|| BÔNUS - MATHIAS

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Espero que não seja possível ouvir nada além de minha respiração somada a do meu irmão inundando o ar. Como se não fosse demais, meu estômago ronca pedindo por mais comida. Eu jantei com eles mas me limitei a comer pouco. Por dois motivos: o primeiro é por querer ficar sempre atento ao meu irmão e o outro é que não quero dar trabalho. Em casa eu evitava comer e ficar perto do meu pai, assim ficava livre de seus punhos pesados e xingamentos.

Bem devagar me viro na cama e tento respirar o mais superficialmente possível. Ainda dói muito se respiro muito profundamente. Como Miley me recomendou, fiquei deitado o dia todo. Claro que esperei que ele e sua amiga deixassem o quarto para que pudesse ficar um pouco mais a vontade. Meus olhos nunca deixavam Matteo quando um deles o pegava. Não confio nas pessoas, sei que ele foi me ajudar logo que liguei. Mas ainda estou hesitante. Tudo pode mudar de uma hora para outra e não gosto disso.

Penso em meu pai e não evito que um sorriso pequeno se abra em meu rosto quando me lembro do que escutei mais cedo. Saber que aquele homem levou uma surra por ter ousado bater em Matteo me enche de alívio. Pode parecer errado, mas nunca me senti tão feliz quanto fiquei quando ouvi que o homem que é tão parecido comigo fisicamente, teve um pouco de retribuição pelo que vem fazendo comigo.

Mas claro que a alegria se esvai feito fumaça ao vento quando ouvi as palavras "assistente social" sair dos lábios daquela moça, pude imaginar a cena de pessoas nos separando. Eu vivendo em um abrigo até completar maioridade e sem saber onde meu irmão viveu durante todo esse tempo. A ideia de não vê - lo me causa tanto pânico, que na hora não foi minha costela quebrada que me impediu de respirar.

Depois que me acalmei, vi eles alimentando meu irmão e sendo sinceros, me permiti deitar, só me levantando para comer.

Meu estômago protesta de fome novamente.

Olhando para o teto, me forço a sentar e então me levanto. Coloco vários travesseiros ao redor do meu irmão e vagarosamente deixo o quarto de aspecto bonito e luxuoso para trás. Eu sabia que essas pessoas tinham dinheiro, só não tinha noção do quanto. Os móveis são bonitos e parecem ser muito caros. Uso a parede do corredor para me apoiar e então chego na sala. Não há uma parede dividindo a sala e cozinha, então posso ver ambos os ambientes.

Paro para escutar mais uma vez. Tudo ainda continua em silêncio. No entanto, ainda não me movo. Suspirando o mais silenciosamente possível de alívio, vou até a geladeira. Ela é bonita, prateada e parece de última geração. Pisco o fascínio para fora de minha mente quando minha barriga resmunga mais uma vez. Já aberta, fico indeciso do que comer. Tem que ser rápido, gostoso e que não faca sujeira. Não quero sujar nada e fazer com que sejamos expulsos dessa casa. Casa essa que em pouco tempo está sendo um lugar seguro para mim e meu irmão.

Vejo que há uma latinha de refrigerante na porta, minha boca saliva pois tem tanto tempo que não bebo um.

- Você poderia ter acendido as luzes!

Não dá tempo de gritar, eu só pulo tão alto onde estou que sinto literalmente minha costela quebrada se mover dentro de mim. É impossível segurar o gemido de dor. Em um piscar de olhos estou envolvido por braços fortes e firmes. Mas que são gentis ao me segurar perto de seu corpo. Fico duro feito um pedaço de pau, mas ele não me deixa ir.

- Jesus Cristo! Me desculpa, não queria te assustar!

Não sei quanto tempo fico ali. Naquela cozinha ainda banhada pelas sombras da noite. Devagar me solta, não posso ver seus traços e não sei se está com raiva ao me pegar zanzando pela sua casa. Por isso corro para me explicar.

- Eu não queria mexer em nada! Mas estou com fome. Eu...

- O que tem vontade de comer agora? - sua voz soa tranquila. Engulo em seco e dou um passo para trás.

VOLTA PARA MIM? [COMPLETO]Onde histórias criam vida. Descubra agora