O Solitário Tigre

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Uma rede de cipó trançado bamboleava de um lado ao outro às sombras projetadas pelas copas das árvores na ilha de Pazzio. O vento sacudia as ramas e trazia a tranquilidade do que parecia ser mais um dia comum. O astro iluminador já havia se posicionado marcando metade de seu turno e enquanto muitos druidas repousavam após suas refeições, Anroff se balançava na rede, observando as crianças que brincavam nos grandes galhos e raízes altas de uma árvore.

Qualquer ancião da aldeia repreenderia aquele jogo que os mancebos brincavam, a princípio pela altura que estavam, como também pela malícia do mais velho em abusar das crianças, que apesar de tudo se divertiam.

De um galho ao outro, saltavam com toda agilidade proporcionada pelos corpos leves, fugindo de um druida um pouco mais crescido que os caçava com um chicote de urtiga. A brincadeira penalizava com uma chibatada a criança que estivesse ao alcance do chicote no fim da contagem. A urtiga ao entrar em contato com a pele, soltava pelos que penetravam o tecido como pequenas agulhas, abrindo caminho para os fluidos que irritavam a pele e gerava uma coceira intensa e agonizante que deixava a pele empolada como uma ferroada de abelha.

Anroff se balançava na rede, dando goladas em sua cabaça de ervas fervidas, gargalhando da perversidade da brincadeira que era comum para aquele povo, já que servia de treinamento para guerreiros mais ágeis. Parecia mais um dia ordinário na pacífica ilha se não fosse por uma sentinela que se aproximava com a expressão de quem findaria aquela paz.

— Anoru maculi, grabadan kari — disse o druida em sua língua. Anroff cessou o balançar da rede cravando seu pé no chão. Sua expressão enrijeceu em segundos e com um súbito movimento se colocou de pé, acompanhando o druida que apressadamente ia em direção à praia.

Com a palma da mão apoiada na testa o minguante projetava uma sombra nos olhos, enquanto avançava nas águas até que as ondas quebrassem sobre seus pés, arrastando o véu da espuma do mar pelas areias.

De certa distância, zarpado a duas mil jardas, um navio balançava as velas diferentes com o vento da tarde. Velas brancas, surradas pelos desafios da viagem, velas diferentes dos navios piratas que vez ou outra descobriam aquelas ilhas, velas que trouxeram a Anroff um sentimento que embrulhou o estomago, atiçou seus nervos e encheram seu corpo de adrenalina. Uma ira fez com que ele pressionasse seus dentes, fazendo seus lábios se contraírem quando viu estampados nas velas o símbolo de Elosfouth, o símbolo da fé dos anjos.

— Kari? — perguntou o druida ao minguante sobre a possibilidade de perigo. Anroff fez que sim com a cabeça e deu um comando pra que o deixasse sozinho na praia. "Eu vou afundar esse navio" disse em língua druida.

Anroff sentou-se nas areias e encarou o navio por horas, não era possível ver dali a tripulação, mas nem se questionou se os tripulantes eram soldados ou não, a estampa dos elos nas velas foi suficiente para condenar o navio ao naufrágio.

Demorou até que os botes descessem, e quando quatro deles desceram e começaram a remar sentido a ilha, o sol já estava quase se despedindo. Talvez fosse mais sábio para a tripulação esperar o próximo amanhecer para atracarem, mas o desejo de pisar em terras firmes e descobrir o que havia naquela ilha, cuja descoberta não estava mencionada nos mapas, animou os soldados dos anjos atiçados por um pensamento de recompensa.

Os botes quase cederam pelo peso das armaduras dos homens que tumultuavam três das embarcações que balançados pela maré, lentamente remavam. O ventar lançava os tecidos dos longos estandartes segurados à proa das pequenas embarcações para frente, quase como empurrando os botes para praia. Os homens já preparavam as tochas para iluminar a escuridão que premeditava o fim do dia.

Na embarcação do meio, sentado entre dois soldados bem armados, o líder da expedição apurava a visão do que via a frente, mas naquela distância só via um borrão na orla da ilha.

Aspirante à ObliteraçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora