Capítulo 04

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Carla

Agora estamos almoçando, com o Lucca em um cadeirão entre a Pocah e a Toya e de frente para mim.

Bem que o garotinho falou que estava com fome. Devorou o prato de sopa de forma incrivelmente rápida, e agora estava comendo mais um pouco.

Acabo sorrindo, abaixando a cabeça, e pensando "O apetite de ogrinho também é igual ao do pai."

— Meu Deus, bebê! — Toya fala — O tio Thu deve tá te matando de fome, pra você comer assim. Bem que eu disse, mãe, que o pobi ficar sozinho com o meu tio não ia dar certo. O tio Thu não cozinha nada!

Eu e Pocah não aguentamos com essa menina e caímos na risada.

— Filha... O seu tio consegue se virar pra fazer tudo que o Lucca gosta de comer. Você sabe disso. Ele tá com essa fome toda porque não estava comendo direito desde ontem, com dor de garganta. Só queria suco e água de coco. Lógico que quando melhorasse um pouco, ia estar morrendo de fome, né. — Pocah responde, ainda rindo.

Mesmo achando graça do que a Toya disse, minha atenção se prende em duas informações que seriam impossíveis passar em branco: o fato do Arthur estar cuidando do filho sozinho e, que ele aprendeu a cozinhar tudo o que o filho gosta.

Mas o que não para de martelar na minha cabeça é: E a mãe do Lucca? Trabalhando? Viajando? Ele passa apenas alguns dias com o Arthur?

De repente o telefone da Pocah toca. Antes de atender, ela olha para mim e logo cochicha algo com a Toya, que confirma com a cabeça olhando para ela.

—Oi irmão! — ela responde, atendendo uma chamada de vídeo, pela forma como segura o celular, voltado para ela e as crianças.

Vejo quando os olhos do Lucca brilham, e o sorriso mais lindo que já vi na vida aparece no rostinho sujo de sopa enquanto ele solta um gritinho rouco de "Papai!".

Antes mesmo de ouvir a voz "dele", meu coração dispara.

—Oi irmã! Tive um intervalo agora. Oi, meu amor!! — Percebo claramente como a voz dele muda ao falar com o filho. Sinto como se fosse desmaiar.

— Papai! Eu tomô a sopa tudo, oh! — O Lucca responde, tentando mostrar o prato que está preso no tampo do cadeirão para evitar maiores sujeiras.

— Isso mesmo, campeão! Tem que comer tudo pra ficar forte e a gripe ir embora rápido, ok?

— Hum rum — Ele responde lambendo o dedinho sujo e eu não consigo não sorrir.

É quando ele me olha sorrindo também e, faz o que eu menos esperava, solta um beijinho com o biquinho lambuzado.

Fico tão boba com a cena, que solto um beijo de volta, vendo ele rir, e esquecendo completamente que o Arthur está acompanhando todas as reações do filho pelo celular. Até que escuto ele falar:

— Nossa, filho!! Que sorriso mais lindo e que beijo gostoso! Pra quem foi, meu amor?

— É pá a tia nova que deu abaço, papai!

Na mesma hora meu corpo todo gela. A Toya que acaba me salvando:

—Oi tio Thu!

—Oi princesa linda!

— Que horas você vem hoje? A gente ainda vai no parquinho, né?

— Princesa, acho que hoje não vai dar. O tio tá atrasado aqui e só deve chegar aí na hora do jantar, então o parquinho vai ficar pra outro dia,ok? Principalmente com o Lucca gripado, a gente não pode sair à noite. Mas, prometo que levo sorvete de chocolate para a sobremesa. Tá certo?

— Obaaa!! Tá bom, tio!

— Cuida do Lucca pra mim hoje, ok? Você sabe que eu só confio em você.

Escuto ele soltando um beijo pra ela, que sorri de volta:

— Certo, tio! Cuido sim. Beijo!!

— Bejo, papai!!! Te amo!! — o Lucca também responde.

— Também te amo muito, filho!!


Mesmo sentada, sinto como se fosse desmaiar. Uma sensação estranha no estômago, mãos suadas, taquicardia.

Pocah pega o celular, saindo da sala, enquanto continuo lá, tentando entender o porquê estou tão nervosa assim.

Enquanto isso, ajudo Toya a limpar um bebê todo lambuzado de sopa e retiro ele do cadeirão.

Na mesma hora ele pede colo e saímos para a varanda dos fundos.

Toya pede para ele esperar comigo, enquanto vai montar o tapete tipo tatame e ele fica quietinho sentado no meu colo.

Escuto passos vindo da sala e Pocah aparece no meu campo de visão, paralisando por um instante, antes de vir sentar próximo a mim.

Ela alterna o olhar entre meu rosto e menininho em meu colo, e começa a falar:

— Ainda não consigo acreditar que você está assim com ele, em seu colo. Mas, sendo sincera, eu sempre soube que vocês iriam se adorar instantaneamente quando se conhecessem.

Faço carinho no Lucca, enquanto ele está concentrado brincando com uma mecha do meu cabelo, com um sorrisinho de canto igual ao do pai.

Só então observo com calma o tapete, os brinquedos e lembro do cadeirão e do cercadinho e de todas as coisas de bebê disponíveis na casa.

É uma estrutura muito bem montada para ser apenas por um dia.

— Você tem tudo pronto aqui pra ele, Pocah. Ele fica muito aqui? — pergunto curiosa.

— Sempre que o Arthur tem gravações externas ou muito longas, ele fica aqui. Coisa de duas vezes na semana. Às vezes três. O Arthur não confia deixar ele sozinho com uma babá no apartamento.

"Sozinho com uma babá"? Antes que eu consiga controlar, a pergunta que está me matando escapa:

- E a mãe dele??


Vejo ela ficar desconfortável com minha pergunta e, involuntariamente, sinto um aperto no peito, segurando o bebê um pouco mais próximo de mim, e ele acaba rindo.

Nesse instante a Toya retoma e chama o Lucca para ir brincar no tapete já montado.

Quando os dois se afastam, ela enfim responde:

— Amiga... Não tenho o direito de contar uma história que é do Arthur, mesmo tendo acompanhado tudo de perto. Nem mesmo me sinto confortável com isso. Ainda mais com você.

— Eu entendo, amiga. Desculpa. Mas é que a curiosidade é enorme. O Toya falou como se não gostasse dela. Vocês falam como se o Arthur estivesse cuidando dele sozinho e o Lucca não perguntou em nenhum momento pela mãe. Qual criança doente não pede pela mãe? Eu fiquei completamente perdida.

— Mas uma coisa que você precisa saber é que ela já não está na vida deles há tempo suficiente pro Lucca estranhar ela.

Não vou negar que ouvir aquilo de deixou ainda mais curiosa do que antes. Mas também acendeu uma pequena chama, que jurei que já tinha apagado muito tempo atrás. Tento mudar o rumo que os meus pensamentos tomam:

— Há quanto tempo?

— O que?

— A quanto tempo ela não está presente? Isso você pode me dizer?

— Desde que o Lucca estava com 10 meses.

Fico chocada com a resposta e meu olhar vai imediatamente para o anjinho brincando logo a frente.

— Como é possível, amiga?? Ele era só um neném!!

— E é por isso que todos que conhecem a história completa, simplesmente não a suportam.

— Ainda não consigo acreditar... Como uma mãe pode querer não fazer parte da vida do seu bebê?

— Carlinha, o Lucca é do Arthur e ponto. — volta a falar — Ele anda feito louco, trabalhando e cuidando do menino sozinho... E é um paizão da porra, viu! Nós ajudamos como podemos, mas nem tanto porque aquele cabeçudo é muito orgulhoso e teimoso. E a família dele sempre vem aqui pro Rio. Ou quando ele tem uma folga maior, ele vai para Conduru com o pequeno.

Tem outra dúvida, ainda martelando na minha cabeça:

— Eu conheço ela, Pocah?

Percebo que seu desconforto aumenta e ela me responde:

— Acho que não... Não eram nenhuma daquelas mulheres que sempre inventaram que o Arthur tava pegando. Mas por favor, vamos mudar de assunto? Entendo que você ficou curiosa por causa do Lucca, mas...

Interrompo ela, sem deixar terminar:

— Tudo bem! Eu não tenho direito nenhum de estar perguntando nada da vida do Arthur.

— Você sabe muito bem que não é assim, Carla. Mas é que essa história de vocês sempre foi complicada e nunca terminou direito. Agora todos estão tendo que lidar com as escolhas que fizeram de forma precipitada, quando estavam magoados e com raiva.

— Acho melhor a gente mudar de assunto.

— Concordo!


Minha cabeça roda sem parar, tentando assimilar todas as informações que recebi desde que cheguei aqui.

Menos de 48h de volta ao Rio, e os meus pensamentos só giram em torno do Arthur e do filho dele.

Brincadeira, né??

Deus!! Que jogo é esse que o Senhor resolveu fazer na minha vida, hein?

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