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Unbearable

- Alice Escobar -

- Você nunca se cansa de ser tão completamente insuportável? - Era uma pergunta retórica, então não esperei por uma resposta. - Você tem tanto carisma quanto as entranhas apodrecidas de animais não identificados mortos na estrada.

Menos de um mês treinando com o time de futebol e eu já estava farta de um em especial: Pablo Gavira.

Ouvi um barulho abrupto de chiado e risada e me viro para o som.

Neymar apertava uma mão contra a boca, tentando desesperadamente conter um sorriso. Ele estava balançando a cabeça de um lado para o outro, levantando a mão para se desculpar. E, então, ele explodiu, rindo alto, roncando enquanto tentava disfarçar o barulho.

- Desculpe - ele disse, apertando os lábios, fazendo que não com a cabeça de novo. - Não é um momento engraçado. Não é. Não estou rindo.

Pablo parecia gostar em saber que eu queria dar um soco no rosto de Neymar.

Aquele garoto era realmente irritante. Ele sempre tentava se aproximar e tentava arrancar informações. Eu sabia quais eram suas reais intenções: me levar para a sua cama. E esse era um dos motivos que me fazia impedir sua aproximação, mas ou ele era burro ou era muito insistente, porque nunca aceitou meus foras.

Aquele garoto sabia me tirar do sério e parecia gostar muito daquilo, eu, por outro lado, odiava.

- Não precisa de toda essa marra, Alicinha. - Um sorriso convencido estava estampado em seu rosto. - Nós dois sabemos como isso vai terminar, então por que não aceitar tudo logo?

- Primeiro encanto. - Seu sorriso só aumentou. Ele achou que eu ia baixar a guarda mesmo? - Depois desencanto. Por fim, cada um pro seu canto.

- Ouch! - Ele levou sua mão ao coração e fez uma falsa expressão de ofensa. - Usando frase pronta do Google contra mim? Assim eu realmente fico ofendido.

- Muito bom saber, tenho muitas separadas para você. - Disse e me preparei para sair de perto daquele adolescente o mais rápido possível. Falhei.

- Temos que ter cabeça aberta para o mundo, Ali. - Mais um apelido, sério? - Eu sou cabeça aberta, posso te ajudar a ser também. - Revirei meus olhos. - Sou um ótimo professor.

- Tem gente que diz ser cabeça aberta... E deve ser verdade. - Sorri amigavelmente, sabendo onde aquilo acabaria. - Tão aberta que o cérebro aproveitou e pulou fora.

Meu sorriso amigável se transformou em um sorriso vitorioso. Pensei que, pelo menos por ora, ele me deixaria em paz. Seu ego havia sido ferido e ele só voltaria a me atormentar depois de concertar os machucados.

Não tinha como eu estar mais errada.

- Eu gosto disso. - Ele soltou.

Eu já tinha virado as minhas costas e estava caminhando até Neymar, que se afastou quando começou a ter aquela crise de risos.

Acabei me virando de volta para escutar o que ele tinha a dizer, talvez fosse interessante. No fundo, eu esperava apenas estar perdendo tempo e paciência.

Com um olhar eu pedi que ele prosseguisse e ele o fez.

- Gosto que você usa sarcasmo e ironia como método de defesa. - Percebi que ele começou a caminhar para perto de mim. - Você é atacante, deve ser por isso que ataca tanto com palavras.

- É como dizem, a melhor defesa é o ataque.

- Já ouvi dizer que a melhor defesa não é o ataque, é o amor. - Ele disse. - O ataque só é a melhor defesa quando a intenção é destruir... Essa é a sua intenção?

Confesso que não entendi o que ele quis dizer. Minha intenção era afastar todos e impedir de se aproximarem, não realmente destruir alguém.

Vejo-o me lançar uma piscadela e caminhar até sua garrafa de água.

Caminhei em direção ao Neymar, pensando no que o garoto havia me dito, tentando entender o que ele estava querendo dizer.

- Algumas pessoas são como vinho: ficam melhor com uma rolha na boca. - Falei para Neymar.

Ele riu. Eu deveria esperar por isso. De todos, ele é o que mais está gostando dessa situação. Ele deveria estar em uma situação muito pior do que a minha para estar se divertindo as minhas custas.

- Eu escutei isso. - Gavi falou.

O jogador mirim estava poucos metros atrás de Neymar, tomando alguns goles de água.

- Foi indireta para mim? - Ele indagou após engolir um pouco de água e começar a fechar sua garrafa d'água.

- Se a carapuça serviu... - Dei de ombros, tentando evitar que outra discussão comece. - Neymar, pensa rápido. - Não dei muito tempo para ele pensar, logo joguei a bola para ele.

Iniciar o treino é um jeito de manter Gavira quieto, sem me encher muito o saco. É o único jeito que eu encontrei para ganhar tempo e restaurar minha paciência.

- Vocês são como cão e gato. - Ouvi Neymar dizer. Ele parecia concentrado no jogo que iniciei e na conversa que ele estava iniciando.

Me reti a apenas revirar os olhos e me concentrar no jogo. Não poderia e nem queria dar mais motivos para que qualquer um dos dois comece a implicar novamente.

- Sabe como dizem, quem briga casa.

A frase me desestabilizou. Senti a pancada da bola enquanto digeriam aquelas palavras. Neymar só poderia estar maluco para falar alguma coisa daquele jeito.

- Você bebeu? - Indaguei, indo em direção a bola que rolou por parte do campo.

Ouvi a risada de Neymar e o vejo balançando sua cabeça negativamente.

- Bate na madeira e vira essa boca para lá! - Reiniciei o jogo.

Neymar continuou rindo por um bom tempo. Desconfio se suas risadas provém de sua fala, da minha reação ou de como o meu rosto está no momento. Ignorei toda a situação e continuei o jogo, imaginando o quão idiota ele devia ser para falar um absurdo desses.

- Eu odeio ele, você sabe. - Ele sabia até o motivo: as tentativas do garoto tentar se aproximar.

Eu tinha muito medo de deixar alguém entrar na minha vida, tinha medo de realmente me importar com alguém e ela ir embora da minha vida, assim como havia acontecido muitas outras vezes.

- Eu... deixei essa pessoa entrar. - Falava para Neymar. - Eu o deixei entrar. - Sentia as lágrimas escorrendo pelo meu rosto. - Eu não deixo as pessoas entrarem. Você sabia disso.

- Lili... - Suas mãos acariciavam meus cabelos escuros.

- O tiraram de mim. - Sussurro. - Eu precisava dele e me quebraram.

Balancei minha cabeça negativamente, tentando afastar aquelas memórias e voltar para o jogo.

Independente do que Pablo Gavira fizesse, eu não poderia deixá-lo entrar na minha vida, não importa o quanto ele tentasse.

- Amor e ódio... Há uma linha tênue. - Falou Neymar.

Eu suspirei antes de respondê-lo.

- Não, não existe uma linha tênue entre o amor e ódio. Na verdade, existe uma Muralha da China armada com soldados armados a cada 6 metros, entre o amor e o ódio.

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