Um Homem Incompleto - Irmãs Cadwell Livro 1

Capítulo I

Março de 1810

Para Charles aquela era mais uma manhã tediosa e totalmente deprimente confinado em seu grande e escuro quarto.

Fischer - na opinião de Charles - era o mordomo mais fuxiqueiro e impertinente do mundo! Ele invadia seu quarto sem ao menos se dar ao trabalho de ser educado e bater na porta antes de entrar e se dirigir ás janelas tagarelando sobre o quanto o dia estava agradável lá fora e que abrir um pouco aquelas cortinas para fazer com que a luz do sol e um pouco de ar adentrassem o quarto lhe faria bem. Mas Charles não encontrava uma justificativa plausível para tal afirmação, como o sol ou um pouco de ar fresco poderiam ajudar se não podiam fazê-lo voltar a andar normalmente? Se não o permitiriam ter longas horas de caminhada no bosque como ele gostava de fazer quando mais jovem, de que adiantava tudo aquilo?

- Feche as janelas, Fischer! - ordenou o homem piscando algumas vezes para se acostumar com a iluminação.

- Mas senhor o dia...

- Por Deus Fischer! Me poupe de seu discurso otimista, ao menos por hoje!

- Pois não irei fechá-las - Fischer cruzou os braços batendo a ponta do sapato freneticamente no chão.

- Ora Fischer! Obedeça se não...

- Se não o senhor me demite? Se me permite refrescar-te a memória seu pai foi quem me contratou para cuidar de você e creio que ele não me demitirá por fazer o meu trabalho - o mordomo deu de ombros enquanto organizava as roupas espalhadas pelo chão.

Charles lhe lançou um olhar tão afiado que Fischer por um momento agradeceu por aquele homem estar nas condições em que estava para não ter a chance de esganá-lo... um minuto depois se amaldiçoou amargamente por ter pensamentos tão abomináveis.

- Se eu trabalho é tornar minha vida um inferno ainda maior do que já é, acredite, você o faz com bastante competência!

O mordomo ignorou o comentário arrogante de Charles e foi em direção a porta.

- Irei buscar sua refeição.

- Não há necessidade - a voz alta de Eliot preencheu o cômodo.

Ele entrou no quarto trazendo consigo uma bandeja com um copo de leite acompanhado pelos biscoitos amanteigados que Charles fazia questão de comer todas as manhãs.

- A que devo a honrosa visita de meu glorioso pai a estas horas do dia? - perguntou Charles irônico, pois, o pai só costumava passar em seu quarto alguns minutos antes de dormir para se certificar de tudo, o que era um alívio para ele por ser poupado da presença do velho na maior parte do tempo.

Eliot revirou os olhos, seu filho tinha uma capacidade absurdamente irritante de ser inconveniente!

- Como está a perna?

- Vá direto ao assunto, meu adorável pai - alfinetou ele e logo em seguida enfiou um biscoito inteiro na boca acompanhado por um gole de leite.

- Charles! - O tom de Eliot era ameaçador - Responda-me com o devido respeito!

Charles suspirou derrotado.

- Está a mesma - ele disse - Meu joelho ainda dói e as feridas não estão cicatrizando.

Há pouco mais de uma semana, a empregada - Madeline, uma velha que se havia neste mundo alguém mais hostil que Charles Fretcher, esse alguém era ela - insistiu que precisava que ele saísse do quarto para que pudesse limpá-lo. Charles - após muito discutir com a velha - foi vencido e em meio a resmungos, concordou.

Pensou em ir à biblioteca buscar alguns exemplares de leitura para pôr no móvel ao lado de sua cama, quando parou ao lado da grande escada de sua casa e um súbito pensamento rondou sua mente, uma ideia brilhante - ao seu ponto de vista - que colocaria um fim em todo seu sofrimento e naquela vida deprimente. Porém os acontecimentos que se seguiram não ocorreram como planejado, ele não bateu a cabeça com força como desejava que acontecesse e seu corpo chegou ao final da escada completamente ensanguentado... Se ele permanecesse ali teria grandes chances de morrer e se sentiu aliviado por isso, porém, alguns minutos depois um dos criados de seu pai passou pela sala trazendo alguns toalhas empilhadas e o encontrou, atrapalhando completamente os planos do jovem de acabar com a própria vida.