Nessa noite conheci a verdadeira Marina, aquela cujas memórias a fazem sofrer e que se sentiu confortável o suficiente para dividi-las comigo. Essa fria noite de domingo é um marco em nossa relação, não há como negar. Ficamos até muito tarde conversando e assim pude entender certos aspectos de sua personalidade. O fato dela ter se fechado completamente, por exemplo, se deveu ao fato do primo de Ricardo tê-la exposto e assim sua relação com Babi ter sido reduzida a fragmentos. Babi quando levou à sério as palavras do parente, passou a fazer da vida de Marina um verdadeiro inferno. Repetiu de ano, foi expulsa do colégio e, para tentar mantê-la na linha, Marina a matriculou onde está agora. Como não queria misturar a vida pessoal e a profissional, mãe e filha concordaram que apenas no corpo docente deveria saber sobre o laço familiar que possuíam.
Babi é uma peça difícil no quebra-cabeça que é a vida de Marina. Diante tudo o que me foi dito, fica parecendo que uma simples e significante palavra paira sobre sua cabeça: Ingratidão. Me pergunto como não consegue ver tudo o que Marina fez por ela. Foi abandonada pela mãe, resignada pelo pai, acolhida por Marina e não conhece reconhecer esse gesto de bondade. Por falar pai, o asco que sinto pelo Ricardo não tem tamanho. Como pode simplesmente ter feito o que fez com a própria filha? Como consegue, tranquilamente, dormir todas as noites sabendo que deixou a filha a própria sorte no mundo. Que senão fosse pela esposa, era bem provável que a filha nem mesmo tivesse sobrevivido?
Diante disso tudo, a pessoa que carrega o fardo dos erros alheios é Marina. O peso das falhas de outrem está sobre seus ombros e ela nunca o compartilhou com ninguém antes de mim. Carregou isso por anos, sozinha.
Ela costuma dizer que sua relação com a filha tem melhorado porque estou entre elas como se fosse um elo e agora desejo mais do que tudo uni-las de verdade, mesmo que para isso seja necessário ainda lhe esconder sua real origem, afinal se até agora Marina preferiu fingir não saber dos atos de Ricardo, não serei a pessoa a ir contra o que ela tem feito. Contar ou não é uma decisão sua e não minha.
∞
Após muito tempo, pegamos o elevador rumo ao seu apartamento. Paramos em frente a porta e Marina, após se certificar que não havia ninguém no corredor, pega minha mão com ternura.
— Obrigada por ter entrado na minha vida. Você me faz um bem que não tem tamanho.
— Só quero cuidar de você, Mari. Te amo.
— Te amo.
Com a mão livre, toca em minha bochecha e depois me dá um selinho.
Ela abre a porta e após entramos na sala, escutamos passos oriundos da cozinha. Damos de cara com Babi, toda sonolenta, com um copo de água nas mãos. Resmunga alguma coisa sobre o frio e o porquê de estamos fora do apartamento a essas horas. Digo que estava passando mal e por isso Marina e eu fomos dar uma volta, uma desculpa que ela parece engolir, mas não gosto de dar.
Ignorando a presença da mãe, Babi apenas segura minha mão e me leva ao seu quarto para finalmente irmos dormir. Ao longe, ouço um "boa noite" vindo de Marina. Olho para ela e lhe sorrio.
∞
Acordo na manhã seguinte com Babi me dando um empurrão e dizendo que se não me levantar, nos atrasaremos. Em cima da cama há minha mochila e uma sacola com algumas roupas. Bianca, com toda a certeza, havia deixado essas coisas mais cedo.
Babi vai se arrumar no banheiro e enquanto isso, tomo coragem para levantar da cama quando sinto um corpo pequenino e jogando em cima de mim. Depois de fazer algumas cócegas em Yoko, nos sentamos na cama.
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Amar é Preciso | ⚢
RomanceO que acontece quando uma adolescente se apaixona por sua professora? E se não for um sentimento mútuo? Mas... e se for? Juntos, conheceremos a Ana Clara Machado e Marina Amaral, aluna e professora, respectivamente, e o que resultará da aproximação...