Capítulo quarenta

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Maria Luiza


O Bento me levou para a casa dele. A tia Rita foi ficar com uma amiga no hospital e ele ficaria sozinho.

— Você vai tomar um banho e comer alguma coisa.

— Não estou com fome. — Balbucio.

— Eu não perguntei se você queria comer, eu disse que você vai comer. É bem diferente. — Assevera sem deixar brechas para discussão.

Faço tudo no automático.

Vou para o seu quarto, separo uma muda de roupa da mala e vou tomar banho. Deixo a água me lavar da cabeça aos pés para ver se de alguma forma carrega a minha tristeza pelo ralo.

Mesmo ficando um bom tempo embaixo do jato de água, não tive tanta sorte assim.

Na cozinha, encontro o Bento terminando dois hambúrgueres. Ele sabe tocar no meu ponto fraco. Mesmo evitando comer o dia todo, o cheiro do lanche mexe comigo. Pão, carne, alface, tomate, cebola caramelizada, queijo, um molho que ele faz mexendo ketchup e maionese, ovo frito, bacon tostadinho e um copo de refrigerante com muito gelo.

Minha barriga ronca alto e ele sorri satisfeito.

Comemos simplesmente, sem falar nada.

Ele lava a louça sem pressa. Acaba me dando tempo para digerir as coisas e colocar os pensamentos no lugar. Pega uma barra de chocolate meio amargo, o nosso preferido e segura minha mão.

— Começa a falar. — Diz assim que nos sentamos em sua cama e ele estende um pedaço de chocolate.

Já havíamos conversado por telefone mais cedo. Foi a única pessoa com quem consegui falar que não fosse a Fê.

— Não tem muito o que dizer. Ele me explicou que ela estava bêbada e o beijou.

— E você não acreditou?

— Acreditei. Esse não é o ponto.

— Como não é o ponto?

— Não sendo. Doeu demais ver o mais leve toque entre as bocas deles. Não pela porcaria do beijo e sim por toda a realidade que a situação joga na minha cara. Ela é sangue azul como ele, tem pedigree, tem estudo, tem classe, vivência no mundo dele, grana, é linda e parecida com todas as mulheres com quem ele já apareceu na mídia.

Estendo a mão para pegar outro pedaço de chocolate, mas ele afasta a barra do meu alcance e ainda dá um tapa de leve na minha mão. Olho sem entender.

— Não estou acreditando que estou ouvindo toda essa merda vindo da sua boca. Eu pensando que ele seria o esnobe da situação, mas é você a esnobe. De um modo totalmente torto, mas é você.

— O que está dizendo?

— Que pessoa é essa na minha frente que está julgando completamente um cara por ter nascido privilegiado? Quando foi que você se transformou na pessoa que julga pela capa e se põe tão para baixo assim? Não sei quem é você!

— Para com isso. — Peço.

Ele não pode estar certo. Não está. Mas, nem por isso, deixo de sentir um gosto amargo na boca, que nada tem a ver com o pedaço de chocolate que comi. É insegurança de por alguma razão estar realmente errada.

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