Cais de Erel

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Há cerca de cem anos, um monge do Monastério das Oliveiras pesquisava sobre os povos antigos e o uso do poder medicinal de certa planta vermelha, encontrada na extremidade norte do país, por eles nomeada rama roxa nortista. Rara de se encontrar, a erva era um item valiosíssimo nos comércios da cidade de Erel. Um aventureiro que, em jornada pela Floresta Lunar, obtivesse um bom punhado da erva, é possível que recebesse por ela uma boa quantidade de moedas, talvez suficientes para comprar uma fazenda com vacas leiteiras.

O monge Jacinto, em uma viagem a Aoklan, leu em um pergaminho, que um certo unguento da erva seria capaz de prevenir até mesmo ferimentos fatais. Desde cedo, Jacinto tinha vários incentivos para estudar a especiaria e dedicou-se ao estudo de tal unguento.

Os monges do monastério tinham a missão de buscar o conhecimento do mundo e de guardar a história dentro de seus muros e, por muito tempo, esse foi o seu principal papel. No entanto, um dia o monge oráculo viu nas águas do salão das almas, a visão de que o conhecimento dos mistérios antigos traria desgraça a um monge e ao seu povo, que eles não deveriam deixar os muros de sua cidade, pois os reis estavam envenenados com sede de poder e que a deusa da morte encheria seu cálice de sangue nas guerras vindouras, sendo-lhes revelado para não interferir e deixar o fluxo natural dos acontecimentos desencadear as agravantes para o mundo.

Desde então, os monges abandonaram as peregrinações e deixaram de se envolver nas políticas alheias, voltando sua atenção à meditação, cultivo da lavoura e estudo da projeção astral. Mas o monge Jacinto, pelo seu fascínio no estudo medicinal da rama roxa, fugiu da cidade e passou a peregrinar pelo Leste do país.

Os monges carregavam consigo um medalhão de cobre com o formato semelhante aos limites das terras pacíficas, gravado com os dizeres "Todos os deuses guiam minha jornada" escrito numa língua antiga não mais usada e já desconhecida pela geração atual. O medalhão dava o direito e a segurança aos seus possuidores, para cruzar todo o país e concedia a proteção divina nas viagens. Até hoje há poucos relatos de violação desse estabelecido.

Já no quinto ano de sua jornada, Jacinto chegou à cidade de Cais de Erel, a maior cidade comercial do lado Leste. Por estar estrategicamente localizada na enseada do mar nortenho, vários navios de comerciantes atracavam, vindos do oriente, trazendo os mais diversos tesouros e logo a cidade se tornou o centro de todo o comércio. Piratas, contrabandistas, comerciantes do oriente, todos se encontravam ali para vender as especiarias de seus países ou fazer uma pausa para desenjoar do balanço do mar.

Num dia típico da quinzena solar da época da colheita, os bordéis de Erel lotavam, as tabernas ecoavam os cantos festivos de quem celebrava a chegada às terras firmes, as prostitutas desfilavam com seus seios aparentes, seduzindo os viajantes, tal como as árvores-sereias. As barracas de comerciantes se estendiam pelas ruas como uma grande favela colorida. Pedras, tapetes, ervas, ouro, vestes, armaduras e armas, tudo podia se encontrar ali, na avenida. E os comerciantes gritavam frases prontas, em tom bem-humorado, atraindo os clientes para si.

Jacinto levou doze sóis para conhecer todo o mercado de Erel e, de barraca em barraca, procurava a rama roxa nortista, já sem esperança de encontrá-la, achando mais provável encontrar apenas alguma informação, do que a rara especiaria.

— Boa tarde, meu senhor! — disse o monge, a um comerciante. Jacinto tinha uma simpatia espiritual, era jovem e conversava com um sorriso no rosto. — Como foi o seu dia de vendas?

— Ah, o monge do monastério... — disse o comerciante, como se quisesse destacar que o forasteiro já começava a ser notado como um personagem entre os barraqueiros. — O "excêntrico monge". Diga-me monge, conseguiu as informações que procura?

— Não, infelizmente não, acredito que nem mesmo os mares de Cais de Erel vai me fornir dessa bendita erva — disse Jacinto, manipulando os objetos expostos na bancada.

Aspirante à ObliteraçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora