Pedido

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Angelique Beaumont

Aberração.

Em toda a minha vida eu fui chamada de muitas coisas, mas dessa vez foi a que mais doeu.

Talvez porque eu não esperava que ele fosse falar algo assim para mim, e talvez porque eu gosto dele e me importo com o que ele pensa de mim.

Eu voltei para o meu quarto, caminhando no corredor e arrastando o lençol enrolado em meu corpo pelo chão como se fosse o resto da minha dignidade.

Quando cheguei na porta do quarto de Bart e da minha mãe eu vi que ele ainda está acordado. Ele olhou para mim e estendeu a sua mão para que eu fosse até ele.

Mas eu não fui.

Isso me machucou mas eu dei as costas para o meu padrasto e entrei no meu quarto. Fechei a porta e tranquei para que ele não tentasse entrar.

Quando eu passei pelo meu espelho apoiado na parede, eu soltei o lençol e encarei o meu reflexo com lágrimas nos olhos... Eu sou mesmo uma aberração.

Forcei a minha barriga para dentro e toquei os meus ossos aparentes... Depois esfreguei as minhas mãos pelo meu corpo com toda a minha força e apertei-me inteira até que doesse, apertei entre as minhas coxas e quis que eu sumisse... Tive vontade de gritar, e eu gritei, internamente.

Perdi as minhas forças e deixei o meu corpo cair no chão... Então eu senti as lágrimas escorrerem pelo meu rosto até pingarem no chão.

Olhei para o espelho outra vez, mas agora outra coisa chamou a minha atenção... O corte quase curado na minha perna... Lembrei-me da sensação dolorosa de quando o Christopher bateu o carro dele contra mim e fez uma peça da minha bicicleta me cortar profundamente.

Eu nunca me senti tão viva...

Toquei o meu ombro e lembrei-me do outro corte que ganhei no labirinto, praticamente não senti porque eu estava completamente mergulhada na mais pura adrenalina. Percebi que me machucar me fazia sentir melhor de alguma forma.

Levantei-me do chão e caminhei até o meu banheiro. Procurei desesperadamente em minhas coisas algo que pudesse me cortar...

Não encontrei.

Comecei a me desesperar porque precisava muito disso, mas me lembrei de outra coisa...

Voltei para o quarto e abri o meu guarda-roupa, no fundo dele peguei uma caixa grande onde eu guardo os meus utensílios de jardinagem. Tudo foi muito rápido, quando eu percebi eu já estava com enxertador na mão.

Eu saí do meu quarto mesmo que mamãe tenha pedido para ficar lá dentro. Ela está dando uma festa aqui e os seus amigos todos estão aqui.

Espiei no fim do corredor e ouvi risadas... Um homem está em cima de uma mesa e está coberto apenas por uma folha de uma das minhas plantas. Todos estão assistindo ele e se divertindo.

O homem está dizendo algumas coisas que eu não entendo muito bem, mas as palavras soam muito bonitas e parece uma musica não cantada.

Ele fala e todos escutam com atenção, depois um ou outro dá risada.

— Doce menina — Ele estendeu a mão para mim — Você tem algo para complementar o meu não muito bem feito poema?

Todos olharam na minha direção.

— Angelique — Minha mãe riu. Ela parece um pouco diferente... — Volta para o seu quarto!

— Deixa ela ficar, Madeleine — O homem que está ao lado da minha mãe disse — Ela já é crescida. Está na hora de prepará-la para a vida...

Cicatrizes de Ouro (Grátis até final de dezembro 2022)Onde histórias criam vida. Descubra agora