— E então, Camila, o que vai beber?
— Uma cerveja. Optei pelo mais seguro, não me atreveria a tomar nenhum dos coquetéis oferecidos pelo lugar e acabar passando dos limites, como havia acontecido algumas vezes na semana anterior. Ele sorriu e pediu o mesmo. Quando me questionou sobre o que queria comer, deixei que ele escolhesse e acabamos com alguns petiscos mexicanos na mesa. Durante a nossa conversa, Rodrigo confidenciou que seus pais viviam no interior de São Paulo, e que ele e Rebeca ficaram morando no apartamento da família, no centro da cidade. Também me falou que o restaurante dos Alencastro era de comida tradicional na época em que os pais o administravam, mas depois que o deixaram na mão de Rebeca, ela decidiu dar uma nova cara ao negócio da família, que pelo jeito, estava dando bastante certo, uma vez que já o expandiu. Além da comida deliciosa e da cerveja gelada, à medida em que o tempo foi passando nossa conversa foi ficando mais fácil e animada, Rodrigo tinha um papo legal, de um cara inteligente e antenado. Ele emendava um assunto com outro, e quando dei por mim, já era quase 11h da noite.
— Obrigada pela companhia meio forçada — agradeci a Rodrigo que não me deixou pagar a conta e ainda me acompanhou até a calçada em frente ao restaurante ainda lotado de pessoas superanimadas.
— De forma alguma. Eu gostei muito.
— Eu também me diverti bastante. Vocês estão de parabéns pelo lugar.
— Então volte sempre que quiser.
— Com certeza voltarei. Tenho uma amiga que ama comida mexicana e tenho certeza de que ela vai adorar isso aqui. Ele sorriu, parecendo satisfeito, e nos despedimos com um beijo no rosto. Fui para casa com uma sensação gostosa que há muito tempo não sentia. Primeiro porque minha sexta-feira que prometia ser monótona, tinha sido preenchida por um programa divertido, e mais importante, eu sequer me lembrei de Shawn Mendes. Repreendi-me na mesma hora por ter deixado meus pensamentos irem até ele e continuei meu caminho. Depois de ultrapassar a guarita na entrada do condomínio, notei que havia vários carros estacionados em frente à casa dos meus pais e estranhei bastante. Não me lembrava de minha mãe ter falado que haveria algum evento familiar e aquilo me intrigou. Como boa curiosa que era, estacionei o carro e dei a volta na casa para chegar à área de lazer onde encontrei vários de seus amigos bebendo, comendo e conversando, todos ainda alheios a minha presença. Caminhei entre eles, cumprimentando alguns conhecidos, até me deparar com Shawn olhando diretamente para a faixa de pele exposta na minha barriga. Senti-me corar levemente. A roupa que estava usando, além de me deixar bem mais esguia e alta, era colada e provocante demais para estar no meio dos amigos dos meus pais e suas esposas. Bom, não havia nada que eu pudesse fazer, além do mais, não pretendia ficar ali.
— Filha! Te liguei a noite toda para que viesse se juntar a nós e você não atendeu. Na mesma hora peguei o telefone que ficara esquecido dentro da bolsa. Vi que havia duas chamadas de Miguel em meu celular e me senti uma safada de marca maior por estar jantando com um homem, ignorando outro e pensando em outro. Tudo isso no mesmo dia. Depois me lembrei que os homens faziam isso com as mulheres, então tudo bem dar o troco de vez em quando.
— Eu estava em um barzinho com um amigo, não olhei o celular. Mamãe arregalou um pouco os olhos, ciente de que Shawn estava perto o suficiente para escutar nossa conversa. A fim de mostrar que não estava ligando para aquilo, continuei: — A que se deve tudo isso, a senhora não me falou nada.
— Resolvemos fazer um churrasco de última hora — ela explicou.
— Venha, vou servir você.
— Eu acabei de comer, mamãe, prefiro apenas beber alguma coisa — informei e fomos para cozinha onde ela insistiu para que eu comesse, mas fui enfática ao recusar, os petiscos que comi tinham sido mais que suficientes. Em vez da cerveja que tinha pensado em pegar, acabei aceitando a caipirinha que um dos amigos do meu pai estava preparando, mas só comecei a tomar quando uma parte do gelo já tinha derretido, não estava a fim de ficar de ressaca novamente. Depois de conversar com algumas amigas de minha mãe, voltei para a área da piscina onde meu pai fez questão de me exibir para seus amigos. A maioria deles eu conhecia desde criança e nem por isso todos os olhares que recebi foram respeitosos. Na última vez em que os encontrei, eu ainda era uma adolescente e vários pareciam em choque ao verem como eu estava depois de tantos anos. Saí de lá assim que pude e parei perto de uma mesa onde alguns senhores jogavam carteado. Ficaria ali tempo suficiente para terminar minha bebida e depois iria embora.
— Está me evitando, Camila? Arfei de susto quando a voz de Shawn soou ao meu lado.
— Impressão sua — respondi, sem olhar para ele. Estava adorando saber que ele realmente tinha percebido a minha indiferença e que, sem querer, o fiz agir e ir atrás de mim.
— Eu sei que estava com ele — ele falou baixo e com desprezo na voz.
— Não é da sua conta — rebati.
— Eu já estou indo para casa e vou ficar te aguardando lá, precisamos
conversar. Senti um arrepio, daqueles que começam na nuca e descem pelo restante do corpo.
— Não temos nada para conversar — murmurei, não queria que meu pai percebesse a tensão entre nós dois.
— Você sabe que temos. Fique mais alguns minutos e depois vá me encontrar. Com estas palavras ele me deu as costas e foi em direção à casa, provavelmente para se despedir de minha mãe. Ah, que ódio desse homem! Foi só eu parar de babar feito um cachorro olhando os frangos assados da padaria, que ele achou assunto para falar comigo. Observei quando ele voltou para fora, se despediu de todos, incluindo o meu pai, que estava distraído com seus amigos, e foi embora. Duas Camilas tagarelavam em minha cabeça, uma queria se manter firme na decisão de não ceder, mas a outra morria de curiosidade para saber sobre o que ele queria falar comigo e se ele queria só falar ou fazer alguma coisa... Aquilo me deixou alvoroçada, mas não me ajudou a tomar nenhuma decisão. Eu estava em guerra comigo mesma, e não tinha ideia de quem venceria, a Camila sensata, ou a curiosa. Uns vinte minutos depois que Shawn saiu, despedi-me de minha mãe e suas amigas que estavam na sala. Saí pela porta da frente e quando entrei em meu carro, encostei a cabeça no volante, sem saber o que fazer. Dirigi devagar e ao passar em frente à casa do meu vizinho, vi que as luzes estavam acesas, sinal de que ele estava mesmo me esperando. Continuei meu caminho até estacionar em minha garagem. Permaneci alguns minutos dentro do veículo e quando tomei minha decisão, senti o coração batendo feito um louco. Durante toda a minha adolescência, sonhei com o dia em que eu tocaria sua campainha e ele, finalmente, me receberia com um beijo de tirar o fôlego, diria que me amava e faria amor comigo a noite toda. Também protagonizei cenas onde Shawn me chamava para termos conversas sérias por causa de ciúmes e inúmeras outras coisas idiotas que só uma adolescente poderia imaginar. Mas enquanto crescia, e principalmente depois que finalmente ficamos juntos, meus anseios mudaram. Por várias vezes o imaginei indo até mim, fosse para conversar, fosse para me seduzir ou se desculpar. Mas em nenhuma dessas vezes, eu era convocada a ir atrás dele, como tinha feito tantas vezes no passado. E era por causa disso que eu não iria. A resolução que tomei no final de semana passado não era da boca para fora. Eu não queria mais me sentir como um cachorro correndo atrás do rabo, e se ele quisesse conversar comigo, ele que fosse até mim e insistisse para que eu o escutasse. Sabendo que tinha tomado a decisão certa, saí do carro, peguei as chaves de casa e me dirigi à porta de entrada.
— Ia me deixar esperando, Camila? Acabei deixando a chave cair tamanho o susto que levei. Não imaginei que ele fosse atrás de mim. Antes que pudesse me abaixar para pegar a chave, Shawnestava ali, com outra roupa, os cabelos molhados de um banho recente e um brilho perigoso no olhar ao se erguer e me encarar. Droga, eu estou perdida.
