25 de Maio de 2009

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SAMIA

Apesar da distância razoável entre a área recreativa e o local que Metim escolhera para armarem a tenda, o som de música chegava, alto. Pela algazarra lá embaixo, com certeza os homens tinham passado da conta na bebida. Sentiu-se tomada pelo desânimo. Quando Metin se embriagava, conseguia piorar um pouco mais o que já não era bom entre eles. Agradecia por Nene ter levado Ayla, Kemal e outros jovens do grupo, de volta a Istambul naquela tarde.

O  festival fora maravilhoso mas, para seu desgosto, o marido decidira permanecer após o encerramento. 'Tenho que fechar um acordo, mulher...não se meta', fora a resposta ríspida que recebera ao questionar sobre a permanência deles. Ela imaginava do que se tratava.

Ouvira Metin conversando com Hakan, pai do 'noivo', sobre o casamento. A simples ideia de que a filha fosse obrigada a unir-se com alguém que não escolhera lhe revirava o estômago. O rapaz em questão apresentava um comportamento que não a agradava em nada. A postura irredutível do marido não lhe deixava alternativas: aceitaria a oferta do maestro e acompanharia Ayla até a Itália. Tão logo chegassem a Milão, declararia o divórcio.

Abriu o baú que sempre levava para o acampamento, retirando a imagem envolta pelo lenço de seda: Santa Sarah. Ajeitou-a junto ao vaso de rosas vermelhas na mesinha ao lado da cama e acendendo a vela no castiçal de bronze, iniciou suas preces. Rezar sempre a ajudava nos momentos de angústia. Lágrimas banharam seu rosto. No coração apertado, sentia um mau presságio.

 - Proteja a minha menina, Santa Sarah! Cuide da minha Ece, por favor!

Em silêncio, rogou à Proteção Divina para que a filha conseguisse se ver livre do destino que o marido planejava.

Um baque surdo do lado de fora indicou que algo havia caído. Ouviu o som de uma risada alta, seguida de uma imprecação.

- Você está rindo do seu sogro, Tarik?

'Metin'. Limpando o rosto, apagou a vela. Um segundo depois, o tecido que protegia a entrada foi aberto e o marido apareceu, acompanhado pelo rapaz.

- Cumprimente a sua sogra, homem!- o rapaz obedeceu, tomando-lhe a mão e levando-a à testa. Ela retirou os dedos o mais rápido que pôde, se esquivando do contato. Ele não lhe descia, por mais que se esforçasse.

Metin  abriu uma botija de vinho, servindo-se. Mostrou a taça acobreada a Tarik.

- Na noite do seu casamento, você e sua 'Ece' vão beber da mesma taça selando um só destino, filho. A minha Samia aqui – apontou a esposa- não queria beber na nossa primeira noite, você acredita? Mas eu fiz com que ela bebesse...ah, fiz!- fez uma pausa, tomando um gole generoso - Você vai tratar bem a minha menina, não vai,Tarik?

- Sim, baba. Ayla será sempre a minha Ece.

 Havia algo de irônico no modo como ele tinha dito aquilo. Ela o olhou, incomodada.  Apenas ela e Nene se referiam a Ayla assim. Como Metin ousara?

Uma risada fria distorceu a face avermelhada do marido. Ofereceu a bebida ao jovem que recusou, despedindo-se em seguida. Ela acompanhou-o, aliviada, até a saída.

Ao voltar, sentou-se na cama. O estado do marido era deprimente. Ele fez sinal para que se aproximasse, batendo a mão sobre uma das pernas. Preparando-se para o pior, tentou distraí-lo.

- Metin, Ayla não precisa se casar agora. Ela tem talento! O maestro ofereceu uma bolsa de estudos...- um grito irritado interrompeu-a.

- O único talento que ela precisa é ser uma boa esposa - prendendo-lhe a mão, apontou para o anel- como você mesma deveria ter sido se soubesse do seu lugar!

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