Parabéns, papais

421 35 4
                                    

A notícia era maravilhosa e compartilhá-la com quem se ama era melhor ainda... Porém depois de alguns meses, sentir o peso daquela enorme melancia presa em sua própria barriga ia se tornando torturante. As dores nos músculos, as pernas roxas, as veias estouradas, os desejos gastronômicos impróprios, a minha vontade de sexo em todos os minutos, as noites mal dormidas, dores de cabeça, ânsia de vômito, calos, choros descontrolados e outras coisas deixavam qualquer mulher apavorada.
Christopher parara de fazer viagens longas para ficar ao meu lado todos os dias. Christian fechava o salão mais cedo todas as quartas para me acompanhar em aulas de hidroginástica. Maite me ensinava como preparar papinhas, trocar fraldas, fazer um bebê arrotar e tudo mais. Anahí enchia o guarda-roupa do bebê com roupas de todas as cores, todos os tamanhos, todos os estilos e todos os preços. Minha mãe me ligava diariamente perguntando se eu estava bem. Alexandra me ligava diariamente perguntando se eu estava bem. Lucy brincava de boneca comigo para "me treinar". Claudia me mandou um Manual do Bebê. Blanca me mandou o telefone de uma parteira. Meu pai queria que eu fosse ficar com eles. Luís queria que nós fossemos ficar com eles. Eu estava ficando louca. Christopher estava adorando tudo aquilo.
Claro que ele ficava emburrado às vezes quando eu o acordava no meio da noite com vontade de comer sorvete de pistache com cobertura de chocolate com amoras vermelhas e castanha de caju. Claro que ele ficava desesperado quando eu começava a chorar que nem um bebê por qualquer coisa. Claro que ele ficava nervoso quando eu dava crises de "você não me ama!" e claro que ele não sabia que eu sabia que todas as noites depois que eu "dormia" ele pegava o Manual do Bebê que Claudia me dera para ler, enquanto passava a mão devagar sobre a minha barriga...

Dois meses: Barriga pequena, dá para disfarçar.
Três meses: O mesmo.
Quatro meses: Começa a aparecer a barriga, blusas largas.
Cinco meses: O mesmo.
Seis meses: Barriga enorme. Vestidos largos.
Sete meses: Barriga mais que enorme. Vestidos GG.
Oito meses: Barriga-tomba-para-frente.
Nove meses: Um desespero.
  
— Christopher – eu dizia manhosa enquanto pegava a mão dele e segurava entre as minhas – Estou com fome...
E quer comer aonde, amor?
  
Estávamos no shopping dando um passeio ligth, como chamávamos, e depois de uma sessão no cinema com o filme mais deprimente que eu tinha visto em minha vida – e o qual eu chorei demais – meu estômago roncava revoltado, igual o pequeno estômago do meu bebê...
  
— Comida árabe! – meus olhos brilharam e eu sorri.
Mas você não gosta de comida árabe! – ele me olhou surpreso.
— Hoje eu e o bebê gostamos! – sorri – Eu quero um Karakaden ou um Tamr Hindi...
Então vamos procurar um restaurante árabe... – ele afagou meus cabelos e quando fui o abraçar, me afastei e fechei a cara – O que foi?
— Você derramou sua água no meu vestido! – falei entre dentes e ele me olhou sem entender.
A garrafinha está fechada, meu amor, não tem como... – ele me mostrou a garrafa cheia e cerrei os olhos, também não entendendo.
— Mas... – olhei para baixo e entendi – Christopher, acho que a bolsa estourou...
A gente compra outra em alguma loja, meu bem...
— Não foi essa bolsa que estouro, Christopher! – mostrei a que eu segurava debaixo dos meus braços e ele pareceu entender – Foi aquela!
Ai meu Deus!

~~~

— Mãe, ligue para a Blanca e diga para ela avisar para Anahí, Maite e Christian que a bolsa da Dulce estourou.
— AI MEU DEUS! – dona Alexandra gritou tão alto que eu consegui escutar – MEU NETO ESTÁ PARA NASCER!
Mãe, depois você dá um ataque, só ligue para eles agora e peça para algum deles passar em nossa casa para pegar o enxoval do bebê!
— MEU NETO!
Eu sei, mãe! Estou indo para o Hospital com a Dul, avise para todos, ok?
— OK! FALE PARA A DULCE RESPIRAR FUNDO E...
Tchau mãe!
  
Ele desligou e jogou o celular no banco traseiro, respirando fundo e dando partida no carro.
  
Como você está? – ele me perguntou todo tenso.
— Bem... – eu sorri contente.
Tem certeza? Quer que eu treine aquela respiração esquisita que nós aprendemos nas aulas de parto?
— Não, eu estou bem...
Eu treino com você, meu amor... Não é porque eu estou dirigindo que...
— Amor, eu estou bem, é sério! – sorri ainda mais e peguei na mão dele – Não está doendo tanto ainda, pode se acalmar...
Ok... – ele respirou fundo e deu um beijo em minha mão – Ok, eu estou calmo... Calmíssimo. Nunca estive mais...
— Amor, eu entendo que você esteja "muito" calmo – sorri – mas, por favor, dê partida no carro porque se não o seu filho irá nascer no estacionamento do Shopping, por favor...
Ah... – ele concordou com a cabeça – Isso não seria legal.
— Nem um pouco legal... – confirmei e o carro finalmente começou a se mexer, com a próxima parada sendo: Hospital.

Chegamos ao Hospital e toda aquela calma que eu estava permaneceu até as contrações começarem a me infernizar. Vinha uma ou duas em uma frequência de 10 minutos e meus olhos se enchiam de lágrimas quando sentia uma. O meu colo uterino estava bem dilatado, mas não o suficiente para começar o parto. Eu já estava deitada, Christopher ao meu lado já estava com mascaras, luvas e transpirando nervoso. O médico tinha me avisado que tinha um comitê do lado de fora do meu quarto torcendo por mim e eu, por um segundo, ri, porém a risada acompanhou uma contração que me fez querer gritar.
As contrações aumentaram. Uma a cada 2 minutos e quando o médico disse que estava na hora, parecia que eu já tinha parido um berçário inteiro... Não sabia quantas horas estava ali, mas queria sair o mais rápido possível e com o meu bebê no colo.
Christopher respirava e inspirava tão alto que conseguia ritmar a batida do meu coração com os suspiros dele e quando o médico se aproximou e falou: "Respire fundo, e quando for inspirar, faça o máximo de força que puder..."
Tentei fazer o que ele mandava, porém o fôlego me faltava e parecia que tudo entrava em órbitas. Christopher falava algumas coisas, mas eu não escutava nada. O médico me mandava fazer mais força e eu queria mandá-lo a merda, mas não podia nem respirar direito, falar muito menos.
"Estou vendo a cabeça..."
O médico disse e eu respirei ainda mais fundo, disposta a fazer ainda mais certo.
Respirar. Forçar. Respirar. Forçar. Respirar...
Até que senti minhas pernas falhando e minhas pálpebras pesadas. Fechei os olhos e escutei um choro invadindo a sala, me fazendo abrir um sorriso enorme e procurar alguma força em meu corpo.
"Uma menina... Uma bela e saudável menina..."
Senti lágrimas invadindo os meus olhos e a mão de Christopher sobre a minha, distribuindo beijos em meu cabelo suado e rindo em meu ouvido.
"Parabéns, papais..."

À Primeira VistaOnde histórias criam vida. Descubra agora