Precisa de Cuidados

33 4 0
                                    

DOZE ANOS ATRÁS

Não havia melhor momento para aproveitar o dia que à tarde, quando o Sol estava a pino. Era assim que pensavam muitas crianças que moravam na Brasilândia, ao menos aquelas que estudavam de manhã.

Em uma das favelas do bairro, meia dúzia de garotos brincavam em uma rua rodeada de casas coladas uma na outra. Jogavam um futebol improvisado, onde a bola era uma pequena garrafa com terra e tijolos demarcavam a área do gol. Todos os garotos, sem camisa e descalços, divertindo-se plenamente com o pouco que tinham.

Tudo corria bem, até que surgiu uma menina. Ela tinha a mesma idade dos garotos e chegou afobada interrompendo o jogo.

— Caique, sua mãe tá passando mal! — Gritou ela.

Bastou para o garoto largar tudo e sair correndo. O lugar onde morava não era longe e por isso chegou rápido. De pés descalços no chão, sem camisa e vestindo um shorts velho, o menino franzino de cabeça raspada sabia ser veloz quando precisava. Quando chegou em casa, deparou-se com sua mãe sentada no sofá com as pernas esticadas.

O braço esquerdo dela estava com escoriações e inchado. Não era a primeira vez que a mulher sofria esses acidentes dentro de casa. Apesar de estar na faixa dos trinta anos, aparentava ser mais velha. Frequentemente ficava debilitada, mas não fazia nada para se cuidar. Fazendo com que o inverso acontecesse: o filho zelando pela mãe.

— Mãe! O que aconteceu dessa vez?

— Nada de mais. Só tropecei e tô descansando. Logo vou ficar boa.

Toda vez, o mesmo diálogo. "Nada de Mais", "Estou bem". Mas Caique sabia bem que a verdade não era essa.

— Seu braço tá muito inchado. — Comentou se aproximando da mãe — A gente tem que ir pro hospital agora.

— Larga a mão de ser exagerado, menino. Que médico o que? É só uma batida.

Ela não costumava ser a mãe mais amorosa do mundo, nem de longe, mas era tudo que Caique tinha. Por isso o garoto se preocupava tanto com ela, mesmo com ela não se importando tanto com ele e nem consigo mesma.

— Ah, não. Cê fumou pedra de novo?

— Claro que não, deixa de ser tonto. Foi nada de mais, eu já falei.

— Então se não foi nada demais e se cê não fumou, podemos ir pro hospital cuidar do seu braço.

Outra coisa que o menino conhecia bem desde que se entendia por gente era o vício da mãe. Às vezes ela parava, às vezes voltava. Mas ele ainda tinha esperanças de que um dia ela pudesse ficar boa de vez e se esforçava para ajudá-la nisso.

— Cê vai ficar me enchendo o saco pra eu ir no hospital, né? — Perguntou a mãe.

— Claro, seu braço tá muito mal.

— Então tá, vai. Assim cê fica quieto. Deixa eu pegar minha bolsa.

A mulher se levantou com dificuldade. Caique até tentou ajudá-la, mas ela recusou. Mesmo assim, a mãe aceitou sair de casa, embora, de má vontade. Já o garoto, colocou uma regata e chinelo para acompanhá-la.

Depois de chegarem ao hospital público, que ficava perto de onde moravam, e enfrentarem uma considerável espera, a mãe do garoto foi atendida. E como ele suspeitava, não foi apenas uma batidinha, mas uma fratura. O braço dela precisou ser imobilizado para evitar maiores problemas.

Em um cômodo do lugar, a mulher recebia os primeiros socorros. Um enfermeiro enfaixava o braço dela, fazendo uma tipoia. Um homem de quarenta anos, muito cortês e atencioso em seu trabalho. Em suma, um amor de pessoa. A mãe não se importou com o jeito dele, mas Caique ficou admirado.

Arena Esparta: Além da Noite (Livro I)Onde histórias criam vida. Descubra agora