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Estava em pé ao lado do caixão de Alex. É, infelizmente, ela estava ali. Vestida de terno branco, com seu rosto sereno e sem seus óculos de secretária.

Meus olhos lacrimejaram só de pensar que não a veria nunca mais. Nunca mais veria seus lindos olhos verdes e seu sorriso, sua voz grossa e sua risada gostosa, nunca mais teria o seu abraço e os seus puxões de orelha.

Olhei para cima e respirei fundo, no intuito de não deixar que as lágrimas caíssem. Eu não gosto de chorar em velórios.

Segurei a mão gélida de Alex com uma mão, e com a mão livre tirei alguns fios de cabelos de sua testa, percebendo assim que ela estava com bastante maquiagem, o que queria dizer que seu rosto ficou muito machucado.

Prensei os lábios, tentando engolir o choro, e baixei meus óculos escuros, ficando indignada novamente por essa merda toda ter acontecido.

Tirei minha mão do seu rosto e levei à beira do caixão.

- Eu vou sentir tanto a sua falta. - Falei após me inclinar, para que ninguém mais ouvisse.  - I'll always love you, Vause. - Endireitei minha postura e fiquei segurando sua mão mais um pouco.

- Oi. - Senti um leve aperto em meu ombro. - Você quer café?

- Só um pouco. - Respondi e Priscilla se afastou indo buscar.

Soltei a mão de Alex e abri minha bolsa, pegando o álcool em gel e passando em minhas mãos.

- Aqui. - Disse me entregando a xícara.

- Obrigada. - Agradeci indo me sentar em um banco vazio.

Olhei meu relógio e notei que já faziam algumas horas que eu estava ali. Suspirei e terminei o meu café, indo deixar a xícara na mesa de uma salinha.

Encontrei Priscilla lá conversando com uma senhorinha e voltei a sentar no banco vazio, acabei dormindo com a cabeça apoiada na parede.

- Eu aposto que você não comeu, não é? Tomou café e mesmo assim dormiu. - Ouvi a voz conhecida à minha frente e abri os olhos rapidamente.

- Alex? - Me levantei pulando em seus braços e a apertando.

- Em alma. - Ela disse rindo.

- Como assim? - Franzi as sobrancelhas. - Alex, como você veio aqui? - Falei olhando ao redor e notando que só havia nós duas ali. - Cadê todo mundo?

- Você meio que está sonhando. - Ela disse fazendo uma careta. - Mas não é bem um sonho, eu não consigo te explicar exatamente. Não tenho muito tempo. - Ela disse e fiquei em silêncio, a abraçando mais. - Ele disse que eu não podia demorar. Eu só queria te ver mais uma vez. - A olhei e ela estava com a feição triste.

- Alex, por que você? Você tava na sua melhor fase e-

- Shh... eu sei que é bem merda. - Falou pondo a mão ao lado do meu rosto. - Mas iremos nos reencontrar em outra vida. E se você pedir muito para Ele, Ele vai acabar deixando você me visitar nos "sonhos" vez ou outra. - Falou a última parte como se fosse um segredo. - A morte não é o fim.

Meus olhos encheram d'água e me permiti chorar em seu peito.

- I'll always love you too, Smith. - Falou e sorri. Ela ouviu o que eu falei à beira do caixão. - Se cuida, ou eu puxo seu pé à noite, okay? - Pediu se afastando. - E coloca uns remix da Lana Del Rey no meu enterro amanhã de manhã. - Falou sorrindo antes de sumir na luz branca.

Me virei pro banco e me vi dormindo sentada com a cabeça apoiada na parede. O que eu faço?

Enxuguei as lágrimas e sentei em cima do meu corpo. Acabando por acordar em um susto.

- Natalie, você tá bem? - Priscilla estava com a feição preocupada em minha frente e afirmei com a cabeça.

- Vamos pra casa? - Pedi me levantando e ela abraçou os meus ombros andando comigo para fora dali.

...

- Sério que você pediu pro moço colocar as músicas da Lana Del Rey versão remix? - Priscilla perguntou incrédula enquanto voltávamos do cemitério. - Não tem medo dela puxar seu pé?

- Ela que pediu, ue. - Dei de ombros e Priscilla me olhou com um ponto de interrogação na cara, mas logo focou na estrada.

- Ah entendi, vocês conversaram isso antes dela morrer. - Falou após um tempo.

- Não. "Sonhos". - Fiz aspas com os dedos.

- Nossa. Sonhos são impressionantes, não dá pra acreditar que a gente cria tudo isso.

- Eu não criei essa conversa. - Falei séria. - Claro que tem coisas sem sentido que aparecem nos sonhos, óbvio que criamos, mas isso e outras coisas eu tive certeza que são reais de alguma forma.

- Uma realidade paralela? Outra dimensão? Viagem astral? - Perguntou.

- Exatamente algo assim. - Falei lembrando de meu sonho com ela. - Têm sonhos que não são apenas sonhos.

Ela fez um barulho nasal e ficamos em silêncio.

- Você já sonhou comigo? - Perguntei quebrando o silêncio.

- Sim, poucas vezes.

- Como foi seu primeiro sonho comigo?

- Ah, uhm... não foi nada demais. - Falou quase falhando.

- Sonhou com coisas nada inocentes, né? Eu tenho esse efeito, não precisa ter vergonha. - Brinquei.

- Não foi isso, convencida. - Ela rolou os olhos. - Eu vi você da janela da minha casa em Portugal, você passou correndo, mas olhou pra mim e eu soube seu nome. Sim, isso é bizarro, porque eu nem te conhecia ainda. Então, eu terminei de me arrumar e fui pra um desfile com umas amigas. E eu te vi por lá. - Deu uma pausa e riu. - Foi engraçado que você ficou com vergonha e fechou uma janela que tinha na sua frente pra eu não te ver. Enfim, encurtando, eu acabei sentada ao seu lado quando uma garota estava cantando uma música de Girl in red...

- I wanna be your girlfriend. - A interrompi.

- Era essa daí mesmo. Daí eu sugerí que você cantasse também e você nem olhou na minha cara, mas cantou tão maravilhosamente bem. E foi só.

Fiquei em silêncio e olhei para a janela. Tudo fazia tanto sentindo nesse momento. Eu deveria contar que eu estava de fato naquele sonho?

- Como você sabia qual era a música? - Ela perguntou e nossos olhares se cruzaram.

- Eu... tive o mesmo sonho. - Respondi baixando o olhar em seguida.

Beautiful StrangerOnde histórias criam vida. Descubra agora