46. Despedidas

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Ouço sinos e minha cabeça dói pra caralho. Tudo roda quando abro os olhos, então decido mantê-los fechados. Minha boca está seca, e a ponta da minha língua tem gosto metálico.

Escuto um bip interminável que ecoa nas paredes de meu cérebro solto.

— Oi querido — reconheço a voz, Anna.

— Oi... — digo.

— Você está bem? Quer que eu chame a enfermeira?

— O que houve? — não lembro como vim parar ali. É o quarto de um hospital.

— Ah, querido — vejo Anna abatida, com o olhar profundo de dias não dormidos — você levou um tiro no coração. É um milagre ter sobrevivido. Os médicos abriram seu peito, e conseguiram remover a bala e seus fragmentos.

Passo as mãos sobre o tórax, estão cheios de curativos. Olho em volta, para minha melhor amiga cansada e me pergunto a quanto tempo estou aqui. Puxo na memória as últimas lembranças.

— Seu ex patrão atirou em você. Consegue se lembrar? — pergunta ela. Faço que sim com a cabeça. A cena do Sr. Louis pulando do penhasco ainda parece um pesadelo distante — ele não sobreviveu à queda.

É errado me sentir aliviado? Aquele homem era um monstro, me queria morto. Não consigo sentir compaixão, mas não queria que ele morresse. Sr. Louis deveria pagar por seus crimes em vida.

— Os policiais — continua Anna, com um olhar mais animado dessa vez — encontraram o gravador.

Gravador no qual peguei com Marcos antes de ir para a mansão dos Louis. Era um plano arriscado, e eu achei que conseguiria sair de lá ileso e com uma confissão feita. O Sr, Louis sempre subestimou minha inteligência. Achei que contaria algo.

— Ele não falou muita coisa — lembro dos momentos de terror em flash's.

— Mas foi suficiente para abrir um inquérito, e... — há mais coisa, mas ela hesita por alguns milésimos de segundos— a arma é a mesma que matou Carla. Então, mesmo não tendo uma confissão concreta, ele agora é o principal suspeito.

— Isso quer dizer...

— Júnior contou tudo. Sobre as ameaças de morte, as chantagens, e que mentiu para salvar você... Ele ainda vai responder por obstrução de provas e falso testemunho mas nada comparado a ser preso por assassinato.

Há um júbilo crescendo em meu peito dolorido.

— Ele está aqui? — não consigo evitar perguntar.

Mas logo me arrependo. Anna murcha e desvia o olhar. Ele não está aqui. O gosto metálico ganha novos contornos em meus lábios. É claro que estou decepcionado.

— Dê um tempo à ele, tá legal? Júnior passou por muita coisa. Mesmo que aquele velho escroto fosse um monstro abominável, ainda era o pai dele. Não é errado sentir luto.

— Eu sei, só...achei que ele estaria aqui. Ele sempre esteve.

Anna afaga minha mão e sussurra um "eu sei querido" em consolo.

Evan entra no quarto, e leva um susto ao me ver acordado. Seus olhos brilham e ele começa a chorar, correndo em minha direção. O choque dele em cima de mim me faz soltar uma arfada de dor.

— Cuidado seu caipira — adverte Anna e todos rimos.

Nunca vi Evan chorar.

— Eu vou te prender a correntes quando eu sair de casa, seu idiota — nunca o vi falando daquele jeito, mas sei que é a emoção do momento.

O Filho Do Meu Patrão (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora