Tonto mar

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Todos os títulos são canções.
Tonto mar - Scambo.

RENATA

Faltam palavras para expressar tudo que aconteceu nos últimos meses. A menina cada vez mais arrebata meu coração. Se no início do ano me afirmassem que estaria compartilhando um momento como esse ao lado de alguém vinte anos mais jovem, sem titubear chamaria de louco. Mas cá estamos. E ainda bem que estamos.

Após me desmanchar nos braços de Clara, entramos para tomar um banho e deitar. Em menos de um quarto de hora a morena já ressonava tranquila ao meu lado e eu admirava aquela beleza desprendida de maquiagens, expressões ou regras. Ela conseguia ficar ainda mais bonita relaxada. Aproveitei o momento e saquei o celular para tirar algumas fotos dela. Estava longe do ideal, mas não me passou na mente trazer a câmera para viagem.

Levantei-me com cuidado e enquadrei na tela a moça com os cabelos cacheados soltos. A única peça que a cobria era o fino lençol branco. Sentei novamente na cama e me pus a observar as imagens. Clara parecia esculpida por deuses, cada detalhe disposto com perícia: a sobrancelha bem feita, o nariz tipo "batatinha" de uma delicadeza fim, os lábios carnudos que pareciam desenhados, os cabelos cacheados que eu tanto gostava. Eu jamais cansaria de admirar aquela mulher.

Quem diria, Renata França? Pensei. Me permiti sorrir fazendo uma retrospectiva até chegarmos aqui. Confesso que ainda havia um pouco de insegurança em relação a Ester, e pelo pouco que a conhecia, sabia que mesmo depois de tudo, ela ainda seria capaz de articular alguma coisa para que tivesse a atenção da médica mais uma vez. Acredito que tanto tempo sem me apaixonar me trouxe sentimentos há muito não experimentados.

A separação do meu último casamento foi realmente traumática e desgastante: Giselle além de me trair, quis brigar na justiça pelo apartamento que morávamos e até entramos em um acordo foram longos meses. Fiquei abalada emocionalmente e cada audiência era um sofrimento: ainda existia muito amor da minha parte e vê-la acompanhada da nova companheira - a mesma que fui traída - me causava dor física, além da emocional.

Busquei os braços de outras mulheres para afogar as minhas mágoas, mas sem me envolver de fato. No fim das contas me curei sozinha. Com o passar dos anos a cobrança por uma nova pessoa para caminhar ao meu lado aumentava por parte dos meus amigos e familiares, mas eu me sentia seca por dentro, até que ela apareceu. Despretensiosamente, Clara começou a fazer parte dos meus dias, a tomar meus pensamentos não só quando eu não tinha nada para fazer, mas também quando estava extremamente ocupada. A intensidade os olhos cor de mel me tiravam do prumo, o cheiro único me desconsertava, o sorriso me fazia devanear.

As noites não dormidas implorando a Deus para que ela acordasse e eu pudesse mais uma vez afundar na imensidão do seu olhar foram inefáveis. A cada dia entrando e saindo do hospital sem escutar a sua voz doce ou a gargalhada sonora. O apoio e carinhos incondicionais que recebi não só dos meus, mas dos dela: Alice e dona Sandra se tornaram peças essenciais da minha rotina; trocávamos mensagens e ligações o dia inteiro. A alegria de vê-la desperta, sorrindo novamente. O que sentia por Clara era abundante e quase não cabia em mim.

Dei um suspiro longo e limpei as lágrimas que insistiam em cair. No fim das contas, meu peito era tomado de gratidão por tudo que já vivemos e de uma oração silenciosa para que continuássemos assim por tempo indiscriminável. Deitei e a abracei, afundando o rosto nos cachos e inspirando aquele aroma tão único, tão Clara. Em pouco tempo meus olhos fecharam e fui transportada para um sono pesado e tranquilo.

CLARA

Parecia que estava vivendo um sonho: acordei com o barulho do mar e abraçada com Renata. Quando tentei me desfazer do abraço para levantar, ela me puxou de volta.

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