Capitulo 13

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A incerteza sobre como seriam nossas vidas a partir do dia seguinte, ainda rondava os meus pensamentos quando saímos do celeiro e voltamos para casa. O combinado tinha sido cada um ir para seu quarto, mas quando chegamos lá, não conseguimos nos separar e, apesar do risco que estaríamos correndo, ele me pediu para dormir com ele e eu aceitei. Claro que tínhamos algumas coisas a nosso favor. A suíte de Shawn, por exemplo, ficava sozinha em uma ala, no final do corredor do lado oposto aos quartos de hóspedes. Para saber o que estava acontecendo ali, a pessoa precisaria atravessar o corredor e ficar escutando atrás da porta. Estávamos contando também com a ressaca que papai teria quando acordasse de manhã. E pelo tanto que ele tinha bebido, isso certamente o tiraria de circulação por boas horas. Além disso, tínhamos tantas aliadas ali, que não era possível que algo desse errado. Assim que entramos ele trancou a porta e me levou para o chuveiro, onde tivemos nossa segunda rodada de sexo. Depois do banho de verdade, ele me deu uma camisa sua para que eu pudesse dormir. Apesar da minha nova predileção por dormir nua, de forma alguma eu iria recusar sua oferta, afinal, esse também era um dos meus sonhos secretos. Quando, por fim, nos deitamos, eu me sentia ainda mais viva e louca por ele, era como se toda minha paixão reprimida durante anos tivesse vindo à tona e com força total. Como eu havia previsto, depois que toda a adrenalina, serotonina e dopamina voltaram aos níveis normais, Shawn sentiu muita dor no ombro, tanto, que tomou dois comprimidos e pegou no sono quase que imediatamente. Já eu, boba como era, ainda custava a acreditar que tudo aquilo havia acontecido, e me perdi no tempo admirando os traços impecáveis de seu rosto esculpido, as sobrancelhas bem desenhadas, o maxilar forte… Estar com ele desse jeito era um sonho e eu queria aproveitar cada minuto. Shawn era perfeito de tantas formas que eu nem podia imaginar. Um homem cheio de princípios e valores inabaláveis. Era a isso que eu estava me apegando, para alimentar a possibilidade de um futuro relacionamento. Claro que esses mesmos princípios poderiam se tornar nosso ponto fraco. Quando Shawn acordasse de manhã e se lembrasse do meu pai, se amaldiçoaria por ter feito amor comigo. Ainda não tinha certeza de como isso nos afetaria. Comecei a pegar no sono quando o primeiro traço da alvorada apareceu no céu. Sabia que o certo seria ir para o meu quarto, afinal, depois dos comprimidos que tomou, Shawn não acordaria tão cedo. Mas eu queria aproveitar sua companhia o máximo que pudesse, por isso me deitei sobre o seu peito e foi ali que adormeci. Parecia que eu tinha acabado de dormir quando fui despertada com o toque de um celular que soava insistentemente. Tateei o criado-mudo, ao meu lado, em busca do meu telefone, achando que pudesse ser meu pai ou minha mãe procurando por mim, mas quando o encontrei, a única coisa que vi no visor foram as horas, 6h50 da manhã. Ergui-me sobre o cotovelo e olhei para a mesinha ao lado de Shawn, mas não vi nenhum telefone. Devido a hora, imediatamente me lembrei do que Karen havia me contado e imaginei que fosse a Fernanda. Entrei em conflito sobre deixar tocar até ela se mancar e ver que ele não queria atender, ou desligar o telefone. Optei pela segunda opção, surtiria o mesmo efeito e eu ainda teria um pouco de paz. Levantei-me e fui atrás do bendito celular, pensando que uma pessoa só podia ser muito doente para fazer uma ligação atrás da outra, dezenas de vezes. Segui o toque até o banheiro e o encontrei no bolso da calça que Shawn descartara no chão, antes de tomarmos banho. Diferente do que pensei, não era Fernanda quem estava ligando, apenas um número de São Paulo que não estava na agenda de Shawn. Suspirei, pensando que isso não ajudava em nada. Quando um número desconhecido ligava tantas vezes para o celular de alguém, significava que alguma coisa ruim havia acontecido. Imediatamente, corri até a cama.
— Shawn, acorde, o seu celular não para de tocar — falei, baixinho, mas ele não deu sinal de vida. Chamei novamente, depois comecei a sacudir seus ombros, mas nada, ele estava completamente fora de uso. Droga, o que eu faço? Quando o mesmo número apareceu na tela novamente, abandonei os escrúpulos e resolvi atender. Depois me acertaria com Shawn.
— Alô.
— Shawn Mendes, por favor — pediu uma voz feminina, doce, mas num tom meio alterado. Merda, algo havia acontecido mesmo.
— Eu sinto muito, mas ele não pode atender agora.
— Mas eu preciso falar com ele, é urgente!
— Eu percebi, mas ele realmente não está disponível. Você não quer me dizer o que houve, eu posso dar o recado a ele assim que… for possível.
— Mas porque ele não pode atender? O que aconteceu?
— Nada, ele… só não está por aqui agora. É Réveillon — argumentei.
— Droga! Tudo bem, então, avise que a noiva dele sofreu um acidente e está no hospital. Tu tu tu tu… Meu coração disparou na velocidade da luz; como assim a noiva dele?
— A… hum, noiva? — Sim, Fernanda Siqueira. Meu nome é Luciana, eu sou irmã dela. Peça para ele me ligar o mais rápido possível, por favor.
— Tudo bem — sussurrei e ela desligou. Continuei olhando para a tela apagada por vários minutos, tentando assimilar tudo o que tinha ouvido. De todas as coisas que imaginei quando aquele maldito celular tocou, essa foi uma que nunca passou pela minha cabeça: eles estavam noivos. Se isso era verdade, por que diabos ninguém me falou nada? Ou será que ninguém sabia dessa novidade? Depois de imaginar mil e uma desculpas, resolvi não tirar conclusões precipitadas, rezando para que ele tivesse uma explicação plausível. Fiquei sentada ao lado de Shawn, pacientemente, esperando que ele desse sinal de vida para poder lhe dar o recado. Quando ele se mexeu e resmungou, duas horas depois, foi o que fiz.
— Shawn — chamei, mas ele não acordou.
— Shawn! — chamei novamente, sacudindo seus ombros um pouco mais forte. Se ele não acordasse, teria que dar um tapa no rosto dele, como as pessoas fazem nos filmes. Hum, até que isso não seria uma má ideia, minha parte vingativa ponderou. Infelizmente, ele começou a resmungar mais alto e quando dei um apertão no ombro machucado, ele reclamou e entrecerrou os olhos. Assim que me viu, Shawn sorriu e tentou me puxar para um beijo, mas eu recuei e disse que ele realmente precisava se levantar. Algo em minha voz — raiva, talvez, ou mágoa, ou mais provavelmente as duas coisas —, o fez ficar alerta e ele se sentou.
— O que houve?
— Você precisa retornar uma ligação — falei, estendendo o aparelho para ele. Shawn franziu a testa, parecendo confuso e depois começou a se situar.
— Você atendeu meu telefone?
— Ele começou a tocar insistentemente desde as 7h da manhã, eu não tive outra opção.
— E por que você não me acordou? — perguntou, o semblante fechado. — Tem duas horas que eu estou tentando fazer isso.
— Eu não… — parou de falar sem saber o que dizer.
— Você tomou dois comprimidos e ficou dopado, Shawn. Acho que nem se eu jogasse um balde de água fria na sua cabeça, te acordaria. Não que não tenha me faltado vontade de fazer isso, acredite em mim — admiti, amarga, tentando segurar a minha raiva.
— Nossa. Eu sabia que esse remédio era forte, mas não imaginei que fosse tanto assim. Obrigado e... desculpe. Ele mexeu no celular, mas quando não viu o nome de ninguém nas últimas chamadas, soltou:
— Eu não conheço esse número. A pessoa deixou nome?
— Deixou, sim. É Luciana, sua cunhada, irmã da Fernanda, sua noiva. Vi o maxilar dele se cerrar, mas Shawn simplesmente fingiu que não tinha escutado a última parte e fez a ligação.
— Luciana, é o Shawn. O que houve? — perguntou e ficou ouvindo enquanto ela, provavelmente, explicava o que tinha acontecido.
— Mande a localização por mensagem, já estou indo — garantiu e se levantou da cama em um pulo, indo para o banheiro. Ele não me deu bom dia, não perguntou como eu estava… A ligação que recebeu fez com que eu deixasse de existir. Shawn saiu do banheiro e foi direto para o closet, voltando de lá um minuto depois, já vestido com uma calça jeans e terminando de vestir uma camisa polo.
— Ela disse que sua noiva tinha sofrido um acidente — murmurei quando ele se sentou para calçar os sapatos.
— O quê? — perguntou, distante; ele sequer se lembrava que eu estava ali.
— Sua noiva. Ela disse que a Fernanda era sua noiva. Que horas foi mesmo que você me disse que estava noivo, porque eu acho que esqueci.
— Agora não, Camila — ele demandou quando terminou de se calçar. Então foi até seu criado mudo, depois à cômoda, voltou ao closet e parou no meio do quarto, procurando alguma coisa.
— No banheiro — falei.
— O quê? — Quando nós dois fomos tomar banho juntos, ontem à noite, você deixou sua calçano chão do banheiro, com sua carteira no bolso, lembra? Ou será que já se esqueceu de tudo o que aconteceu ontem? Ele fez uma careta e fechou os olhos brevemente. Então suspirou e entrou no banheiro, saindo de lá com a carteira na mão. Depois de guardá-lano bolso, foi em minha direção.
— Escute, Camz, depois conversamos sobre o que aconteceu ontem, tudo bem? — prometeu e me deu um beijo na testa. Na testa! E eu achando que as coisas não poderiam piorar. Nunca imaginei que depois do que tinha acontecido conosco, eu ganharia um beijo na testa. A antiga Camila, com certeza, faria um escândalo, mas essa nova versão não aceitaria ser diminuída e humilhada. Por isso engoli meu choro e toda a raiva que estava sentindo e saí do quarto, sem me importar com quem me visse. Ele está noivo, minha mente ecoava, uma e outra vez. Não saberia explicar o quanto essa constatação me deixou desnorteada, atordoada, triste, magoada. A desolação que senti no dia em que fui embora do Brasil, não se comparava a essa. Eu estava me sentindo traída, usada. Será que fui apenas a pessoa que estava disponível, no momento em que ele precisava de alguém, para ajudá-lo a superar a briga com a noiva? “Eu sei que ele nunca te magoaria de propósito, mas isso não faz dele um homem perfeito.” As palavras de Karen apareceram na minha mente e por mais magoada que estivesse, seria a elas que eu me apegaria por enquanto. Toda a experiência que adquiri durante os últimos anos, me ajudou a organizar meus pensamentos de maneira mais prática, o que, consequentemente, ajudaria a acalmar minha alma. Aprendi a duras penas que não adiantava sofrer por antecipação, e manteria aquilo em mente para não quebrar. Como disse Oprah Winfrey: “Se um homem quiser você, nada pode mantê-lo longe. Se ele não quiser, nada pode fazê-lo ficar.” Entrei no meu quarto e me deitei na cama, mas logo antes de dormir, rezei para que quando abrisse os olhos, tudo não passasse de um maldito pesadelo.

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