truth II

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Estacionei o carro e a noite já se fazia presente, as luzes apagadas e apenas o visor anunciando uma nova mensagem de minha namorada iluminava o local.

Babe:

ei, me avise se acontecer algo

Li e joguei o celular num canto, eu entendia sua preocupação e admirava o quão ela estava empenhada em me entender e me fazer sentir confortável numa situação como essa, tão delicada e tensa. Respirei fundo e então saí do automóvel, na ansiedade de ter respostas e principalmente solucionar tal conflito. Eu amava meu pai e o queria perto, sabia que era recíproco e percebi que não era saudável adiar mais esta conversa. Enfim bati na porta e meu pai atendeu, tinha uma aparência mal cuidada e os olhos castanhos se encheram de lágrimas ao me ver.

— Pai. – chamei e ele me puxou num abraço forte, me deixei ali e pude perceber que ele chorava. — Eu-

— Me desculpe. – disse e eu fitei seus olhos ainda marejados, deu passagem para que eu entrasse e nós assentamos na sala onde haviam fotos e mais fotos da nossa família, inclusive fotos onde minha mãe estava.

— Precisamos conversar. – eu disse e o mais velho concordou. — Mas antes eu preciso que você me perdoe por ter tido aquela atitude, eu não fui prudente. – abaixei a cabeça e ele acariciou meus cabelos. — E sei que te magoei, então-

— Eu reconheço meu erro, como pai e homem, eu deveria ter dito e não omitido a história da sua mãe. – suspirou e olhou uma das fotos onde estávamos juntos. — A mulher por quem me apaixonei e me deu você, talvez tenha sido medo do que veio quando você soube ou, sinceramente medo das lembranças da Elizabeth me assombrarem e eu nunca mais voltar a ser feliz como naqueles anos. – eu escutava atentamente enquanto ele dizia com a voz embargada. — Sua mãe me conheceu quando eu trabalhava numa sorveteria, eu era um magrelo qualquer e ela era a mulher mais linda que eu já havia visto, ainda me lembro dos sorrisos acompanhados dos olhos azuis. – sorriu de maneira carinhosa. — Todos os dias ela ia e pedia o mesmo sorvete até que um dia tomei coragem para falar com ela, então descobri que o sorvete era apenas um pretexto e ela esperava pela minha atitude há tempos. – rimos. – Então após um tempo namorando, a pedi em casamento e ela nunca havia mencionado sobre sua família, até mesmo depois de seu nascimento. Ela queria escrever e vender suas e estórias mas todas editoras negavam seu conteúdo, eu não entendia porque sua mãe escrevia como ninguém e Elizabeth não gostava de falar sobre seu "trabalho", logo seu estado começou a piorar e as crises de raiva começaram a se tornar muito mais presentes acompanhados de delírios. – abaixou a cabeça e limpou a lágrima em seu rosto. — Então a família que ela até então escondia veio a meu encontro e me mostrou seu diagnóstico como ser incapaz, sua esquizofrenia era progressiva e a tendência era de que ela piorasse ainda mais ali, tínhamos medo de que ela pudesse fazer algo a você. Sua mãe te amava com todas as forças, mas em suas crises seu comportamento se tornava irreconhecível. – nessa altura eu já tinha os olhos completamente marejados. — Eu fiz algo horrível, eu matei ela assinando aqueles papéis de internação num hospício local, eu tinha tantas esperanças que ela se recuperasse mesmo sabendo que era impossível... – desabou num choro e eu fui em direção ao seu consolo.

— Pai, você fez o que era certo. – eu disse acariciando seus ombros. — Haviam exames provando isso.

— Filha, ela se matou com os lençóis da maca, eu a vi e pensar que eu não fui o responsável foi inevitável. Por muito tempo me culpei, me martirizei e prometi ser o melhor pai que posso ser para você e falhei.

— Ei, você é incrível. – beijei sua bochecha e senti que viria chorar. — Se eu conseguir ser metade do ser humano que você é, estarei feliz. Você não falhou, pelo contrário.

— Os médicos erraram na dosagem do remédio e ela teve surtos de psicose, foi isso o que aconteceu mas eu a enviei para lá, eu permiti-

— Shh... – o abracei. — Você não é o culpado, acredite.

(...)

No banho após muitas lágrimas tentava assimilar tudo, ainda não havia conversado com Camila ou qualquer outra pessoa, eu iria ficar junto ao meu pai e processar todas as informações que acabara de receber, eu compreendo o lado do mais velho e sabia que as coisas seriam melhores após essa conversa franca. Puxei o cabelo para trás deixando com que meu corpo relaxasse antes de sair e me trocar no meu quarto, estava com saudades dele aliás. O rosa do aposento da latina estava me fazendo mal, nada como meu bom e velho cinza.

Coloquei um pijama e fui até a cozinha onde meu pai se encontrava cozinhando, parecia que também havia feito feito suas higienes porque estava com roupas limpas, lancei um olhar curioso e ele sorriu.

— Esqueceu do cabelo e a barba. – comentei rindo e o mais velho revirou os olhos.

— Você sabe que não tenho paciência, amanhã marco horário num barbeiro tudo bem?

— Dona Clara que me agradeça né. – brinquei e pude ver sua expressão sem graça. — Aliás, é melhor mandar mensagem porque ela parece preocupada, tive uma conversa com a Lauren e ela me disse.

— Lauren? – perguntou com o cenho franzido.

— É mais estranho para mim do que para você.

Rimos e passamos a noite como pai e filha.

Era bom estar em casa

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