Capitães de Areia

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Dário chegou na grande biblioteca antes mesmo que a mesma fosse aberta. No dia anterior em uma conversa de bar, Celsius havia gerado um pensamento que roubou seu sono da noite, como uma criança se acostumando com a vida, acordando a cada ciclo do sono. Assim que levantou, entusiasmado, ele bateu quatro vezes com força na porta da biblioteca. Que estava fechada, ainda a algumas horas de ter o turno iniciado.

— Ensinador!? — chamou Dário num grito, voltando a bater mais algumas vezes, olhando pelas brechas entre a madeira na tentativa de visualizar o interior. E só cessou, ao ouvir o trincar de chaves que se batiam ao passo que o homem vinha andando pra responder o alvoroço.

— Ensinador!? — gritou novamente.

— Sóis?! O que queres tão cedo? — O Ensinador reconhecia a voz de Dário, que há tempos trabalhava na reescrita dos pergaminhos recuperados.

— Distorção da paz! O que queres tão cedo? — disse abrindo uma pequena lacuna que só parte do seu rosto se fazia visível. Dário avançou empurrando a porta entrando de vez na biblioteca.

— Preciso fazer algumas consultas. É urgente! — a excitação de Dário tão incomum era, que até mesmo o Ensinador fermentou curiosidade.

— E que urgência não poderia esperar algumas horas até que abríssemos?

Dário não respondeu, ao invés disso, correu até a área onde trabalhava a reescrita, pegou um grande manuscrito e passava os dedos no índice até encontrar o capítulo que queria. O Ensinador havia seguido ele, ainda não decidido se voltaria a dormir ou se dava atenção a curiosidade.

— Qual a recompensa do Rei para quem trazer o sacrário? — perguntou levantando a cabeça para o homem que agora só o seguia com os olhos.

— Ora, sabe quantos homens já perdemos no deserto? Quantos guerreiro Sanud e Capitães de Areia? — respondeu o Ensinador ainda não compreendendo as intenções de Dário — o Rei é capaz de dar a própria filha em casamento para o grupo que conseguir recuperar. Também é oferecido a lâmina dourada, outra relíquia milenar. Mas nem mesmo os homens com a dobra do sol nos trazem resultados.

— Eu tenho a pessoa certa para essa missão, não entende? Ravih é quem vocês estavam precisando.

— Ah, seu amigo, o jovem de olhos vermelhados, ainda acredita em profecias?

— Ensinador, apenas me diga o que eu preciso saber sobre o sacrário — o suspiro do homem se fez audível, e ele cruzou o salão até a estante de livros.

— O sacrário da consumação do sol, é meramente a personificação de nossa fé. Dada espiritualmente pelo deus sol aos antigos, ela garantia a passagem do espírito da realeza para o plano além da vida — o homem passou os dedos na lista de livros e retirou um volume pequeno do imprensado de livros que se espremiam para caber um do lado do outro. A remoção fez com que os que continuaram na prateleira, se ajustasse ao espaço, de modo que o que foi removido não fizesse falta na estante.

— Nossa história está moldada com o sacrário. E com o sumiço dela, duas gerações de Reis não podem vencer seus lutos, pois a realeza não está fazendo a passagem do sol e estão caindo no vazio da não existência, até que seus restos mortais sejam cremados no sacrário.

O Ensinador jogou o pequeno livro sobre a mesa e disse com exortação;

— Você deveria ter buscado conhecer nossa história no dia em que pisou aqui!

Dário sentiu que ele tinha razão e pegou o livreto, imediatamente reconheceu as gravuras rupestres que estampavam a capa, as mesmas que tinham no grande corredor dos portões principais da cidade.

Aspirante à ObliteraçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora