Mary Kennedy (Small Chapter)

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Anna mantinha vigilância em frente ao quarto de John. Ela poderia parecer forte, sempre paciente e nunca ser pessimista quando uma tragédia assim acontecia, mas quem conseguiria ver no interior de seu coração? Anna por dentro estava desesperada, devastada. Seu melhor amigo naquela situação, correndo risco de vida. Júnior chegou, aflito como nos últimos dias. Disse para ela descansar assim como a garota fazia com ele inúmeras vezes durante todas essas duas semanas que se passaram. Um cuidava do outro, como um time. Estava cansada demais para negar, dias sem dormir direito, seria apenas por alguns minutos... então ela deitou na poltrona verde, não era confortável mas pelo cansaço aquele era o melhor lugar do mundo naquele instante. Anna caiu no sono tão rapidamente. Era bom ter um momento só pra si mesma.

Sempre depois de uma tempestade vem a calmaria, mas algum dia ela termina. Talvez o sol apareça, ou talvez a tempestade volte. Mas são raras as vezes em que coisas ruins se repetem seguidamente. Nem toda tempestade é sinônimo de devastação. As vezes coisas ruins acontecem apenas para unir as pessoas ainda mais ou afastá-las de vez.

Um grito vindo da direção do quarto a acordou quase que imediatamente, Anna em um pulo e alguns passos descompensados estava na porta do quarto para ver o que estava acontecendo, quando viu John de olhos abertos e Júnior chorando de felicidade segurando seu rosto. O susto se converteu em alegria quase que no mesmo instante, logo eram os três abraçados, juntos, como uma família que acabara de passar uma das piores fases de suas vidas, o que não era totalmente mentira.

Um vulto chamou a atenção de Anna pela enorme janela de vidro do quarto. Era Mary, mãe de John. No momento em que ela apareceu na porta Júnior deu um beijo na boca de John.

Oh, não Mary, pensou Anna.

A reação da mulher não poderia ter sido a pior. Ela saiu em disparada pelo corredor e Anna foi atrás, dando a desculpa de que chamaria o médico. Mas não teve certeza se os dois a tinham visto. Ela realmente chamaria o médico mas não era uma de suas prioridades naquele momento. John estava bem agora, o pior já tinha passado.

— Mary! — gritou Anna — Espere.

A garota de cabelos loiros conseguiu alcançar a mulher no final do corredor.

— Onde você está indo? — perguntou Anna.

— Eu...eu vou embora — ela estava nervosa, suas mãos segurando o cappuccino tremiam freneticamente. Toda aquela reação seria porque viu o filho beijando outro homem? Talvez. Anna conhecia Mary desde quando tinha cinco anos, sabia como a mãe de John era conservadora. Anna conhecia a história dela, apesar de seu modo de pensar medieval, entendia de certa forma seus motivos.

— Seu filho acabou de acordar de um coma — lembrou a garota.

— Mas agora ele está bem — a mulher de meia idade falava mais pra ela mesma do que pra Anna.

— E você simplesmente vai embora? Sem nem ao menos se despedir dele?

— Ele está muito bem acompanhado — disse a mulher não em um tom de ódio ou nojo, mas seus olhos castanhos haviam um brilho diferente, uma tristeza profunda.

— Você é a mãe dele. É importante pra ele, mais do que imagina. Deixe seu preconceito de lado pelo menos uma vez na vida.

— Isso não é preconceito — indagou a mulher — eu não tenho mais direito de participar da vida dele. Não depois de tudo que eu fiz — a amargura fez sua voz falhar.

— Isso não é verdade. Ele te ama e sempre vai amar. Mary...

Uma lágrima desceu de seu olho direito, a amargura também em suas expressões marcadas pelo tempo. Aquele era o rosto do orgulho, mas também era o rosto do sofrimento, ambos tão unidos em apenas um sentimento que nem Anna e nem a própria Mary saberia distinguir qual falava mais alto. John também nunca conseguiu distinguir os sentimentos da mãe. Mary era uma mulher cujo a mente era um mistério para todos, até para ela mesma.

— Você já fugiu tanto Mary. Pelo menos uma vez na vida, encare de frente isso. Não é um estranho que está lá, é seu filho. Não fuja daquilo que você acha ser um problema.

— Você acha mesmo que encaro tudo isso como um problema?

— Não importa a minha opinião. Seu filho fugiu por achar que você pensa assim dele. Por achar que você o odeia.

Mary parecia ofendida.

— Eu nunca o odiei. Por Deus. O que o fizeram pensar isso? — disse a mulher se referindo também à Júnior. Ele deixou claro inúmeras vezes o que pensava dela. Mas Mary nunca odiou seu filho.

— Talvez as brigas — sugeriu Anna, já irritada àquela altura com tudo que passou e com os nervos à flor da pele — ou os momentos em que você o julgou sem nem mesmo conhecer a verdade dele. Sem nem mesmo parar para ver se ele sofria com tudo aquilo.

— Talvez minhas atitudes não tenham sido o que ele esperava.

Anna riu ironicamente.

— Pelo contrário Mary, por ele te conhecer tão bem sabia exatamente como você reagiria a noticia dele ser gay. Só que em seu coração houve uma esperança de você ser diferente, de algum milagre impossível acontecer e você aceitá-lo. Você sempre reclamou sobre a falta de fé de seu filho, mas nunca reparou que John tinha fé, não em um deus, mas em você.

Aquilo fez Mary chorar. Uma dor dilacerante em seu peito a queimou por dentro, como uma chama em meio a gasolina. A consumia rapidamente e no final disso tudo não deixaria qualquer vestígio.

— Não cometa o mesmo erro. Por favor — implorou Anna.

Mas o muro da indiferença à essa altura já estava construído. Há pessoas que não mudam nunca, mesmo querendo, pois estão tão conformadas com seu velho "eu" que se transformar em uma nova pessoa seria um processo muito doloroso. E para Mary, sentir a dor da distância do filho doeria menos que a dor da mudança de seus princípios.

— Adeus Anna. Cuide dele pra mim.

Então a mulher partiu. Para sempre.

O Filho Do Meu Patrão (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora