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Minha pele foi abraçada pelo contato com o tecido leve e confortável do vestido. Mal consegui respirar até o último botão na minha costa ser fechado. Quando expirei ofegante a mulher que me arrumava assumiu uma expressão de alarme.

Sente-se bem, senhorita? Está muito apertado?

Talvez ficaria apertado se o meu bebê ainda estivesse ali. Dei um riso satisfeito com o motivo da preocupação dela, mas logo respondi.

— Estou muito bem. Apenas ansiosa.

Era o dia do meu casamento mesmo sendo difícil de acreditar. Foi estranho relembrar de todas as coisas que aconteceram comigo naquele mesmo ano. Tudo o que perdi e ganhei. Todas as aflições. Meu pai não poderia me levar até o altar como sempre sonhei, e minha mãe era incapaz de segurar minha mão naquele momento de tanto nervosismo, simplesmente para dizer que tudo ficaria bem. Uma lágrima discreta correu pelo meu rosto, mas Júlia logo me entregou um pedaço de algodão sem dizer uma só palavra. Enxuguei essa e todas as outras que vieram.

Casar tão nova não parecia certo. Eu ainda ia fazer dezenove anos. Sempre ouvi pessoas falar sobre essas decisões precipitadas. Mas como eu poderia recusar ou sequer ignorar tudo o que sentia? Christopher Wayne fazia parte de mim. Era minha família, e principalmente, o homem que eu mais amava. Eu não queria precisar viver sem ele.

Wayne foi rápido e organizou ao meu lado todos os detalhes daquela cerimonia em apenas três dias. Seria algo simples no píer da casa que dava acesso à beira do mar. Nos casaríamos no final da tarde quando o sol já não fosse tão agressivo e a luz seria tênue. Apenas ele, eu e o tabelião. Mais uma vez a vontade de ter meus pais ali me afligiram. Meu futuro marido também não tinha uma opção familiar plausível. Até nisso nossas vidas lamentavelmente se completavam.

Ainda perdida nas minhas ilusões, fui surpreendida com o som do retorno da mulher ao quarto.

— Me desculpe pela demora, mas foi difícil acha-lo no meio de tantos objetos empoeirados. — Não podia julgá-la, pois nem havia percebido sua cautelosa ausência.

Ela segurava nas mãos uma coroa de flores cor de rosa e brancas, entrelaçadas em uma espécie de cipó. Seu sorriso satisfeito me deixou curiosa. Júlia parecia muito empolgada com o casamento. Nós conversamos bastante durante a preparação. Ela sempre dava sugestões e me aconselhava. Ficamos próximas, quase íntimas, naqueles dias.

— É muito bonito. Você que fez?

— Sim — disse orgulhosa — Minha filha se casou usando isto.

— Onde ela está agora?

— Bem longe — percebendo minha apatia repentina ela logo se corrigiu — Não é o que a senhora está pensando! Ela agora mora na Espanha.

Um fio de alívio me consumiu. Aquela reação automática já era causada pelos traumas de tantas mortes e perdas. Até me atrevi a sorrir ao pensar assim. Eu precisava virar essa página.

— Imagino que sinta muita saudade.

— Ah, sim. Quando lhe vi nesse vestido, tão linda e jovem, lembrei que ela se casou com a mesma idade.

Assim que ela citou o vestido me virei frente ao espelho mais uma vez e me pus a analisar minha escolha. Era um modelo longo com uma calda pequena, sem muito volume. Sua cintura era marca por uma faixa e o busto era totalmente trabalhado em bordado, renda e um belo decote. As alças médias seguravam bem todo o arranjo. Atrás o tule foi completamente revestido de bordado e botões perolados. Exatamente como sempre fantasiei.

— Não sei se minha mãe ficaria tão feliz de me ver casando agora.

— Porque pensa assim, senhorita?

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