Capítulo Quatro

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A televisão ainda estava ligada quando Jack chegou. Fechando a porta sem nenhuma delicadeza, ele se enfiou pra dentro de casa, tateando no escuro, até encontrar a parede e apoiar-se nela. Dulce estava deitada no sofá, adormecida, com um frasco de remédios ao seu lado. Jack pensou que ela estivesse apagada devido aos calmantes e que certamente não notaria sua chegada, mas com o estrondo da porta, ela acabou despertando.

— Que horas são? – Dulce perguntou coçando os olhos com as costas da mão e sentando-se. — Jack? Que horas são?

— Por que não está no quarto? – ele evitou a pergunta dela. — Onde está Julian?

Dulce levantou-se e ficou tonta, o cheiro de álcool que vinha de seu marido era forte demais para ignorar.

— Eu o coloquei pra dormir há horas... Saberia disso se estivesse em casa, cuidando do seu filho!

— Esse é o seu dever! Pra isso você é mãe dele! – ele rebateu, a voz embolada, enquanto ia para a cozinha. Dulce apanhou seu robe e o seguiu. — O que é isso?

Dulce seguiu o olhar do marido e viu que ele apontava pra caixa de pizza sobre a mesa que ela tinha esquecido de jogar fora.

— Eu acabei esquecendo de jogar isso fora...

— O que está esperando? – ele disse abrindo a geladeira e retirando uma garrafa de leite de dentro dela. — Como se não bastasse encher o meu filho de besteira, de junk food... eu sou obrigado a chegar cansado em casa e ver tudo revirado! Esse lugar está ficando uma zona! Você está relaxando, mulher!

— Não vai acontecer de novo, eu prometo. – Dulce baixou a cabeça, sentindo o olhar pesado do marido sobre si, enquanto ele tomava seu leite em silêncio. Os silêncios de Jack nunca indicavam nada positivo.

— Eu já disse como as coisas tem que ser, mas você insiste em me contrariar! Eu não quero uma casa desorganizada. Eu não consigo pensar, eu não consigo relaxar numa casa assim! Você precisa entender que tudo o que eu quero é o bem da nossa família... quero que você me espere cheirosa e receptiva como sempre foi, mas você não ajuda! Você parece piorar a cada dia! Todos os dias com essa cara fechada! Cada vez menos amorosa! Não... Isso não tá certo! – ele falou em voz baixa, quase um sussurro, antes de jogar o copo de vidro contra a parede com uma brutalidade absurda. O copo passou rente à cabeça de Dulce e por pouco não a acertou. O leite escorria pela parede atrás da advogada. Ela encolheu-se de medo.

— Pai... mãe? – a voz de Julian veio do fim do corredor e Dulce imediatamente virou-se para ver o filho parado no batente da porta do seu quarto, vestindo seu pijama do Star Wars e abraçado ao Sr Cochilo, seu urso de pelúcia favorito. Deus, ele era novo demais pra ver aquele tipo de circo de horrores.

— Meu amor... meu príncipe, volte para o seu quarto, sim? – ela parou em frente ao menino, fazendo uma barreira com o corpo para que a criança não visse seu pai naquele estado de embriaguez. — Mamãe vai terminar de arrumar a cozinha e depois eu vou ler uma história daquele livro que você gosta, tudo bem? Aquele da capa azul com as letras douradas. O que me diz?

— Eu ouvi um barulho... o que quebrou, mamãe? – Julian perguntou, tentando ver o que acontecia atrás da mãe.

— Eu quebrei um copo, meu anjo. – mentiu, afagando os cabelos do filho. — A mamãe é uma desastrada! Mas eu vou limpar caquinho por caquinho pra você não se machucar amanhã, ok?

— Tudo bem, mamãe... eu te amo. – ele disse, envolvendo Dulce em um abraço apertado com aqueles pequenos bracinhos, enquanto ela depositava um beijo estalado na bochecha do filho.

Dulce respirou aliviada quando viu a porta do quarto do filho fechar-se. Só então voltou-se para o marido, que continuava com o semblante de sempre, como se nada houvesse acontecido.

— Eu não aguento mais isso, Jack.

— O quê? – ele perguntou acendendo um cigarro e dando uma tragada profunda.

— Tudo isso... é insustentável! – ela fez um sinal vago com a mão. — Você não me ama, isso que você sente... não é amor, não pode ser amor!

— Você não sabe o que está dizendo, Dulce! – ele aproximou-se dela e Dulce quis dar um passo pra trás criando algum espaço entre eles, mas suas costas bateram contra a parede. — Você está cansada e com sono... amanhã vai se arrepender das bobagens que me disse hoje!

— Você não pode continuar fingindo que estamos bem... que isso tudo é normal!

— Nós estamos bem... – ele a beijou de lábios e ela sentiu o gosto do álcool e do tabaco, seu estômago estava revirado e ela deve ter feito cara de nojo. — O que há? Você não quer que eu a toque? Está me negando seus carinhos? Seu corpo? Enlouqueceu, meu amor? Você é minha, lembra? Você pertence a mim!! – ele gritou a última frase e Dulce virou o rosto, cerrando os olhos com força, temendo o que veria se encarasse o marido de frente.

— Me solte, por favor... – ela falou entre os dentes. — Já teve sua diversão por hoje. Deixe-me dormir, pense no Julian!

— NÃO METE O MEU FILHO NO MEIO, VAGABUNDA!

Ela esperou o tapa, mas o que veio foi muito pior, aproveitando que ela estava com o rosto virado e de olhos fechados, Jack achou por bem apagar o cigarro no braço dela. Dulce gritou de dor, mas a queimação foi passageira, mesmo assim ela teve forças para cravar as unhas no braço do marido e aproveitar a distração dele para correr e se trancar no quarto do filho.

— Mãe? – ele perguntou, acendendo o abajur.

— Filho, será que a mamãe pode dormir aqui com você hoje? – Dulce já deitava-se ao lado do filho, o braço ainda queimando, mas as feridas em seu coração eram ainda piores.

— Medo de monstros, mamãe? – o menino deu espaço para a mãe e ela o abraçou, relaxando um pouco por estar ao lado da pessoa mais importante em sua vida.

— Sim, Julian. – ela assentiu, sentindo lágrimas formarem-se em seus olhos. — Medo de monstros.

NOTA DA AUTORA

Então, a Dulce está passando por uma mega barra que infelizmente é a realidade de muitas mulheres na vida real.

Esse é um tema delicado, complexo e importante que espero tratar com a seriedade necessária nessa fic.

No mais, conheçam Julian, o filho da Dulce e bolinho mais fofo de todos! Espere muito dele por aqui ainda!

xoxo

Alice

#BFF  - A fábrica de sonhosOnde histórias criam vida. Descubra agora