Quando eu tinha uns quinze anos, Shawn emprestou a fazenda para que um amigo fizesse o ensaio fotográfico de seu noivado. Por coincidência, estávamos lá naquele final de semana e me lembrava de ter ficado andando atrás do fotógrafo feito uma sombra. A noiva era morena como eu e usava um lindo vestido estilo mullet, colado até o início do quadril, onde formava uma saia levemente godê que ia aumentando de comprimento até chegar numa calda em forma de triângulo, não muito longa, mas o suficiente para arrastar no chão. Para arrematar, ela usava lindas botas country brancas, com alguns detalhes em dourado. Durante a sessão de fotografia, fiquei encostada na cerca, analisando o olhar de admiração que o noivo lhe lançava. Os dois estavam tão apaixonados, que eu quase podia ver corações explodindo em cima de suas cabeças, e foi impossível não imaginar que poderia ser eu e Shawn um dia. Lembrava-me de ter vibrado e pedido muito a Deus para que o universo fosse tão generoso comigo quanto estava sendo com ela. Bom, deu certo, já que naquele dia, quem se casaria seria eu. Olhei-me no espelho mais uma vez. Meu vestido era longo, todo coberto por uma renda trabalhada e muito delicada. Seu corte era ajustado até a cintura, para então abrir em uma saia fluida, mas nada exagerada. Assim que bati o olho nele, vi que ia bem de acordo com meu estilo, além disso, achei-o ideal para o mês de dezembro. As alças de renda eram uma delicadeza à parte e para completar, escolhi saltos médios bem confortáveis; queria dançar bastante naquela noite, já que Heitor teria várias babás para tomarem conta dele. A pedido de Shawn, deixei os cabelos soltos e pedi à cabeleireira que colocasse um arranjo com flores naturais, ajustado sobre duas tranças que se juntavam atrás da cabeça, formando um meio rabo de cavalo. Quis que minha produção fosse simples e o mais natural possível, tudo deveria combinar com o clima da fazenda e estava imensamente satisfeita.
— Shawn já mandou perguntar se você fugiu pela janela — Karen brincou, entrando no quarto. Ela estava me ajudando com tudo e era meu meio de comunicação com o lado de fora da casa, já que Rafa me proibiu de ficar no celular no dia do casamento.
— Eu já estou pronta, sogrinha, não seria louca de fugir depois de lutar tanto. Karen me olhou com os olhos marejados. Estava linda em um longo azul claro, da cor dos seus olhos. Como eu suspeitava, havia mesmo algo rolando entre ela e Manoel e eu não poderia estar mais feliz. Apesar de sempre ter sido muito alegre, Karen estava há muito tempo sozinha e quando um dia me chamou para contar que Manoeliria pedir sua mão a Karen, eu quase não aguentei de felicidade. Com meu noivo, no entanto, foi outra conversa. Ele estava acostumado a ver a mãe sozinha desde criança e foi impossível segurar o ciúme. E mesmo depois de ter concedido a mão de Karen e após tantos meses terem se passado, Shawn ainda falava sobre o assunto com uma careta de desgosto. Mas no fundo ele sabia o quanto aquilo estava fazendo bem à sua mãe. Manoel a tratava como uma rainha e a felicidade dela podia ser vista por qualquer um. Por isso eu tinha certeza de que logo aquele receio acabaria e Shawn pararia de implicar com o pobre homem. Voltei à realidade quando ela segurou a minha mão, emocionada.
— Não poderia estar entregando meu filho a uma pessoa melhor. Eu já a tinha como uma filha e meu coração está explodindo de felicidade por saber que agora você, de fato, é. Segurei a vontade de chorar e nos abraçamos. Era um dia de muita alegria, a todo momento vinha alguma recordação diferente, como se minha mente quisesse me lembrar de tudo que passei para estar ali. Não foi fácil passar a adolescência toda suspirando por Shawn, muito menos vê-lo com uma mulher diferente a cada semana, mas a parte mais difícil foi ter que ir embora. Os anos fora do Brasil foram difíceis, mas altamente necessários. Eu não teria me tornado a mulher que era agora se continuasse correndo atrás dele e aceitando suas migalhas. Às vezes precisamos nos afastar daquilo que mais desejamos, por não estarmos preparados para receber. Hoje consigo enxergar que a Camila de dezoito anos, jamais poderia dar conta da carga emocional que viria junto com Shawn Mendes. Ela não teria maturidade para isso.
— Eu também a tenho como uma mãe e prometo que vou fazer seu filho feliz.
— Você já faz, querida, você já faz. Agora vamos descer, antes que ele suba. Assenti e saímos, encontrando papai me esperando no primeiro degrau da escada. Ele ficou comovido ao me ver vestida de noiva, pronta para oficializar meu compromisso com o homem que eu amava.
— Filha...— ele disse ao segurar minha mão e vi que precisou engolir um nó na garganta. Olhar para ele, tão emocionado, me fez lembrar de toda a tensão desnecessária que passei depois que cheguei ao Brasil. Eu deveria ter confiado mais no homem que me criara e percebido logo de cara que ele jamais ficaria contra mim. Papai sempre me incentivou a tomar minhas próprias decisões com bom senso e sabedoria e eu levei seus conselhos a sério. Agora, me restava apenas agradecer por tudo ter dado certo no final.
— Você está tão linda.
— Obrigada, papai. Ele beijou minha testa e no segundo seguinte a cerimonialista avisou que estava tudo pronto para a minha entrada. Mesmo optando por fazer tudo simples e com poucos convidados, quis que a cerimônia ocorresse como manda o figurino e resolvi que atravessaria o tapete que me levaria até o altar, ao som de uma cantora lírica, que interpretaria uma versão bem emocionante de Ave Maria.
— Pronta? — Daniela perguntou segurando as portas francesas que davam acesso ao jardim da fazenda.
— Sim, mais que pronta.
— Eu me preparei a vida toda para esse momento. A moça sorriu, falou com sua assistente por telefone e em poucos segundos uma melodia suave começou a tocar. Olhei para o meu pai que tentava a todo custo segurar as lágrimas e nos posicionamos em frente à porta que foi aberta lentamente. Na medida em que avançava, sem qualquer pressa, comecei a capturar e assimilar as imagens que se descortinavam à minha frente. Havia duas fileiras de cadeira, uma de cada lado, com assentos suficientes apenas para a nossa seleta lista de convidados. De repente, me dei conta de que todos estavam com suas atenções voltadas a mim. Nesse momento, senti que minhas pernas poderiam me trair a qualquer momento e me segurei um pouco mais em meu pai. Mas foi só olhar para Shawn com nosso filho nos braços, ambos esperando a minha chegada, que uma nova dose de adrenalina pareceu ter sido injetada em minhas veias. Sorri ao ver os dois vestidos com uma roupa igual. Aquela era, com certeza, a cena mais linda que já vira na vida, e tinha certeza de que nunca a esqueceria. Heitor se empolgou quando me viu e esticou os bracinhos, como sempre fazia. Shawn, então, falou alguma coisa em seu ouvido que o fez silenciar, parecia mesmo que ele entendia que deveria se comportar naquele momento. Tão pequenino e tão sensato. Respirei fundo. Aqueles poucos metros que me separavam do grande sonho da minha vida, que era me tornar esposa de Shawn Mendes, pareciam intermináveis Capturei o olhar emocionado de mamãe, e do lado oposto, o de Rafaela, que sussurrou “maravilhosa” quando passei por ela e parei em frente a Shawn. Antes de me receber com um beijo, ele entregou Heitor para Karen e se virou para o meu pai.
— Estou lhe entregando minha vida, Shawn, cuide bem dela — papai disse, emocionado, mas com o tom sério.
— Prometo que farei o impossível para fazê-la feliz. A resposta do meu noivo pareceu satisfatória, pois os dois se abraçaram por longo segundos, e apenas quando papai se afastou, após me dar um beijo na testa, foi que seus lábios roçaram os meus, uma carícia singela, mas cheia de respeito.
— Linda — ele sussurrou e nos voltamos para o padre Marcos, que abençoaria nosso casamento naquela tarde. A cerimônia durou exatamente quarenta minutos e foi perfeita. Aquele padre era famoso por fazer belos casamentos, com grandes reflexões sobre o matrimônio e por vários momentos me peguei pensando em suas palavras e na importância que Shawn e eu teríamos na vida um do outro. Dali, fomos para o salão de festas que fora montado na área da piscina. Após recebermos as felicitações dos convidados, consegui analisar todos os detalhes do meu casamento de perto. Óbvio que eu havia escolhido tudo, mas era diferente ver cada coisa em seu devido lugar. Havia arranjos de flores naturais nas mesas espalhadas pelo gramado e acima delas uma tenda de pequenas luzes que deram um charme a mais à decoração e deixaram Heitor encantado.
— Seu casamento foi lindo, amiga — Rafaela disse ao me abraçar. Além de madrinha de Heitor, ela também foi minha madrinha de casamento; não tinha como ser diferente, Rafa fazia parte da minha história.
— E isso aqui está perfeito — ela continuou, levantando o braço a fim de abranger tudo.
— Eu sei, amiga, é um sonho realizado.
— Posso roubar a noiva? — Shawn perguntou me abraçando por trás e Rafaela nos deixou a sós com um enorme sorriso no rosto.
— O marido da noiva pode ficar chateado — brinquei e ele sorriu. Eu conhecia todos os sorrisos de Leonel e o que seus lábios exibiam, demonstravam uma felicidade extrema.
— Esse cara tem sorte, mas vou arriscar — ele devolveu a brincadeira e me levou para dentro da casa. Atravessamos as salas e chegamos na varanda que ficava do outro lado da casa, com vista para uma lagoa. Vi que em cima da mesa de vime havia uma linda caixa envolta em um belo laço dourado.
— Não comprei nada para você — falei, chateada. Os preparativos para o casamento foram tão intensos, que mal tive tempo para respirar nos últimos dias. O pior é que a cerimonialista já havia me dado a ideia de comprar alguma coisa para Shawn, mas acabou caindo no esquecimento.
— Não fale besteira, você é o meu presente. Sorri, sempre encantada por suas palavras, e o beijei. O gosto de Shawn continuava perfeito, e mesmo depois de um ano juntos, eu ainda sentia aquela sensação gostosa em meu peito, quando nossas bocas se tocavam. Afastei-me e, com cuidado, desfiz o laço. Ao levantar a tampa, encontrei outra caixa, esta, porém, era de madeira envernizada e havia um cadeado com uma pequena chave pendurada nele.
— Uma caixa? — questionei.
— Pensei em continuar nossa brincadeira, mesmo depois do casamento. Sorri, fascinada por sua ideia.
— Está falando sério? Ele sorriu de volta e confirmou.
— Quando li todos os papéis que estavam na caixa de promessas, pude entender seus desejos e anseios em relação a mim. Foi especial saber que você, realmente, me amou por tantos anos, que sempre alimentou esperanças de que fossemos ficar juntos. Eu quero tornar isso um hábito, vai ser nosso jeito íntimo de confessar o que um espera do outro. Achei a ideia tão maravilhosa, isso mostrava que Shawn se importava com tudo que passei para ficar com ele e também com o que eu tinha para falar.
— Eu amei a ideia. Ele me beijou demoradamente e apertou minha bunda, como de costume.
— Pode escrever sacanagem também, vou ler tudinho — ele brincou.
— Que ótima ideia, Sr. Mendes, já estou ansiosa para começarmos essa brincadeira particular. A iniciativa de Shawn levaria mais um elemento de romantismo ao nosso casamento, já que as pessoas não enviavam mais cartas, e muito poucas faziam declarações de amor escritas a mão, como antigamente. O mundo da internet tinha acabado com aquela emoção que antecedia o momento de abrir um bilhete ou uma carta de amor, as coisas estavam aceleradas, as pessoas, cada vez mais exigentes e incompatíveis. Por isso eu agradecia imensamente a Deus por ter encontrado o grande amor da minha vida tão cedo. Eu sabia que nunca me arrependeria, não importava a quantidade de tempo que passasse, eu sempre seria louca por ele.
