Sapato Apertado

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DEZ ANOS ATRÁS

Uma longa, bem longa caminhada. E ainda com o calor da tarde. Era insuportável e cansativo. E a situação não mudava muito por perambular simplesmente na Rua Oscar Freire. Yuri entendeu que o mais chique dos endereços paulistanos só era realmente chique ao se olhar para ela dentro de um carro.

Passado pelas calçadas dos deslumbrantes estabelecimentos, estava acompanhado de Jasmine. A colega de supletivo, que se chamava Jamilly na verdade, que havia conhecido e que prometeu ajudar a incrementar seu trabalho como acompanhante. Uma das ideias dela, para isso, era um banho de loja nele.

Algo que, por si só, já incomodou Yuri. Só de olhar ao redor, sabia que não pertencia àquele mundo sofisticado. Mesmo que muitos daqueles que eram chiques e endinheirados entravam em contato com o rapaz para pagar pelos seus serviços.

Pela rua, ambos carregavam algumas sacolas de compras, bem menos do que Jasmine pretendia. Estava difícil agradar Yuri. E isso deixava Jasmine aborrecida.

O rapaz não conseguia gostar de quase nenhuma roupa que via e provava. Em cada loja, a moça sugeria peças e ele fazia cara feia para algumas. Na hora do provador, só piorava, pois ele detestava provar roupas.

— Cê me deve um sapato novo, viu Del Fuego. — Protestou Jasmine — Se eu soubesse que escolher roupa com você fosse tão difícil, teria treinado pra uma maratona.

— Não tenho culpa se as roupas que cê escolhe não tem nada a ver comigo. — Disse Yuri.

— Poxa, cara. Eu fazendo o maior sacrifício pra te ajudar, perdendo um dia de trabalho, pra você ter umas becas legais. E você não comprou quase nada. Uma coisinha e outra e esse tênis que cê tá usando.

— E um tênis apertado pra caralho. Falaram que era meu número mas parece menor.

Guará estava visivelmente incomodado ao usar aquele tênis, que realmente era muito bonito. Com solado branco, polido, destoava do figurino básico de bermuda e camiseta que usava. Ao contrário de Jamilly que estava muito vistosa, com um vestido linho curto acinturado, salto alto e cabelos soltos.

— Eu até entendo isso de se vestir bem e tal. Só não entendo por quê precisa ser aqui e usado essas roupas caras. — Disse Yuri.

— A gente tem que mostrar que a gente está bem na fita. Tem que ostentar um pouco, mostra atitude. Imagina na hora de fazer programa com um empresário milionário, na mansão dele. Ele vai reparar em como nos vestimos. Não dá pra ir em lugar grã-fino com roupa da suburbano.

Os dois pararam de olhar por um instante. Yuri também estava aborrecido. Não gostava de comprar roupa e também não entendia a maneira forçada que Jamilly queria mudar o visual que, para ele, não havia nada demais.

— Eu não gosto de usar roupa. E eu não me vejo usando essas roupinha de playboy. — Desabafou, engolido o plural — Não gosto dessas roupas com o nome da marca aparecendo enorme só pra dizer que é de marca. Se fosse pra usar algo com propaganda, eu pegava meu uniforme do Timão que é muito mais bonito.

Jamilly bufou. Sentia que saiu na rua com Guará para nada. Parecia um caso perdido.

— Já vi que é difícil te entender. — Resmungou.

Yuri não deu atenção ao que ela falou pois estava voltada a vitrine da loja que estava a sua frente. Mais precisamente para o par de coturnos pretos de cano médio que parecia ter saído de um moto-clube americano. Olhou fixamente, com encanto para o calçado, como se aquilo tivesse lido a sua mente, de alguma forma.

Arena Esparta: Além da Noite (Livro I)Onde histórias criam vida. Descubra agora