1 - prólogo

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Março de 2020

00h50min

Duas figuras no edifício mais alto da cidade sentaram-se à beirada da laje, descansando os pés no abismo, ao relento. Uma delas era o Governador. A outra era um homem um tanto mafioso, vestindo sobretudo e chapéu, ambos pretos.

Bem de longe ouvia-se a sirene de uma única viatura.

A cidade estava silenciosa, mas não era um silêncio de calma ou de medo. Era mais como um vazio, como se o mundo tivesse parado de respirar. Nada mal para o primeiro dia do Outono. Estava frio, ainda mais ali em cima; o vento soprava forte e a umidade era pouca. A maioria da população já havia pelo menos deitado para dormir ou tentar. A minoria era o porquê da maioria não conseguir dormir direito. Estava quieto, mas havia um sentimento tênue no ar de instabilidade. Alguém de fora jamais perceberia; às vezes era similar a uma paisagem, um retrato contemporâneo, aparentemente bonito.

Mas o chefe de estado estava longe de estar satisfeito. Debaixo do terno de giz preto, havia um homem muito velho para sua idade. As olheiras em seu rosto significavam noites de insônia pensando em algo importante, desaprovando. Ele estava inquieto, cansado.

Ultimamente pensava sobre várias coisas. Bem, seus pensamentos tinham algo em comum: o perturbavam. Dúvidas, questionamentos, problemas... Naquele momento, por exemplo, ele se perguntava se lá fora era mesmo muito ruim como diziam. Onde era pior? Bem, o passado, com tudo de ruim que tinha, era bem atraente atualmente.

Mas a origem daquela perturbação ainda era recente, e ele nunca esquecera.

- Faz dois anos. - ele disse. - E eu ainda tenho medo.

Embora não fossem colegas ou algo assim, o estadista sabia que ele entendia sobre o que estava falando. Não sabia como, mas tinha uma impressão de compatibilidade vindo dele, mesmo sendo apenas um homem de negócios. Como haviam se aproximado mesmo? Conseguia se lembrar nitidamente de seu poder de persuasão, o dom que tinha com as palavras. Ele soara imponente de uma forma única e isso o impressionara naquela hora de instabilidade total. Em pouco tempo, ele já havia reagido, como se já esperasse...

Mas o que contava mesmo era que ele estava lá mesmo. Ele sabia a razão daquilo, ele presenciara a fagulha transformar-se num incêndio.

- Nem os executores sabem que estamos aqui. Por que tamanho sigilo?

- Tenho analisado o conteúdo do relatório dos executores, Sr. Governador. Eles cumpriram seu papel. - fez uma pausa. - Mas nem eles podem realizar certos feitos.

- Está se referindo... a eles? - havia uma clara nota amargurada, como se ele quisesse evitar falar daquilo.

O silêncio que veio depois foi diferente para ambos. Para o Governador, foi como aquela expectativa comum antes de ouvir uma resposta muito boa ou muito ruim. Por outro lado, para o outro homem, foi realmente uma confirmação sobre algo que já esperava.

- O senhor consegue ver então. Nesse estado, essa cidade irá sucumbir muito em breve. - soltou o outro homem, a frase soando que nem sentença final. Apesar disso, ele não fora seco. Houve algum sentimento triste sutil na estrutura da frase, de comoção, como um deus observando a queda de sua criação com pesar.

Ao passo que o Governador ficou mesmo aturdido.

- Não pode ser. - disse, e depois cobriu a boca, censurando a si. Se assemelhava a alguém que ouviu o final trágico de uma história e mesmo sabendo que tudo levava a aquilo, prosseguia incrédulo.

Não era preocupação que o movia, era o medo e o egoísmo.

Ele concatenou. Os jornais daquela época eram mesmo assustadores. Bem piores. Talvez os redatores não tivessem escrúpulos para melhorar o jeito que contavam os fatos, opinava. Não havia jeito. O mundo era menor, mais restrito, mais fechado. Não tinha os mesmos ares. Antes era possível sonhar mesmo vendo a casa cair, e isso foi arrancado.

Máscara Negra - ImpactoOnde histórias criam vida. Descubra agora