Capítulo 3 - Compatível

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Bela Dimitrescu

— Enfim... hora do jantar. — Ouço minha mãe dizendo e sinto minhas irmãs saírem do quarto atrás de mim.

Somente eu permaneço no lugar olhando fixamente para Heller, hipnotizada, mas surpresa por um humano não me ver com pavor, não ter medo do que eu sou, isso é a primeira vez que me acontece em séculos desde quando me tornei o que sou hoje.

Sinto um olhar de minha mãe atrás de mim, quase que me atravessando. Viro as costas para Heller com um sorriso no rosto e um pouco ansiosa de como será o gosto de seu sangue.

Indo em direção a sala de jantar, chegamos no cômodo com a mesa já arrumada, com pratos, talheres e taças sobre a mesma. Carnes, aves e frutos do mar. Se não fosse o forte cheiro de Heller, já teríamos sentido a comida nesta mesa no momento em que foi colocada.

Talvez a mãe tenha pedido para o Duque para fazer os pratos.

Sentamos em nossas cadeiras, Heller ficou na ponta da mesa, assim como nossa mãe do outro lado, minhas irmãs e eu ficamos na lateral todas juntas, lado a lado. A mãe permanecia com as pernas cruzadas e assim como ela, nossos olhos também estavam mais fixados em Heller.

Não comemos essas porcarias além de sangue de homem, raramente comemos sua carne.

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Heller comeu tudo que havia na mesa. Que fome absurda... vejo que a situação de alguns dias atrás realmente estava com muita escassez em relação ao alimento no vilarejo. Com aqueles Licanos rondando, não é novidade.

Bom... o mesmo vale aqui no castelo.

Vêmos Heller encarando a janela ao seu lado, vendo ventos intermináveis de neve e a escuridão lá fora.

— Algo lhe incomoda, garoto? — Perguntou a mãe com o tom de voz calma e serena.

— Apenas pensativo. — Disse ele colocando o cotovelo do braço na mesa e apoia seu queixo na palma de sua mão, e alí fica olhando em direção a janela.

O maior problema disso é ver o pescoço dele todo aberto, tenho certeza que todas as minhas irmãs e a mãe pensam da mesma forma.

— Heller. — Nossa mãe chama sua atenção e o mesmo apenas vira seus olhos em direção à ela. — Tenho certeza de que sabe o que somos e o que queremos, certo? — Perguntou minha mãe parecendo impaciente no momento.

Heller suspira soltando o ar pela narina. Ainda mantém sua postura e forma.

— Já sabia no momento em que ví aqueles olhos dourados. Eu ainda tinha dúvida naquele momento, admito... — Ele não apresenta nada para nós com gesto ou expressões. — Então vampiros realmente existem hein...

Não vejo medo, pavor, temor. Se ele soubesse o que são de verdade aqueles homens parecendo espantalhos magros seria usado algo a mais em seu argumento, se é que já sabe deste conhecimento mas não levantou em questão.

— Se o preço de ficar neste castelo é meu sangue, não me incômodo em pagar esta conta. — Disse Heller, ainda permanecendo com o queixo apoiado pela palma de sua mão. — Mas não quero ser apenas um objeto que pode ser usado para usufruir quando bem entender. Eu quero ter algum papel neste castelo, um papel que não seja tão relevante assim.

— Não se preocupe com isso. — Disse minha mãe de imediato após Heller acabar de falar. — Eu aprecio muito como entendeu a sua situação... há tarefas que minhas filhas não conseguem fazer fora do castelo. — Minha mãe acende seu cachimbo agora que não há mais comida na mesa, pois poderia comprometer o sabor da comida com o cheiro da droga.

Heller DimitrescuOnde histórias criam vida. Descubra agora