Sensei | +18

Michelle

"Passava da meia noite, todos da casa estavam dormindo, os tios, avós, empregados e todos que de alguma forma conviviam ali, agora descansavam as cabeças tranquilas sobre os travesseiros, menos uma.
A pequena Michelle que esperava ansiosamente pelo seu 9 aniversário, estava acordada em cima da sua cama. Os dias na mansão não eram os melhores, mas todos os anos, no aniversário dela, ela sentia que todos lembravam que ela existia. Alda fazia bolo com ela, os avós davam parabéns e recitavam a importância de ser um feiticeiro e honrar o nome da família. A mãe continuava como sempre estava, mas Mia não se importava, o que realmente era mais especial sobre esse dia era a possibilidade de ele voltar.
Ela vai até a parede do quarto que rabiscava todos os dias, e desenha novamente ela, com um lápis vermelho vivo os seus cabelos, e os olhos castanhos. Ela coloca uma roupa especial, azul, a que costumava ver seu pai vestido nas fotos, era o uniforme jujutsu. Olha para o seu trabalho artístico na parede e se orgulha.

— Em breve também vou ser uma feiticeira - ela diz olhando pro desenho.

Ela ouve um barulho no andar de baixo, pensa que é Alda e logo corre para a cama com medo de levar uma bronca por estar fora da cama. Se esconde por debaixo dos lençóis e finge que dorme.
Mas logo, ninguém sobe, e ela ouve gritos no andar de baixo. Assusta-se mas não consegue se mover, fica paralisada ouvindo gritos horríveis de dor, coisas quebrando, vidros partindo e explosões.
Alguém abre a sua porta com força e ela começa a tremer e fechar os olhos, tudo acontece tão rápido que ela nem pensa sobre o que estaria ocorrendo.
Alda puxa seu cobertor e Michelle sente alívio ao ver o seu rosto. A empregada assustada com o uniforme coberto de sangue, pega a menina no colo e carrega para longe do quarto.
Elas descem as escadas com pressa, Michelle por alguns instantes decide usar toda coragem do seu corpo para abrir os olhos, ainda no colo de Alda, ela vê a casa destruída, vê alguns empregados no chão, com os corpos esquartejados, Ela congela com os olhos arregalados, não sabia como reagir, nunca esteve tão assustada em toda sua vida.
Alda continua correndo, e ela carregava uma espada na mão, essa que brilhava em energia amaldiçoada, ela erguia contra todos que se aproximassem e até conseguiu atingir uns homens, mas também foi ferida.
Elas conseguem sair da casa e correm pelo campo e plantações por longos minutos, a menina chorava e Alda soava frio pelo cansaço extremo de estar ferida e correr tantos metros, enquanto a casa atrás delas queimava a baixo.
Elas param quando estam longe o suficiente da mansão. A empregada desaba no chão, mas ainda consciente.

— Alda? o que está acontecendo? - a menina diz chorosa.
— Você precisa correr! - ela diz com muita dificuldade.
— Eu não vou deixar você - ela grita chorando ainda mais - Alda eu estou com medo, onde estão os outros? a mamãe? a vovó?
— Michelle san... Você precisa sobreviver, anda! corra!

Michelle não a obedeceria, pela primeira vez diria não, e continuaria ali ao lado dela, até que pela sorte do destino, um homem já com idade avançada, com roupas velhas e uma vara de pesca junta a sua cintura aparece.

— Vocês estão bem? O que aconteceu?- ele corre até elas ajudando.

Alda já estava desmaiada, o homem checa sua respiração e ferimentos. Mia não responde, estava com medo que Alda morresse, olha para trás onde a casa dela pegava fogo, lembra a sua mãe, dos tios que mal falavam com ela, e de todos os empregados, agora não existiam mais, agora nem a casa existia.

Alda e Michelle passaram a se esconder com o pescador por algumas semanas, comiam muito pouco, só o que conseguiam colher, depois daquele dia a família Hinokami desapareceu, todos executados, e possivelmente todos acreditavam na morte da herdeira deles.
Elas se mudaram para cidade alguns dias depois e tentavam sobreviver em um apartamento minúsculo. Alda sempre ensinou os valores que Michelle cresceu ouvindo, a importância de ser um feiticeiro jujutsu, de proteger os mais fracos, e de principalmente não seguir os passos do pai. Alda contou que ele se revoltou contra o próprio sistema, contra a família, e matou milhares de pessoas inocentes, matou os superiores das escolas, alguns feiticeiros poderosos e isso despertou a fúria dos que tentavam proteger os usurários jujutsu, por isso eles eliminaram todos da família, por causa do que o Pai fez.

— Alda?... - A pequena que agora tinha 10 anos pergunta olhando para Alda através do espelho.

A empregada cortava do cabelo de Mia com uma faca velha na orelha e preparava um pote com tinta preta.

— Sim? - ela fala ainda concentrada.
— Você acha que ele está morto? - a menina fala triste olhando Alda passar uma pincelada cheia de tinta sobre seus cabelos ruivos.
— Eu não sei - ela responde com peso nos ombros - mas você deveria pensar que sim, até por que, Michelle san, você também morreu certo?

Michelle olha uma última vez para o seu eu antigo, uma criança marcada por tanta dor e principalmente, fogo.
Depois de horas com aquilo, lava e então o cabelo seca, ela se olha no espelho e quase não reconhece pelo contraste forte que seu tom de pele fazia com o preto azulado do cabelo.

— Como você se chama? - pergunta Alda segurando no seu ombros.
— Mia... Mia Sanchez - ela olha para Alda buscando aprovação embora ainda sentisse uma tristeza imensa no seu coração.
— Exatamente.

Alda sai e deixa ela no banheiro sozinha, ela percebe algumas lágrimas caírem mas logo as ignora, não havia tempo para deixarem elas descerem. Michelle estava morta, e aquele era oficialmente o seu enterro.