Capítulo 25

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[Victor Augusto]

espaço tempo • duas semanas depois:

Eu estava revisando os últimos documentos antes de deixar o escritório. Já eram quase nove da noite, fiquei até mais tarde atolado com os papeis. Saindo de minha sala, um barulho forte me fez olhar para a janela no fim do corredor. Estava chovendo forte, o céu se iluminava várias vezes com o clarão dos raios — espero não pegar trânsito.
Me molhei quase todo do estacionamento até meu carro. Demorei mais 20 minutos para chegar em casa, a chuva era tanta que o pára-brisa não estava dando conta de limpar o vidro, eu mal enxergava os outros carros na minha frente.
Quando cheguei, encontrei Bárbara enrolada em cobertores no canto do sofá. A tv estava ligada, mas ela nem sequer prestava atenção.
Victor: Bárbara? — me aproximei dela.
Babi: oi? — seus olhos não deixavam o chão. Enfim ela me encarou — vou dormir aqui na sala hoje, tudo bem?
Victor: o que? Porque vai dormir aqui?
Eu não havia reparado, mas seus travesseiros realmente estavam ali.
Babi: terminei e pintar meu quarto hoje a tarde. O cheiro ainda está forte lá.
Nenhum de nós tinha pensado nisso. Era óbvio que ela não ia poder dormir em seu quarto quando terminasse de pinta-lo. Além do meu, não havia mais quartos no apartamento.
Victor: dorme comigo.
Foi sem pensar, eu nem sabia se ela aceitaria dormir na mesma cama que eu. Mas era a única opção no momento.
Ela me encarava confusa.
Babi: estou bem aqui, não se preocupe.
Victor: vamos, Bárbara. É uma cama imensa. Você vai ter um bom espaço — falei me levantando — além do mais, aqui é horrível pra dormir. Aquela noite que me contou sua história, acordei no dia seguinte com dores.
Ela ainda me encarava, como se procurasse algo para contestar. Sem sucesso, ela se levantou.

Victor: vou tomar um banho antes, se acomode do jeito que quiser.
Deixei Bárbara em pé perto do sofá, subindo pro meu quarto e indo tomar meu banho.
Depois de alguns minutos, saí de toalha. Ela já estava deitada, de novo toda enrolada na coberta. Para não deixa-la mais desconfortável, resolvi não dormir só de cueca como normalmente faço. Peguei uma calça moletom e uma camisa e me vesti no banheiro.
Deitei-me junto dela. Mesmo estando na mesma cama, parecia que ela estava se agarrando ao último espaço da cama. Estávamos longe um do outro.
A chuva havia apertado ainda mais, os barulhos estavam cada vez mais altos. Não vi nenhum jornal avisando sobre essa tempestade repentina.
Tentando dormir, algo estava errado. O edredom que estávamos compartilhando remexia constantemente. Olhei para Bárbara, analisando sua forma encolhida. ela estava tremendo.
Ela estava com tanto medo de mim assim?
Virei de lado, passando minha mão por sua barriga e a trazendo para perto de mim. Ela murmurou algo, surpresa. Suas mãos tocaram meus braços como um gelo. Com meu corpo junto ao dela, ela estava rígida, mas eu conseguia sentir os tremores passando por ela constantemente.
Victor: Bárbara, pare com isso — falei baixo — não vou fazer nada com você.
Babi: não é isso. Bom, não é só isso.
Victor: é a tempestade?
Babi: é... é o vento — ela confessou, sua voz era tão baixa que parecia como um sussurro — odeio esse barulho.
Trouxe ela para ainda mais perto, sentindo outro tremor passando por seu corpo.

Victor: por que?
Babi: na noite do acidente, quando meus pais morreram. Estava chovendo como agora. O vento levava o carro como se não fosse nada, meu pai perdeu o controle e capotou.
Senti meu coração se acelerar.
Victor: você estava com eles?
Babi: eu estava no banco de trás — escutei seu suspiro pesado — quando aconteceu, as janelas explodiram e o vento piorava tudo. Eu estava com tanto medo. Perdia a consciência a todo minuto, mas sentia aquele frio horrível trazido pelo vento. E ele nunca parava. Eu sabia que eles estavam mortos, eu estava sozinha e presa.
minha garganta se apertou com a dor em sua voz. Eu não sabia que ela havia passado por aquilo tudo.
Victor: estava machucada?
Em silêncio ela pegou minha mão levando até sua coxa me fazendo tocar sua pele, por baixo do tecido fino de seu pijama. Eu podia sentir uma cicatriz comprida e funda descer até metade de sua coxa.
Babi: tive uma concussão e minha perna foi esmagada quando o carro capotou. Passei por uma cirurgia assim que ceguei ao hospital, outra quando me recuperei e por fim, mais uma para retirar os suportes que deixaram lá — ela limpou a garganta — por isso as vezes tropeço e caio. Ela trava.
Todas as vezes que zombei dela, revirei os olhos ou a observei rindo enquanto ela se esforçava para se levantar do chão passaram por minha mente. Agora eu só sentia vergonha de tudo isso.

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