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Eu vi alguém disposto a tudo em meio a cortina de fumaça e desordem...

Christopher Wayne tinha olhos diabólicos enquanto disparava aquela pistola, visivelmente preparado, treinado e sem ressentimentos.

A minha dor física era quase esquecida por mim todas as vezes que as mesmas imagens se repetiam na minha cabeça, sem interrupção. Em algumas delas lembrei do próprio incidente em que me tornei uma órfã, e refleti o quanto a vida era irônica. Os assassinos estavam mortos, mas mesmo assim eu não me sentia em paz com nada, porque era como se todos ao meu redor estivessem dispostos a desaparecer.

Reabri os olhos devagar rejeitando o fato de ainda estar viva. Minhas mãos pesavam, e por isso, eu as ergui para poder vê-las. Ambas estavam enfaixadas e cobertas demais para analisar os estragos. Chorei recordando do cheiro podre de carne queimada que exalava por todos os lugares, inclusive em mim mesma. Aquele cheiro parecia estar entranhado na minha pele.

— Fique calma, já passou.

Virei para encará-lo logo após escutar a sua voz. Não notei a presença de Christopher ali em momento algum. Ele estava silencioso me observando sofrer e esvaecer sozinha; por preferência cômoda. Envergonhada, tentei limpar minhas lágrimas com o pulso, mas ao fazer isso experimentei uma dor intensa. Vendo a minha reação instintiva, Wayne foi para o meu lado e tirou um lenço de dentro do casaco usando-o para me tocar.

— Deixe que eu faça isso — Acrescentou, enxugando cada resquício de amargura restante em mim.

Seu olhar, diferente do que vi pela última vez, parecia bem mais afetivo.

— A-Anna... onde ela...

— Não pense nisso agora. Tente se recuperar.

— Aquela mulher me salvou, — Reforcei, renovando a angústia — e eu nem sequer lembrava dela.

Voltei a chorar, soluçante, e ao presenciar isso Wayne me deitou em seu peito. Sentado na beirada do meu leito, fui acolhida em seus braços e envolvida por ele com força. Era como se o homem me segurasse diante de um precipício onde pudéssemos cair a qualquer momento.

Durante os intervalos do meu descanso vez ou outra virava a vista e procurava por Wayne, e sempre que fazia isso me encontrava com a imagem dele deitado em uma das poltronas do quarto, algumas vezes dormindo, outras lendo ou usando o celular, mas sempre ali, presente ao meu lado.

Em um desses despertar Christopher sumiu e eu não pude conter a efeito imediato de uma solidão absurdamente esmagadora me consumir. Ainda procurando por ele fui surpreendida por uma mulher morena, alta e muito elegante entrando no quarto com uma calma um pouco invejável. Eu não sabia quem ela era, e nem nunca a tinha visto. No primeiro momento senti um temor, porém, passou assim que vi o policial guiando-a até mim, se afastando logo depois.

— Olá Dulce, como se sente hoje?

— Hoje? — Rebati confusa com o tempo e espaço.

— Já faz um tempinho que está internada. Coisa de cinco ou seis dias, não posso ser certa quanto a isso porque subi hoje pela manhã do seu estado.

— E quem seria você?

— A única pessoa que mais chamava você de ninfeta, e engraçado eu estar feliz com o seu bem-estar — ela riu ao expor isso, mas eu permaneci séria — Meu nome é Samantha, sou a tia de Theo e amiga de Wayne.

— Theo? — Me senti mal ao ouvir o nome dele. Fui egoísta em esquecê-lo durante aqueles dias — Onde ele está? Não se feriu?

— Ele não corre perigo.

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