Sete Dias I

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***Miguel

Era uma manhã de sábado, sete dias haviam se passado desde o dia mais triste em que eu me recordava de minha existência.

Eu, como de costume, mal havia pregado os olhos durante a noite. Como eu sentia falta de uma bela noite de sono... Isso agora, parecia ser apenas um desejo inalcançável pra mim. A saudade de Thales me apertava o peito cada vez mais a cada dia. Eu não via uma luz ao fim do túnel.

Me levantei da cama, caminhei até às cortinas, as abrindo em seguida. Lá fora, o tempo estava encoberto. Um grande tapete branco cobria toda a extensão do chão devido às nevascas que caíram sem trégua nos dias anteriores. Eu não podia deixar de achar aquilo bonito, me lembrava do baixinho, ele que tanto amava a neve...

Fui para o banheiro e fiz meu ritual de toda manhã. Escovei meus dentes, tomei um bom banho de água quente e em seguida, já vestido com um de meus roupões, sequei meus cabelos com o auxílio de um secador.

Saí do banheiro e me sentei na cama... Fiquei por alguns minutos encarando o nada. Várias coisas me passavam pela cabeça naquele momento.
O som de chamada do meu celular me trouxe de volta à realidade. Peguei o mesmo sobre o colchão e olhei no visor de quem era a ligação.

Confesso que fiquei bastante curioso a princípio... O número não estava salvo em meus contatos. Eu, de certo modo, fiquei na dúvida entre atender ou não. Mas depois de alguns instantes pensando, deslizei o dedo pelo visor atendendo à chamada:

- Alô?

- Miguel? - Perguntou a voz feminina que me parecia um tanto familiar do outro lado da linha.

- Sim, eu mesmo! Quem fala?

- É a Suzana. - Quando ela disse seu nome eu fiquei ainda mais surpreso.

- Ah... Oi... - Eu não sabia o que falar. Seria péssimo e totalmente sem sentido se eu perguntasse se estava tudo bem.

- É... - Ela parecia estar procurando as palavras certas para se dirigir a mim. Seu tom de voz era claramente triste.

- Algum problema? - Perguntei tentando aliviar aquela tensão no ar.

- Bem, Miguel... Eu queria saber como você está. Não nos vemos mais faz alguns dias... Estou preocupada com você.

- Obrigado pela preocupação... Bem... Eu estou tentando levar as coisas. Mas está muito difícil. É tudo muito recente ainda.

- Eu sei. Eu te entendo meu querido. Mas olha... Quando eu te disse que pode contar comigo pra tudo eu estava falando sério. Quero que saiba que apesar de qualquer coisa, eu tenho muita afeição por você. Quero o seu bem. Você é um filho pra mim, o filho que me restou.

- Obrigado, Suzana. - Aquelas palavras da mãe de Thales me deixaram muito emotivo.

- Eu sei que essa dor nunca vai passar... - O tom dela agora era de choro. - Mas será mais fácil amenizar a dor se tivermos as pessoas que amamos por perto.

- Verdade. - Eu não sabia ao certo o que dizer, estava tentando segurar o meu choro.

- Quando virá me visitar? Eu quero te ver. Não se afaste de quem se importa com você e quer o seu bem, entendeu?

- Pode deixar... Vou ver se crio coragem para sair de casa e te fazer uma visita. Obrigado mesmo por se preocupar comigo.

- Eu te quero bem, assim como eu sempre quis o bem do meu filho, Miguel... Você o fez ter os momentos mais felizes da vida dele. Eu só tenho a te agradecer... - Quando ela proferiu essas palavras meu choro que se mantinha preso se libertou.

- Muito obrigado, Suzana... Mas, eu não entendo como pode querer o bem de quem, de certo modo, contribuiu para a morte do seu filho. - Eu estava aos soluços agora.

- Não diga isso, por favor... Eu sei que você não teve culpa. E eu não quero ver você se remoer por conta disso. Só me deixa mais triste saber que você se martiriza tanto por isso.

- Eu sinto muito, Suzana... Mas essa culpa, eu vou carregar para sempre!

- Não, meu anjo... Não diga isso!!! Por favor, tente se acalmar! Venha aqui em casa para podermos conversar melhor sobre isso, okay? Vou te esperar... Pode vir quando se sentir preparado.

- Tudo bem. - Concordei.

- Então é isso... Tenho que desligar agora... Mas estarei esperando sua visita, que espero que seja em breve. Estou com saudades.

- Assim que eu me sentir melhor eu apareço. - Disse passando minha mão livre pelo meu rosto, tentando secar as lágrimas que teimavam em escapar de meus olhos.

- Okay... Até logo, então. Beijo! - Ela se despediu.

- Beijo. - Respondi encerrando a ligação em seguida.

Soltei o celular sobre a cama e desabei ali mesmo. Eu não conseguia parar de chorar. Aquela ligação de Suzana fez eu relembrar momentos muito intensos de minha existência, reabriu feridas que sequer haviam começado a cicatrizar. Eu estava começando a enlouquecer, a dor era quase que sufocante.

Eu só queria que aquela dor parasse. Eu só queria voltar a ter pelo menos alguns minutos de paz, mas pelo que eu estava vendo, paz era um sentimento que eu jamais voltaria a desfrutar novamente. Eu me sentia preso sob uma montanha de escombros sem qualquer esperança de resgate. Eu queria deixar de existir, para que assim, toda aquela dor e remorso parassem de me consumir lentamente a cada dia.

Com o rosto agora enterrado no colchão para abafar os meus gritos e soluços, eu colocava para fora em forma de lágrimas todo aquele peso e dor que me remoíam por dentro. Parecia que criaturas vivas estavam se alimentando de minhas entranhas enquanto eu não podia fazer nada para detê-las.

Eu apertava os lençóis da cama forte enquanto fechava os meus punhos. Se fosse possível, eu queria que alguém decaptasse minha cabeça naquela exato momento, para me libertar de uma vez por todas daquela existência triste e mais vazia do que nunca.

Eu queria... Eu precisava morrer de uma vez por todas. Eu não aguentava mais "viver" assombrado pelos fantasmas de um passado tão feliz, que deixou de fazer parte da minha "vida" tão brevemente...

O Belo e O Fera: Despertar [Livro 2]Onde histórias criam vida. Descubra agora