desculpar

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Emma.

Era engraçado como Mason gostava do nome dela. E do sobrenome alemão. Alihür. Ela tinha um outro sobrenome também. Era latino, do México. Mendoza. Emma Alihür Mendoza. Isso era muito legal porque a maioria das pessoas nos EUA, incluindo ele, tinha apenas um sobrenome. Mas ela não, ela tinha dois.

Seus traços eram muito americanos. Devia ser porque o avô dela, o alemão, casou com a avó americana. E a outra avó, mexicana, casou com um americano também. E aí de estrangeiro só ficaram os sobrenomes. E a mente. Que parecia de outro universo.

Adorava o filtro que Emma tinha para o mundo. E a forma como ela recebia o que chegava. O jeito com que cuidava das pessoas. E a maneira como conseguia surpreendê-lo.

Mason sempre esteve perto de pessoas quebradas. Porque elas o entendiam melhor. As pessoas quebradas geralmente são as que, assim como ele, se afundam em substâncias para que se sintam melhores dentro de suas peles. São as que se entregam aos prazeres e à futilidade de bens materiais porque já não há mais outra coisa fazendo sentido.

Talvez Emma fizesse parte desse grupo. Ela tinha partes nela que não funcionavam tão bem e ele viu de perto como seu sorriso escondia a solidão que tinha do lado de dentro. Mas Emma era diferente daquelas pessoas. Diferente dele.

Porque ela trazia paz. Nunca caos.

Quando ele saiu da casa da tia depois de ouvir toda a verdade sobre sua história, ele foi beber.

E bebeu como não bebia há anos. Porque precisava encontrar sentido. Porque precisava sentir qualquer coisa que não fosse aquela confusão toda. Porque, talvez, fosse tudo que ele soubesse fazer.

Uma garrafa. Duas. Três. Se possível, ele estava ainda mais assustado. Não funcionava mais. Não era assim que aquele Mason resolvia seus problemas.

Na verdade, ele nuca resolveu nada. Só foi acumulando. Acumulando. Acumulando. E, de repente, uma tonelada caiu em cima dele.

Mason pensou que não aguentaria. E, por um segundo, ele quis desistir de tudo.

Mas aí ele escutou a voz dela pelo telefone.

E foi a primeira vez que ele sentiu que era alguém. Porque estava apaixonado.

A vontade de desistir de tudo foi embora. Não por ela. Mas por ele e as novas sensações que sentia. Era um mundo novo. Um Mason novo. Um Mason que sentia coisas bonitas. E ele gostava daquele Mason.

Salão de festas lotado. Flores. Cortinas. Casamento.

Estava colocando champanhe em sua taça enquanto viajava em suas reflexões. Enquanto viajava dentro de si mesmo.

Os parentes distantes olhavam pra ele, tentando disfarçar. Mas ele notava. E até gostava dos olhares.

Estranho seria se eles não notassem o sobrinho/neto que voltou a Minnesota depois de anos. E pela segunda vez no ano.

Sabia que alguns deles não gostavam dele. Afinal, da última vez que o viram ele era um adolescente problemático se afundando na cocaína. Mas também sabia que outros o olhavam com carinho. Tinha gente ali que estava feliz por ele ter saído daquela vida.

Era estranho estar em um evento familiar. Aquelas pessoas, supostamente, deveriam ser próximas dele, mas não eram. Estavam ali por Lauren e Bianco. Eles finalmente iriam oficializar o casamento.

Última semana de férias. Não pensou que voltaria tão cedo à sua terra natal. Mas a segunda visita foi essencial.

Ele não tinha mais verdades para escutar e agora podia, simplesmente, aproveitar o tempo frio com a família.

Estava lá há dois dias. Iria embora no dia seguinte.

Dias. Vinte e quatro horas. Tempo suficiente para quebrar alguém. Mas, quem é que sabe quanto tempo leva pra ficar inteiro outra vez?

Enquanto bebia o líquido da taça, olhou em volta. Parecia procurar alguém.

Lembrou-se do dia anterior: saindo do hotel em que estava hospedado e indo à pé por aquele mesmo caminho... Virando a esquina, mas diferente daquela tarde, sem correr desesperado. Andando devagar. Dessa vez, ele não assistia seu coração sendo estraçalhado pela morte.

Talvez ele até lidasse melhor com gente morrendo agora.

Parou em frente a casa. Placa de "vende-se". Suspirou. Sentou nos degraus da frente. Fechou os olhos e deixou o ar adentrar suas narinas, devagar. Olhou em volta. Quase podia ver o pequeno Mason correndo por aquela rua, brincando com Jim ou Scott, os garotos que pararam de ser amigos dele porque ele era estranho. E depois aquele Mason crescendo. Virando adolescente. Trazendo garotas para casa e gostando dos beijos vazios e fúteis no sofá. Não queria lembrar do próximo Mason. Sabia que era triste lembrar dele. Mas era inevitável. O terceiro ano, o último ano. Drogas. Madrugadas. Álcool. Falta de memória.

— Imbecil.

Mas tudo bem. Toda aquela dor fazia sentido. Finalmente.

E só fazia sentido porque ele se permitiu navegar nas próprias dores. Se permitiu entender o que lhe fazia sangrar. E, assim e só assim, como fazer a dor parar.

E foi a dor que fez dele, ele. E Mason podia jurar que nunca gostou tanto de existir. De ser quem era.

Levantou. Olhou a casa pela última vez. Nostalgia era saber de cor o caminho de volta pra casa. Não sorriu, mas, em silêncio, se desculpou com seu passado. Se desculpou com a casa. Com o tio. E agradeceu ao pai, aos tios e aos avós por nunca desistirem dele.

Era hora de deixar aquilo tudo para trás. Dessa vez, de verdade. Do jeito certo. Sem esquecer de levar as coisas boas.

Voltou para o hotel. Quarto 23. Abriu a porta com o cartão-chave. Ficou olhando pra ela.

Seu recomeço estava ali, sentada no sofá da sala, lendo um livro em espanhol que nem em sonho ele saberia o nome.

— Você conseguiu, não foi? — ela disse depois de um tempo, percebendo que ele estava ali.

Mason sorriu. Um Sorriso sincero. Um sorriso vencedor. E ela entendeu.

— Eu sabia que conseguiria!

Levantou quase correndo. Ele a tomou nos braços. Se beijaram. Estavam muito felizes um pelo outro.

Piscou forte. Voltou do transe. Olhou o salão mais uma vez, procurando sua acompanhante.

Sentiu os dedos dela encaixando nos seus. E logo em seguida sua cabeça tocando, levemente, seu braço.

— Você também sente que, se eu e você fôssemos um filme, esse seria o final feliz?— ela disse, observando além do salão. Observando todo o caminho até ali. Observando todo o trajeto, voltas e pulos que deram até então.

Ele a olhou. Era uma pergunta curiosa. Mas ele sabia a resposta.

— Não... — sorriu — Ainda não dissemos eu te amo.

Uma História Sobre RecomeçosOnde histórias criam vida. Descubra agora