única vez. Tentar recuperar os seus sentimentos antes que fosse tarde, mas não, eu já tinha feito o bastante e atingido meu limite.

Então, em uma última despedida, Dulce me mostrou um sorriso cheio da sua fria gratidão, e baixou a cabeça andando para fora. Permaneci ali, parado, por mais alguns minutos, mesmo depois de saber que ela já teria atravessado os muros do terreno e que com certeza tinha pegado a rodovia.

Samantha entrou de repente, me encarando controlada. Por fim sai do transe e andei rumo ao meu escritório. Ela me seguiu, sendo ignorada e ignorando o fato do meu humor estar em um ápice desagradável. Entramos juntos na sala, mas foi ela quem se encarregou de fechar a porta assim que me sentei por trás da mesa sem sustentar um contato visual entre nós.

- Precisamos conversar, Wayne - disse convicta.

- Faça isso rápido, no momento não estou com muita disposição para conversas longas.

- Na verdade nem sei se vai ser uma conversa propriamente dita. Só preciso te comunicar de um fato, e não sei se a ninfeta já fez isso.

- Pare de chamá-la assim Samantha - Tentei repreendê-la.

- Se preocupe com o que tenho para falar.

- Então fale de uma vez.

- Ela entrou em contato com meu sobrinho ontem à noite, e logo em seguida ele fez as malas.

Samantha conseguiu minha atenção instantemente após dizer tudo aquilo. Me recostei na cadeira, controlei a respiração e enlacei as mãos, apoiando os cotovelos.

- Theo viajou?

- Não só viajou, como foi com Dulce para a Califórnia.

- O que quer dizer com isso? Seja bem objetiva comigo. Supõe alguma coisa?

Silenciosa, a morena puxou a cadeira a minha frente e sentou.

No fim das contas, a conversa se tornou longa.

Dulce

O caminho era mesmo muito longo até minha casa. Dentro do avião, eu me espreguicei na poltrona e olhei através da pequena janela oval admirando as nuvens que mais pareciam um monte de algodoes doces flutuantes - automaticamente projetei na mente a memória de um dia em que comi algodão doce e corri, aos dez anos, em um parque de diversões mesmo ao som das reclamações dos meus pais - Não me importaria mais de ouvi-los reclamar, na verdade eu daria tudo para escutar suas vozes nem que fosse por uma última vez.

O homem voltou do banheiro, e na mesma hora seu polegar limpou o meu rosto quando se sentou ao meu lado.

Theo tinha uma feição tão confortável que quanto mais ele se aproximava, mais o meu corpo se acomodava tranquilo.

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