Nove

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— O que é que a senhorita está pensando? — Me pergunta novamente, já que fiquei quieta da primeira vez — Não sei que tipo de escola costumava frequentar, mas essa aqui possui regras que devem ser respeitadas. Achou que vadiaria durante a minha aula e ficaria por isso mesmo?

— Como se outros alunos não cabulassem a sua aula. — Digo baixinho, mas Marina olha-me com mais raiva, o que indica que escutou muito bem o que acabou de ser dito por mim.

— O que? Como se atreve a dizer isso? Pensei que fosse melhor que isso, senhorita Machado.

— Pelo modo como tem me tratado, com certeza não pensava que eu fosse "melhor do que isso".

— A senhorita quer arrumar problemas comigo? Pois está conseguindo.

— Mesmo que eu não quisesse arrumar problemas, a professora os inventaria. Porque é isso que tem feito. Trata-me mal sem ao menos ter motivos para isso.

— Eu tenho um motivo: estava cabulando a minha aula.

— Olha, eu estava cabulando sua aula mesmo. Ok? Ligue para os meus pais, me expulse da escola por isso. Faça o que bem entender, mas eu não vou mais ouvir seus desaforos, porque a professora sabe que não é disso que estou falando — Digo já me dirigindo à saída da sala.

— Eu não mandei você sair. Você me deve explicações. — Diz se encostando a mão na porta para impedir a minha passagem.

— Eu já disse que estava cabulando, é só isso. Não há mais nada a ser dito.

— Qual o problema da minha aula?

— Não é que a aula em si tenha algum problema... De todas as matérias que tenho, Língua Portuguesa é a que mais gosto — digo num tom mais calmo — e senhora sabe disso, mas...

— "Mas" o que, senhorita Machado? — pergunta interrompendo-me

— É isso. — Pela primeira vez altero a minha voz e solto aquilo que me causa descontentamento — Essa coisa que está acontecendo agora me desagrada muito. Por que eu ficaria na aula de alguém que me trata tão mal? Sinceramente, eu não te entendo. Caramba, para de me chamar de "senhorita Machado". Você sabe que não gosto quando faz isso. E por... — começo a tropeçar nas palavras, pois tento conter um choro — por que vem me tratando mal? O que foi que... — novamente uma tentativa de reprimir o choro, mas dessa vez não consigo — que eu fiz?

Meus olhos já marejados começam a derramar lágrimas. Essas lágrimas não são de raiva. Nada disso tem a ver com raiva, pelo menos não para mim. É tristeza. Tristeza por saber que a única pessoa que conseguiu – mesmo que involuntariamente – fazer meu coração bater mais depressa, é a causadora de uma aflição muito forte. Minha única reação, diante do que as minhas emoções provocam, é levar as mãos até o rosto e permito-me chorar baixinho. Quando dou por mim, mãos e braços quentes envolvem meu corpo. O perfume doce instala-se ao meu redor. Tiro as mãos do rosto e vejo os cabelos avermelhados. Retribuo o abraço de Marina, embora não devesse fazer isso. Sem pensar muito, coloco os braços ao redor do seu pescoço. Sinto melhor o seu perfume. Tenho em minhas mãos sua pele quente. Suas sardinhas que há tempos ansiava tocar. Aproximo mais os nossos corpos, abraço-lhe mais forte e ela retribui. Uma mistura de êxtase e estranhamento invade o meu ser.

— Me desculpe, Clarinha. — A voz que instantes atrás era autoritária e cheia de raiva se esvai para dar lugar a uma melódica voz. — Não chore, menina.

Devagar, Marina afasta os nossos corpos, me olha e passa seus delicados dedos em minhas bochechas com a intenção de limpar as lágrimas. Fecho os olhos com o intuito de melhor sentir o seu toque em minha face. Esse simples contato arrepia o pelo minha nuca. Depois que as lágrimas se vão, recebo outro abraço, mas neste, Marina apoia minha cabeça sob seu peito e afaga meus cabelos. Envolvo sua cintura com meus braços. E esta união de dois corpos torna-se mais intensa para mim, pois consigo ouvir as batidas de seu coração. Batidas tão rápidas quanto as minhas.

Amar é Preciso | ⚢Onde histórias criam vida. Descubra agora