Os dias seguintes foram extremamente frustrantes. Eu estava entediada por não ter nada para fazer e me sentia inquieta, pois Shawn não tinha aparecido em casa desde o Natal. Naquele dia, quando atravessei a rua principal do condomínio para chegar à minha casa, não vi seu carro e imaginei que ele havia resolvido ficar na fazenda. No outro dia, assim que acordei, fui discretamente para a varanda bisbilhotar, mas o local onde ele costumava estacionar continuava vazio. O mesmo aconteceu no dia posterior e eu cheguei à conclusão de que ele tinha resolvido permanecer com a mãe até a virada do ano. Pelo menos foi isso o que tentei me convencer, já que era melhor do que aceitar que ele, talvez, estivesse com a Fernanda novamente. Nem mesmo tive coragem de ligar para Karen a fim de confirmar, com medo de que ela me dissesse que não o via desde que ele a deixara em casa. Para tentar esquecer aquilo, desci para o escritório e comecei a ler alguns contratos, para me inteirar dos negócios que estavam em andamento. Quando o dia se foi, eu comi uma salada e fiquei na sala de TV vendo uma série até as 8h da noite, depois subi e fui tomar banho e lavar o cabelo. Fiquei uns 40 minutos embaixo do chuveiro e meus pensamentos não paravam de me trair, me fazendo sonhar que Shawn havia escolhido ficar comigo. Enquanto a água me molhava, eu só conseguia imaginar como seria ter suas mãos fortes deslizando pelo meu corpo; ele seria suave ou estaria com tanto tesão que não conseguiria pegar leve na nossa primeira noite? Infelizmente, eu só saberia disso quando Shawn parasse de negar seu interesse por mim e nos desse uma chance. Depois que saí do banheiro, com uma toalha enrolada na cabeça e outra no corpo, estiquei uma perna em cima da cama e comecei hidratar minha pele com meu creme preferido. Senti uma brisa fresca e percebi que as cortinas e as portas que davam acesso à varanda estavam abertas. Minha cama ficava bem de frente para a sacada que fazia espelho com a do quarto de Shawn, e o imaginei do outro lado, assistindo o meu pós banho de camarote. Motivada por essa ilusão, deixei a toalha cair e continuei passando creme, primeiro nas minhas coxas, depois na barriga e cintura. Então levei as mãos às costas e as desci lentamente pela minha bunda. Demorei bastante tempo venerando cada parte do meu corpo, com leveza e delicadeza. Por fim, chegou a vez dos seios e nessa hora minha imaginação já tinha produzido dezenas de imagens, me deixando excitada. Quando dei por mim, vi que a forma como os manipulava parecia mais uma massagem erótica, como se eu estivesse me estimulando. Quando fui me deitar, estava quente e excitada, mas sonolenta. Pouco antes de cair num sono profundo, prometi a mim mesma que repetiria aquele ritual todos os dias, até que meus olhos se cruzassem com os de Shawn através daquelas portas. No dia seguinte minha mãe me ligou pedindo que eu fosse almoçar com eles. Com preguiça de preparar algo, resolvi aceitar e troquei a roupa que vestia por uma legging e um top, depois coloquei um tênis; pretendia ir para a academia quando saísse de lá. Tranquei tudo e fui até a minha antiga casa andando. Como o almoço já estava pronto, logo estávamos os três desfrutando de uma ótima refeição, como costumávamos fazer. Pouco depois que a sobremesa foi servida, Shawn chegou, me pegando de surpresa. Ele ainda estava um pouco taciturno, o que me fez concluir que ele e Fernanda ainda estavam brigados e que ela, provavelmente, o estava atormentando. Apesar de não gostar de vê-lo daquele jeito, rezei para que estivesse certa. Ele se sentou na cadeira vazia em frente à minha, aceitando o café que minha mãe ofereceu. Fitou o meu rosto de forma intensa, mas percebi que havia um certo conflito em seu olhar. Então ele voltou sua atenção para o meu pai e não olhou mais para mim. Depois de conversar coisas aleatórias, falou que esperava que fôssemos para a fazenda ainda naquele dia, recebendo a confirmação dos meus pais, que afirmaram ser aquele o plano. Eu, entretanto, não abri a minha boca, não pretendia ir para lá tão cedo. Depois que terminei minha sobremesa, pedi licença e levantei-me para ir escovar os dentes. Quando olhei para Shawn, vi seus olhos passeando pelo meu corpo; eles foram das coxas para a barriga e de lá para os seios, cobertos apenas pelo top cavado que eu havia escolhido. Mais uma vez seus diamantes azuis estavam enevoados, mas havia algo mais que eu não consegui identificar. Vi que ele engoliu com dificuldade e fechou os olhos por alguns segundos, como que para se situar. A quebra do contato visual me fez despertar e perceber que nesse meio tempo, minha mãe tinha chamado a atenção do meu pai para alguma coisa e imaginei que ela havia feito aquilo, para que ele não percebesse a interação silenciosa que estava acontecendo entre sua filha e seu sócio. Para evitar que algo constrangedor acontecesse, saí da sala de jantar e corri escada acima, até estar atrás da porta fechada do meu antigo quarto, ofegante e muito excitada. Dois minutos depois, ouvi o barulho de um motor e soube que Shawn tinha ido embora. Fui ao banheiro, escovei os dentes e depois me deitei na cama, ficaria lá até a hora de ir para a academia, onde tentaria eliminar todas aquelas sensações do meu corpo. Tinha certeza de que se não estivesse esgotada, não conseguiria dormir, pois estava bem mais excitada que na noite anterior, após a minha “hidratação”. Aquele pensamento me fez lembrar do olhar de Shawn há poucos minutos e de repente eu soube exatamente o que havia me passado despercebido: conhecimento. Era como se ele conhecesse cada centímetro do meu corpo. Sentei-me abruptamente, quando me dei conta do que aquilo significava: ele tinha me visto massageando meu corpo depois do banho. Ah. Meu. Deus! Dia 30 de dezembro finalmente havia chegado e com ele toda a expectativa do que poderia acontecer entre mim e Shawn na virada do ano. Apesar de toda a insistência dos meus pais para que fosse com eles, consegui convencê-los ao dizer que precisava esperar a Rafaela para irmos juntas. A verdade era que queria que Shawn ansiasse pela minha chegada. Só esperava que aquela tática desse certo.
— Tenho falado com o Davi pelo Whats.
— Rafaela comentou enquanto eu dirigia com destino a fazenda.
— E aí? — perguntei para saber como estava o romance da minha amiga.
— Ele não é de muita conversa, responde só o necessário, sem prolongar muito o assunto; isso é um mal sinal? Torci a boca de um lado para o outro, para dar uma resposta que não deixasse minha amiga desanimada ou triste.
— Não necessariamente. Claro que não posso julgá-lo sem conhecer, mas percebi que naquele dia do churrasco, ele não ficou mexendo no celular. Vai ver não gosta muito de redes sociais. Rafa concordou com a cabeça e abriu um sorriso aliviado, era exatamente aquilo que ela queria ouvir. Quando finalmente pegamos a estrada que levava a fazenda Mendes, senti uma sensação nostálgica e gostosa. Tinha feito aquele caminho durante parte da minha infância e na minha adolescência inteira; na maioria das vezes, suspirando por saber que veria Shawn. Para chegar ao portão de entrada, tínhamos que passar entre as duas fileiras de palmeiras que contornavam o caminho que levava à propriedade — era a parte do trajeto que eu mais gostava. O gramado que ficava em frente à casa principal, estava cheio de carros estacionados. Reconheci alguns como sendo de fazendeiros vizinhos, já que Shawn sempre gostava de reunir o pessoal em sua área de festa.
— O carro do Davi está ali — Rafa anunciou, batendo palminhas.
— Foco, Rafa, lembre-se de que se demonstrar muito interesse, eles caem fora. Minha amiga gargalhou, mas não disse nada, contudo eu sabia que ela estava me comparando com a Camila do passado. O caseiro da fazenda nos recebeu e ficou responsável por subir com as nossas coisas para o quarto em que costumávamos ficar. Atravessamos a sala e fomos para a cozinha, onde encontramos minha mãe e Karen. Com elas estavam Maria das Dores, Geni, esposa do caseiro, e uma outra mulher que eu não conhecia.
— Boa tarde, meninas, que bom que chegaram — Karen disse ao nos ver e se afastou da bancada para nos abraçar. Ainda junto a mim, sussurrou no meu ouvido:
— Chegou na hora certa, querida. Ela olhou significativamente para fora e segui seu olhar. Na mesma
hora avistei uma morena sentada na mesa onde estavam Shawn e Davi. Forcei a visão para enxergar melhor seu rosto, mas para dificultar a minha vida, ela estava de óculos escuros e não consegui reconhecê-la.
— Camila, cumprimente as outras pessoas — mamãe me repreendeu quando viu que eu não tinha falado com ninguém.
— Perdão, mãe, foi sem querer — expliquei e depois fui dando um beijo em cada uma. Quando chegou a vez de Maria, ela falou, baixinho:
— Fica de olho, porque já tem galinha ciscando no seu terreno. Caí na gargalhada e depois confirmei com a cabeça, antes de sair de lá.
— Quem é ela? — Rafa perguntou assim que chegamos na área externa.
— Deve ser filha de algum fazendeiro querendo um repeteco. Shawn já pegou todas elas. Minha amiga me encarou, incrédula, mas não falou nada.
— Oi, pessoal — falei alto, pois não iria dar um beijo no rosto de todos aqueles homens. Rafa fez o mesmo.
— Oi, pai — cumprimentei quando ele olhou para nós. Papai apenas sorriu e piscou para mim, estava jogando cartas com parentes dos Mendes e vizinhos da fazenda, incluindo o seu Luiz, que acenou com um sorriso. Assim que nos viu, Shawn se levantou e foi nos receber. Aquilo era fofo e eu me sentiria lisonjeada, se ele não fosse educado assim com todos os seus convidados.
— Meninas, sejam bem-vindas — disse e abraçou nós duas. Ele estava apenas de bermuda, exibindo o peito e os braços fortes e bronzeados; eu adorava a informalidade que ele adotava quando estava na fazenda.
— Como vai, Shawn?
— Bem melhor agora que vocês chegaram — respondeu com um sorriso charmoso que quase me fez derreter. Diferente dos últimos dias, ele parecia descontraído, bem-humorado e feliz. Só espero que essa mudança não tenha nada a ver com aquela sirigaita ali, pensei comigo enquanto o seguíamos até sua mesa.
— Não sei se vocês se lembram, mas este é o Davi — brincou e o amigo nos cumprimentou com um beijo no rosto. — E esta aqui é a Renata, filha do Zanquete. Na hora em que Shawn falou seu nome, consegui me lembrar dela. Renata Zanquete era filha do dono da fazenda vizinha à Mendes. Ela já compareceu a várias festas ali, e assim como eu, passou metade da adolescência babando em cima de Shawn. Como devia ser uns quatro anos mais velha que eu, era capaz que ele já tivesse ficado com ela.
— Como vai, Camila? Rafaela? — ela disse, nos reconhecendo, já que Rafa costumava ir comigo para fazenda com muita frequência.
— Ótimas e você? Depois das formalidades de praxe, nos juntamos a eles e fiquei me perguntando que tipo de conversa teríamos, estava certa de que não tínhamos nada em comum.
— Querem beber o quê? — Davi perguntou. Ao ver que todos bebiam cerveja, optei por acompanhá-los.
— Pode ser o mesmo que vocês — respondi e olhei para Rafa que acenou em concordância. Davi se levantou e foi à geladeira buscar as bebidas.
— Como eu estava dizendo ao Davi, sua fazenda está cada vez mais linda, Shawn, não canso de elogiar suas terras para o meu pai — Renata disse e percebi o quanto ele gostou da bajulação dela.
— Pretendo morar aqui quando me aposentar, então é sempre bom fazer melhorias. Rafaela me encarou, já sacando o jogo de Renata. De repente Davi chegou com as cervejas, me impedindo de fazer qualquer sinal, porém minha amiga me entendia só pelo olhar e sabia que eu também já tinha percebido.
— Qual a programação de
amanhã, Shawn? — Rafa perguntou e todos olhamos para ele.
— Teremos uma dupla sertaneja que trabalha na casa de shows do Davi e um DJ; acho que vai ser animado. Rafaela aproveitou o gancho e puxou assunto com Davi para isolar as investidas de Renata, que parecia estar atirando para todos os lados, dado o sorriso matador que ela lançou ao crush da minha amiga quando ele lhe entregou uma cerveja.
— Está tudo bem, Camila? — Shawn perguntou baixinho, tocando meu antebraço.
— Está sim, só estou um pouco cansada da viagem.
— Quer subir para descansar? Neguei com a cabeça, jamais o deixaria sozinho com essa Renata. Mesmo contrariada, continuei com eles ali, à beira da piscina. Depois de algumas cervejas, Renata deixou de existir e consegui dar boas risadas com o colírio que estava ao meu lado. Quando Zanquete foi embora levando sua filha atirada, o clima ficou ainda melhor, especialmente quando meu pai subiu para o banho, pois, enfim, pude parar de me policiar. Nessa hora Rafaela chamou Davi para entrar na piscina, já eu, permaneci sentada enquanto Shawn ia pegar mais cerveja.
— Fiquei feliz por ter decidido passar o final de ano aqui — declarou ao me entregar uma garrafinha, já era a quinta ou sexta que eu bebia naquela tarde.
— Eu também, tenho a sensação de que será um dos melhores anos — falei com esperança de que finalmente alguma coisa acontecesse entre nós. Ficamos conversando e à medida que o tempo passava, os vizinhos iam se despedindo, de forma que na hora do jantar havia apenas nós e dois casais, parentes de Karen. Tanto ela quanto Shawn insistiram para que seu Luiz ficasse, mas ele disse que seu filho chegaria naquela noite ainda e precisava recepcioná-lo, então se foi, dizendo que voltaria no dia seguinte para a virada de ano. Após o jantar, o tradicional jogo de cartas seguiu noite adentro e começou a invadir a madrugada, hora em que todos sucumbiram ao cansaço e foram se recolher, restando apenas nós quatro, que continuamos conversando.
— Gente, já são quase duas da manhã, eu vou subir — falei, bocejando de sono.
— Eu vou ficar mais um pouco — Rafa disse e eu já sabia que ela e Davi terminariam a noite no mesmo quarto.
— Boa noite, então. — Levantei-me e acenei para eles, depois olhei para Shawn me despedindo, mas ele apenas balançou a cabeça, os olhos fixos em mim. Fui para dentro de casa, mas antes de chegar às escadas, notei que as luzes do escritório de Shawn estavam acesas. Curiosa, desviei do meu caminho e fui até lá. Passei os olhos por todo o ambiente e vi que poucas coisas haviam mudado. Ao visualizar a mesa, vi minha caixa dourada e me aproximei. Ela continuava trancada com um pequeno cadeado que Shawn comprou, ficando com uma chave e dando a outra para mim.
— Achou que eu iria me desfazer dela? — A voz de Shawn soou bem perto do meu ouvido e fez meus pelos se arrepiarem. Logo depois, comecei a sentir o calor de seu corpo nas minhas costas.
— Eu era tão pentelha, não te deixava em paz.
Minha voz saiu meio ofegante o que me deixou um pouco sem graça. Ao virar-me, o encontrei a ínfimos centímetros de mim. Engoli em seco e, ainda mais sem jeito, caminhei até o sofá.
— Sinto um pouco de falta daquela Camila — confessou.
— Eu era só uma garota insolente, você teve muita paciência comigo. Shawn sorriu e se sentou ao meu lado.
— Um dia temos que abrir e ler tudo que tem aí dentro — ele sugeriu e eu me lembrei vagamente das coisas que eu escrevia e jogava nessa caixa.
— Tenho medo do que vamos encontrar — respondi e mordi o lábio. Ele ficou encarando a minha boca enquanto falava
— Escrevi alguns enquanto você esteve fora.
— Sério? — perguntei, tomada de surpresa, eu não fazia ideia e aquilo me perturbou. Levantei-me, nervosa demais para ficar quieta, mas na mesma hora me repreendi. O que tinha acontecido comigo? Shawn estava dando todos os sinais de que queria uma aproximação e eu agindo como uma boba inexperiente que não sabia o que fazer.
— Aham — respondeu e se esticou no sofá, depois pegou o controle e ligou a TV. Tive um déjà vu ao vê-lo naquela posição relaxada.
— Essa cena parece familiar — brinquei. Ele sorriu e bateu a mão no assento ao seu lado, num pedido silencioso para que eu me sentasse. Assenti, respirei fundo e me juntei a ele. Shaw , certamente percebendo o quanto eu estava nervosa, colocou um filme qualquer e começou a relembrar loucuras da minha adolescência. Não faltaram histórias que nos renderam boas risadas. Eu era uma verdadeira praga, que não media esforços para chamar a atenção dele, sem ter a menor ideia do quanto estava sendo inconveniente. Shawn era um verdadeiro santo.
