2. Gauthier Company

285 122 632
                                    

II

Ele se sentia atraído por ela, o que era natural, dada a sua aparência e indícios de personalidade. Todos os dias, ele a via correndo para chegar ao café a tempo e todas as noites observava sua postura cansada e, ainda assim, ela sempre lhe oferecia algo com um sorriso gentil.

Na manhã seguinte, enquanto cruzava a esquina, alguém trombou nele com força o suficiente para fazê-lo perder o equilíbrio, olhou para baixo, massageando a barriga e parou em surpresa ao perceber que era ela. Seu cabelo estava meio bagunçado e ela obviamente saiu correndo de casa, uma vez que suas meias eram de cores diferentes, uma preta e outra azul marinho.

Ela ficou vermelha com o constrangimento e levantou-se antes que pudesse lhe oferecer ajuda, era a primeira vez que ficava de pé ao lado dela, nunca percebera quão baixinha era, de forma que meramente alcançava seus ombros. Ele a ouviu sussurrar um pedido de desculpas e perguntou se ele estava bem.

Uma emoção há muito esquecida passou por ele. Ele se sentiu divertido pela situação inesperada e genuinamente sorriu quando viu que ela iria embora sem um dos sapatos. Agachou-se e a calçou antes que pudesse pensar no que diabos estava fazendo, levantou-se novamente e hesitou, aguardando uma reação negativa. As pessoas não gostavam que mendigos lhes tocassem.

Não tinha a intenção de invadir seu espaço ou intimidá-la. Mas para seu alívio, ela apenas corou, agradeceu e foi embora.

Ainda a observou cruzar a rua e entrar no café pela rua lateral, poucos minutos depois, apareceu pela vitrine da frente, preparando o local para ser aberto.

Naquela mesma noite, ele também a seguiu e se manteve longe. Então viu um homem de capuz sair das sombras do outro lado da rua vazia, cruzar rapidamente a pista e a segurar pela nuca, empurrando-a. Levou vários segundos para Gauthier sair do estado de choque, seu coração bateu mais rápido e adrenalina subiu por suas veias enquanto corria para frente, não era um mero assaltante e ele sabia disso, aquele homem a estava seguindo há dias.

Raiva e medo pelo que poderia acontecer com ela o impulsionaram, na entrada do beco planejou gritar para fazê-lo fugir com medo de ser pego, mas congelou no lugar ao ver que ele estava com uma lâmina contra sua garganta, se gritasse, ele poderia matá-la facilmente. Estava pensando desesperadamente no que fazer quando a viu, surpreso, empurrar o pulso do homem com a lâmina para longe de seu pescoço, ao mesmo tempo em que lhe deu uma joelhada.

Ela começou a correr para fora do beco, ele viu o homem amaldiçoar e começar a correr atrás dela. Reagiu imediatamente, correndo em direção do homem que pretendia machucá-la, pouco se importando se iria acabar ferido ou morto.

Para sua sorte, o homem parecia bêbado e não era um bom lutador, não recebeu nenhum dano enquanto o derrubava facilmente e desferia socos para incapacitá-lo. Notou vagamente que ela voltou para o beco e chutou o canivete para longe do homem.

Quando o bêbado perdeu a consciência, sangue sujava sua mão e os nós de seus dedos doíam. Cuidadosamente recolheu o canivete e a carteira do homem, pretendendo entregá-los para a polícia. Virou-se para ela, que estava muito pálida e tremendo – ela estava em choque e, com razão, afinal poderia ter sido estuprada e morta. Ele estremeceu com a perspectiva e afastou os pensamentos sombrios.

Tocou em seus ombros lenta e gentilmente, certificando-se que ela estava bem e que ele não era uma ameaça, até perceber que o sangue em sua mão poderia manchá-la.

Guiou-a para fora do beco da forma mais suave que pôde, seguindo despretensiosamente o trajeto para seu prédio. Naquele horário não seria bom para ela permanecer na rua enquanto a polícia chegava. Com a identidade do homem, a polícia poderia facilmente encontrá-lo, caso ele acordasse e fugisse.

Onde as lágrimas repousam [Concluído]Onde histórias criam vida. Descubra agora