~~ 37 ~~

5.6K 363 28
                                    

Na manhã seguinte era natal. A magia do natal parecia estar em todo o lado, desde as casas carregadas de enfeites de natal às casas que contentavam-se com uma simples árvore. Quando me levantei, um sorriso apareceu nos meus lábios. Bastou saber que era natal para ficar alegre. Olhei para o meu lado e um certo preguiçoso ainda estava ferrado no sono. Deixei-o estar como um presente de natal. Fui para a sala e foi impossível não sorrir ao ver as luzes da pequena árvore de natal no canto a piscarem.

- Apenas perfeito. - Sentei-me no sofá a observar a sequência das luzes de natal enquanto bebia uma caneca de leite quente.

- Já de pé? É natal, fica na cama mais tempo. - Peter reclama ainda a rastejar os pés pelo chão.

- Tu podias ter ficado. Eu apenas gosto de acordar cedo. - Tomei mais um gole que soube igualmente bem ao do primeiro.

- Eu bem que quero, mas acordei ao sentir a tua falta e tu sabes como eu não consigo adormecer depois de acordar. - Rio como se isso fosse verdade. - Bom dia. - Ele beija a minha cara. - Qual é o pequeno almoço?

- Faz tu. - Murmuro e logo a seguir oiço um leve grito.

- Bolachas! - Ele agarra o tabuleiro da mesa e leva-o para o sofá sentando-se ao meu lado. - Queres uma? - Ele pergunta com uma já na boca, uma imagem fofa até.

Eu tirei uma bolacha, molhei-a no leite e levei à boca. Pouco depois, ele faz o mesmo. Macaco de imitação. Ficámos os dois sentados no sofá a observar a árvore enquanto comíamos as bolachas. Eu não desgosto destes momentos de silêncio. Não precisamos de estar a conversar ou a fazer algo para estarmos bem. Falando nisso, por vezes preferia que ele ficasse calado e sossegado do que estar a chatear-me.

- Compraste uma prenda? - Peter engasga-se e percebi logo a sua resposta. - Que espanto... Ainda bem que pensei no assunto. - Tirei o saco encostado ao sofá.

- Quando é que compraste? - Ele pegou no saco e tentou perceber apalpando todos os cantos.

- Aproveitei quando fui às compras com a Hannah e a Rachel. Já agora, é um walkman. Encontrei-o numa loja de eletrónica e pensei logo nela.

- Ela estava sempre a falar de como não podia ouvir as músicas de que ela tanto gosta. Boa ideia, Lay. Não me admira que sejas a favorita. - Dou-lhe um leve tabefe.

- Não digas isso. Sabes que ela também te vê como um filho. - Ele esfrega a cabeça.

- Continuas a ser a favorita e de qualquer maneira... - Ele aproxima-se de mim e sussurra. - Eu sou o teu marido.

Coro de repente e pouso logo a caneca para dar-lhe uma valente porrada, mas ele tinha previsto isso e fugiu para a cozinha. Fui atrás dele mesmo assim e ficamos algum tempo nessa brincadeira de apanhada como se tivéssemos voltado aos nossos anos de crianças a brincar no parque.

Algumas horas depois, os compromissos apareceram e fomos para o carro. Peter não se calava enquanto conduzia. Pensava que era mais costume ser o passageiro que irrita o condutor. Foi uma alegria acima do comum quando finalmente chegámos ao hospital. Deixámos o carro um pouco longe da entrada devido à falta de lugares. Nada fora do comum a estas horas num hospital. Entrámos e fomos diretos à entrada falar com uma enfermeira. Facilitou-nos o trabalho ao reconhecer a enfermeira.

- Bom dia, meninos. Vieram fazer mais uma visita? - Ela levanta-se e vem cumprimentar-nos.

- Sempre que possível, claro. - Cumprimentámo-nos com uns beijos na cara enquanto com o Peter foi um bom apertado abraço.

- É sempre bom ver-te Jenny... - Peter disse num tom sarcástico, mas era obvio que era brincadeira.

- Sigam-me então que eu levos até ela. Pelo caminho, Layla. - Ela aproxima-me dela com um braço atrás de mim. - Ouvi dizer que arranjaste emprego. Conta-me como é que é, miúda! - Começo a rir forçado a tentar pensar em algo normal para lhe dizer.

Foi um pouco complicado falar com ela sobre o trabalho de criada para uma família rica em que sou a criada pessoal de um miúdo mimado pervertido. Quando penso no que lhe dizer, apenas me surgem aqueles momentos com Chris de que ninguém deve saber. Ainda bem que tive três meses sem ele para arranjar material para lhe dar. Ela estava estranhamente entusiasmada com a novidade. Nós conhecemo-nos porque ela é enfermeira que toma conta da minha mãe. Como visitámos várias vezes, acabamos por conversar e formar uma certa relação de amigas.

- Senhora Collins, tem visitas. - Ela saiu da sala com um sorriso e deixou-nos entrar logo a seguir.

- Queridos. O que fazem aqui? Deviam estar com os vossos amigos, não com esta velhinha.

Desde que ela está neste estado, ela reclama quando a vimos visitar e de como devíamos passar o tempo com as pessoas da nossa idade e não com uma velha como ela. Ela nem tem cabelos brancos, de onde veio essa da velha? Mas é mesmo a atitude dela que me motiva a ir mais em frente. Sempre que venho-a visitar ela mete sempre o sorriso dela no rosto e nunca o larga até que deixemos o quarto. Eu suspeitava que ela fizesse isso, mas com a aproximação à Jenny, confirmei as minhas suspeitas. Não há maior motivação que saber o que ela faz por nós mesmo presa àquela cama.

- Mãe... Não precisamos de uma única razão para vir cá. Também não há motivo mais importante que vir-te visitar. - Aproximo-me dela e dou-lhe um beijo na cara. Suspiro ao ver o sorriso do costume. - Como tens passado, mãe?

- O mesmo de sempre, querida. Mas não te preocupes com coisas banais. A Jenny está sempre ao meu lado e toma conta de mim. Preocupa-te antes em concentrares-te no teu novo trabalho. - Olho de lado para Peter que desviou o olhar ao aperceber-se do erro.

- O meu trabalho vai muito bem. Antes disso, prefiro passar algum tempo com a minha mãe quando tenho tempo livre. - Sento-me na cadeira ao lado da cama. - E deixa-te de coisas, mãe. É Natal, deixa os sermões para outra visita, sim?

Ela fica a olhar para mim um pouco surpreendida com a minha atitude. Ela pensa um pouco antes de responder. Eu sorrio ao ver um pouco de sinceridade no sorriso dela. Peter aproxima-se e fica ao meu lado. Eu pego na minha mala e tiro a prenda. Ela desembrulha com cuidado e fica surpreendida ao ver o aparelho. Ela olha para nós um pouco chateada por termos gasto dinheiro em algo para ela.

- Estivemos a falar e o Peter encontrou-o numa loja no centro comercial. Não olhes assim para nós.

- É obvio que sabes que aquilo é mentira e que foi ela que comprou, mas eu ainda fiz algo de jeito. - Ele pousa uma caixa de cartão em cima da cama. - Trouxe todas as cassetes de música que tinhas lá em casa.

- Não era preciso nada disto, queridos. - Ela agarrou a minha cara e beijou a minha testa e esticou os braços à espera que Peter se aproxime para lhe dar também um beijo na testa. - Obrigada. - Soube bem vê-la entretida à procura da primeira música que ia ouvir.

A conversa veio depois e ficámos lá ainda algumas horas até chegar o fim da horário de visitas. Despedimo-nos e fomos embora de volta para o nosso cantinho. Eu quero e gosto de fazer estas visitas ao hospital ver como está a minha mãe, mas era frequente sair transtornada. Ficava ainda pior por saber que não conseguia dar-lhe a companhia que ela merece.

- Voltamos amanhã? - Olhei para Peter que sorria para mim enquanto esperávamos no meio do trânsito.

- Odeio que leias a minha mente. - Ele abraçou-me e beijou a minha testa enquanto umas lágrimas corriam pela minha cara.

- Também te amo. - E assim foi o nosso dia de Natal.

Criada de um MilionárioOnde histórias criam vida. Descubra agora