[Victor Augusto]
Eu estava sentado ao balcão, bebendo minha terceira xícara de café, quando ela desceu no domingo de manhã. Pegando uma caneca, ela se juntou à mim me observando timidamente.
Victor: o que? — suspirei.
Babi: eu dormi...
Victor: você estava exausta.
Babi: acordei na minha cama — ela me encarou com aqueles olhos cintilantes — sem meu vestido.
Sorri arqueando minha sobrancelha para ela.
Victor: é costume para um marido carregar a esposa pela casa e retirar seu vestido na noite em que se casam, como nos filmes, não? — perguntei, divertido. Uma cor vermelha tomou o rosto de Bárbara. Como eu imaginava. Sorri balançando a cabeça.
Victor: você dormiu, te ajudei a subir pro quarto, tirei seu vestido para se sentir mais confortável dormindo e a cobri. Só isso, srta. Passos.
Babi: oh... — disse se sentando perto de mim notando o pacote embrulhado sob o balcão — o que é isso?
Victor: um presente.
Ela me encarou por uns segundos antes de rasgar o pacote inteiro. Porque não abrir delicadamente a fita e desembrulhar-lo né?
Victor: o que? — sorri percebendo sua confusão.
Babi: é uma câmera profissional? — ela nem mesmo me olhou, estava encantada.
Victor: percebi a alguns dias atrás que assim como Marcia gosta de pintar, você gosta de fotografar. Vi fotos na parede de Marcia, ela me contou que havia sido tiradas por você — ela me olhava com um sorriso imenso no rosto, aquilo causou um formigamento em mim — você tem talento. Use-o. É meu presente de casamento.
Babi: o presente que quero não custa nada além de um pouco de seu tempo.
Victor: você não vai esquecer isso, vai?
Babi: não. Você sabe minha história — ela se aproximou — quero saber a sua agora.Victor: certo — falei deixando minha caneca bater no granizo do balcão.
Desci do banquinho. Tenso fui até a janela. Eu guardei todas essas lembranças às sete chaves e agora ela queria todas elas.
Victor: meu pai foi um playboy. Rico e mimado. Um babaca de verdade — virei-me para ela, dei risada — tal pai, tal filho.
Bárbara se sentou no sofá a minha frente, mas me virei de novo para a janela.
Victor: ele vivia intensamente, viajava muito. Basicamente fazia tudo o que queria, até meu avô chamar sua atenção. Disse para que crescesse e ameaçou tirar seu nome da herança — eu só estava começando, mas o ódio já corria por minhas veias. Era inevitável — ele e minha mãe se casaram logo depois disso. Mas nada mudou, agora eles festejavam juntos e não tinham nenhuma responsabilidade. Meu avô se irritou e lhes deu o ultimato: se não dessem um neto a ele, não haveria mais dinheiro nem lugar na empresa da família.
Babi: seu avô parecia um pouco autoritário.
Victor: puxei ele — pisquei, ela revirou seus olhos e indicou que eu continuasse — e foi assim que nasci.
Babi: obviamente — encontrei seu olhar, pela primeira vez nessa conversa.
Victor: não nasci do amor, Bárbara. Nasci da cobiça. Não me queriam, nunca me quiseram.
Babi: eles não te amavam? Isso é impossível.
Victor: creio que sentiam o contrário. Ódio.Bárbara estava sentada, me observando com seu olhar de pena. Era tudo que eu detestava, mas continuei.
Victor: minha infância inteira, toda a minha vida tive que ouvir sobre como eu era uma inconveniência para ambos. Como eles tiveram a mim para assegurar que o dinheiro continua entrando. Fui criado por babás e assim que tive idade suficiente, fui mandado para o internato.
Ela começou a morder seus lábios por dentro, sem dizer uma palavra.
Victor: ao longo dos anos aprendi que a única pessoa com que se pode contar, é com você mesmo. Eu sempre estive sozinho, então foi fácil aprender isso — me sentei de frente para ela — eu tentei, tentei muito fazer com que eles me amassem. Era obediente, excelente na escola. Fiz de tudo para fazê-los reparar em mim, não obtive nada. Os presentes que eu fazia na escola para o dia das mães e dos pais eram descartados. Meus desenhos jogados no lixo. Não consigo nem me lembrar de abraços ou beijos de boa noite. Não havia empatia para joelhos ralados e dias ruins. Meu aniversário era marcado por um envelope de dinheiro o Natal era mesma coisa.
Uma lágrima escorreu pelas bochechas de Bárbara e isso me assustou.
Victor: aprendi muito cedo na vida que amor é um sentimento que não me interessava, deixava fraco. Então parei de tentar.
Babi: não havia ninguém, nem mesmo seu avô? — ela sussurrou.
Victor: só uma pessoa, uma babá que eu tive aos seis anos. Eu a chamava de Lena, mas seu nome mesmo era Helena. Ela era mais velha, gentil e diferente comigo. Conversava, brincava e escutava minhas tagarelices de criança. Dizia que me amava. Chegou a enfrentar meus pais e tentava fazê-los prestar mais atenção em mim. Durou mais do que algumas, que é o motivo pelo qual ainda tenho lembranças dela. Ela foi embora no entanto. Todas elas foram.Babi: é ela que se parecia com Marcia? — assenti, encontrando seu olhar triste novamente.
Victor: depois de uns anos, meu avô morreu. Meus pais nem ao menos se suportavam juntos, mas não se separaram. Ele ia de mulher pra mulher enquanto minha mãe curtia a vida sozinha. Eu não significava nada para eles, e eles me diziam isso com frequência. Eu também não tinha sentimentos por eles, eram apenas as pessoas que pagavam minhas coisas.
Babi: isso é tão ruim. Sinto por por você ter ficado perdido nessa confusão — eu ri de seu comentário.
Victor: Bárbara, eu nunca estive dentro dessa confusão. Era descartado como o coringa do baralho. Mas isso não importava.
Babi: porque?
Victor: quando eu fiz 18 anos, meus pais estavam com uma parceria, esqueci o que era... algum tipo de sociedade. Por algum motivo saíram juntos, acho que ele a estava levando para casa e então um motorista bêbado bateu neles de frente. Ambos morreram instantaneamente.
Babi: você ficou mal com isso?
Victor: não.
Babi: deve ter sentido alguma coisa.
Victor: A única coisa que senti foi alívio. Não tinha de fingir que me importava com duas pessoas que nunca deram a mínima pra mim. Herdei tudo, até o último centavo. O que é bem irônico, considerando que a única vez que fizeram alguma coisa boa para mim foi quando morreram.
De novo ela baixou a cabeça, seu cabelo caiu pra frente, cobrindo o seu rosto. Parecia querer esconder suas lagrimas. Sentei-me ao seu lado e a encarei.
Victor: ei, olha para mim — segurei seu rosto, sua face estava molhada com lágrimas e seus olhos arregalados. Sua mão apertava o sofá tão forte que estava branca — porque está tão chateada?
Babi: você espera que eu fique calma depois de ouvir como você foi negligenciado a vida inteira?
Victor: É passado, Bárbara. Eu te disse que não era bonito. Nada vai mudar só porque te contei essa história.Babi: talvez não para você — confuso, a encarei tentando entender — explica muito pra mim, o porque você é do jeito que é quando interage com as pessoas, porque não se aproxima de ninguém na vida e porque não deixa as pessoas se aproximarem.
Victor: não comece a me analisar, Bárbara.
Babi: não estou fazendo isso. É apenas a verdade — ela pegou minha mão, segurando firme me fazendo olhar em seus olhos — seus pais eram pessoas horríveis nenhuma, criança merece ser maltratada ignorada como você foi. Mas você escolhe o modo de viver sua vida agora, acha que esqueceu o passado mas não é exatamente isso que demonstra. Porque a forma como você vê o mundo e a forma como trata as pessoas ao seu redor é reflexo de como você foi tratado — ela se levantou, limpando seu rosto molhado — se tentar, acho que pode descobrir que as pessoas nem sempre são horríveis como você pensa, alguns de nós vale a pena, na verdade.
Suas palavras ecoaram dentro de mim.
Victor: não acho que você seja horrível, Bárbara. É totalmente o oposto, na verdade eu sou a pessoa desprezível.
Babi: não, Victor. Você não é desprezível. Acho que é perdido, porque você não se permite sentir. Quando se conectar a outra pessoa, se permitir amar... vai achar tudo isso que disse antes uma perda de tempo. Amor não o torna fraco. Amor de verdade, sincero, o torna forte.
Com essas palavras, ela se abaixou beijando-me suavemente nos lábios. Como sempre fazia.
Babi: obrigada por me contar sua história. E para seu governo, não acho que você seja igual seu pai. Se tentar, pode ser um homem bom.
Ela se virou e saiu da sala, me deixando com muita coisa para pensar. Agora ela sabia de 1/3 da minha história. E talvez fosse a única parte que eu a contaria.
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LOVE AND HATE
FanfictionVictor é um arrogante bem sucedido que trabalha pra uma grande empresa de administração. Depois de anos sendo passado para trás, a grande oportunidade de se vingar de seu antigo chefe o cega da razão. Ele precisaria confiar na pessoa que mais d...