Acordos e consequências

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Rei

Era um sábado, dia vinte de Julho e ninguém tinha falado nada sobre a exposição que Suri me deu na quinta-feira.

Mas não falar nada não significava que estavam normais comigo. As pessoas ainda me olhavam torto e cochichavam quando eu passava. Essa situação no ambiente de trabalho era péssima e só me deixava cada vez mais temerosa com o meu emprego.

Tinha chegado alguns minutos mais cedo naquele dia e terminava de trancar minha bicicleta no local apropriado quando uma silhueta muitíssimo conhecida passou por mim. Os ombros caídos e encolhidos, como se estivesse com medo de ser vista ou até mesmo de existir. Ergui os olhos e Minako passou em passos curtos e apressados por mim.

Eu a evitava desde a prisão do filho dela. Sempre me senti culpada pelo que aconteceu, mesmo tendo a consciência de que não foi realmente a minha culpa, mas o semblante dela estava muito diferente. Naquele momento, era ela quem me evitava.

— Minako! — a chamei num impulso.

— Ah, oi, Rei — ela sorriu discretamente, mas continuou caminhando.

No curto relance que ela deu para me olhar, percebi o rosto dela machucado. Meus pés se moveram antes que eu pudesse perceber, e quando dei por mim, já estava de frente para ela.

— Tudo bem? — perguntei tombando a cabeça para o lado enquanto ela evitava meu olhar.

— Sim, eu só tô meio apressada — ela sorriu sem graça e eu franzi o cenho. Eu sabia muito bem que o restaurante só abriria bem mais tarde, já que ele quase nunca tinha atividade pela manhã.

— É que faz tempo que eu não te vejo. Você tá... tá tudo bem mesmo? — reforcei a pergunta. Eu sabia muito bem o que tinha acontecido, mas queria que ela me falasse para saber como ajudá-la. Talvez assim eu pudesse pagar a minha dívida com ela. Dívida que só existia na minha cabeça, mas que mesmo assim eu queria quitar.

— Rei...— ela suspirou e ergueu a cabeça, me olhando pela primeira vez.

Eu nunca vi uma alma tão vazia quanto a de Minako naquele momento.

Na verdade, eu vi sim.

Aqueles mesmos olhos vazios e sem vida por trás. Aquela dor inebriante e sufocante. Olhos que gritavam por socorro, mas tentavam te afastar ao mesmo tempo, pelo medo de acabarem te machucando também.

Shuji Hanma tinha os mesmos olhos na noite em que me pediu abrigo.

— Tem visto o Shuji? — ela perguntou com um tom tão preocupado que me fez dar um sorriso triste. Mesmo numa situação tão ruim, ela continuava preocupada apenas com o filho.

— Sim, ele tá se virando — respondi tentando passar o máximo de confiança possível e pude vê-la relaxar um pouco mais.

— Isso é tudo o que eu preciso saber, obrigada — ela sorriu, mas o vazio ainda estava lá.

— Minako — segurei no punho dela instintivamente e engoli em seco — Ele se preocupa com você da mesma forma... e eu também.

Nos encaramos por alguns instantes. Os olhos dela vacilaram, como se uma curta faísca de esperança surgisse bem lá no mais profundo da alma. A semelhança entre eles era absurda!

— Rei...— ela sorriu triste e encarou o chão — Eu nunca te disse isso, mas...— um longo suspiro, seguido da cabeça erguida e os olhos marejados — Teria te criado como minha filha se eu pudesse.

Aquilo me pegou tão de surpresa que eu não consegui nem responder. Fiquei de queixo caído vendo aquele sorriso tristonho, mas ainda sim sincero no rosto de uma mulher que estava destruída por dentro, mas não deixava de dizer coisas bonitas para curar as dores de alguém.

Holy Sin, Shuji HanmaOnde histórias criam vida. Descubra agora