Capítulo VI

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Akemi normalmente negaria, ou queria se convencer de que faria, cuidar de uma pessoa ferida em um mundo pós apocalíptico, mas quando o homem que revelou chamar Arisu pediu suplicante para ajudar um amigo ferido, suspirou e aceitou.


Agora ela caminhava com a dupla masculina temendo ser uma armadilha, a consciência gritando o quanto havia agido como uma garotinha na adolescência quando aceitou se arriscar apenas por uma paixonite passageira.


Ao chegar no esconderijo, subiram um par de escadas antes de chegarem no quarto onde um dos feridos estava. Akemi observou bem o lugar vendo uma mulher sentada em um sofá não muito longe os vendo entrar no cômodo com certa surpresa.


— Vocês acharam um médico — Ela falou impressionada encarando a dançarina que confirmou rapidamente antes de se aproximar — Karube, você também está ferido?


— Ela já tratou meus machucados — O homem falou lançando um olhar rápido para Akemi que rapidamente começou a observar o ferimento de seu amigo — E aí, doutora?


— Eu sou estudante ainda... — Mentiu — E meu nome é Akemi.


Todos ficaram em silêncio enquanto ela habilidosamente arrancava as bandagens malfeitas pelo grupo. O ferimento estava dando sinais de piora, talvez tenha afetado um tecido mais profundo do que conseguia ver e isso a preocupava.


— Eu não tenho certeza, mas parece ser uma queimadura de segundo grau — Ela suspirou puxando sua bolsa para pegar os remédios que usaria para tentar tratar os ferimentos — Eu vou limpar, fazer um curativo e deixar uma caixa de remédios... Mas não tenho certeza de que isso vá funcionar, não sem equipamentos adequados.


— Você tem os remédios? — Arisu não se abalou, a esperança vazando por sua voz afetando a postura de Akemi que tomou um lado mais tímido— Você anda tão preparada assim?


— Sim, eu tenho sim... Eu... Me preparei para casos parecidos...— Ela tirou da bolsa um pequeno saco de gaze novo, uma pequena garrafa com um líquido que se tratava de soro fisiológico, uma pomada a base de sulfadiazina de prata e o remédio (cloridrato de tramadol que ela certa vez leu em um artigo sobre o seu uso em alguns casos de queimadura) que entregou para Arisu segurar — O que fizeram?


— Fizemos? — A mulher perguntou observando com atenção tudo aquilo.


— Sim, depois dele se queimar — Akemi parou para a encarar nos olhos, a mulher engoliu em seco diante da forma como foi encarada. A estudante era de fato muito fria sem sequer perceber — Como trataram o machucado dele?


— Eu só fiz um curativo em volta do machucado — Akemi a encarou questionadora — Eu não sabia se tinha de passar alguma coisa na ferida.


— Então você fez uma caminha quentinha para algum microrganismo? — Ela suspirou abrindo o pote com o soro derramando sobre a ferida em grandes doses — Certo, eu vou passar uma pomada então eu peço que aguente firme a dor.


Sem muitos recursos, Akemi lavou as mãos com o resto do soro fisiológico antes de usar uma das mãos para depositar o conteúdo pastoso sobre os dedos os depositando na ferida distribuindo uma camada generosa. O homem a sua frente emitiu um som doloroso, mas tentou não se mexer durante todo o processo.


— Isso você aplica todas as vezes que for trocar o curativo — Ela ofereceu a pomada para a mais velha com um sorriso mais acolhedor do que sua fala anterior — E o remédio deve ser...


Ela puxou a bula lendo bem antes de suspirar. Tudo era incerto, mas seria melhor tomar algo do que deixar essa dor continuar — a cada quatro horas.


— Como vamos contar o tempo? — Karube questionou recebendo um balançar de ombros, sem muita importância — Horas...


— Acabei — Akemi suspirou depois de ter finalizado seu primeiro, mas satisfatório, curativo oclusivo com boas e firmes camadas de bandagens — Entendeu como faz?


— Não parece difícil, mas ele ajuda? — A mulher questionou sem desviar os olhos de como Akemi fazia, ela sabia que a dançarina não iria ficar no grupo, estava óbvio pela forma como reagia a proximidade de todos.


— É pra não ter infecção... Serve para diminuir a perda de calor e fluidos... Tipo uma segunda pele — As informações vinham, de uma forma mais técnica e tinha de se esforçar para transformar em algo fácil de entender — Certo, eu vou indo.


— Não vai ficar no grupo? — Arisu perguntou vendo-a arrumar sua bolsa a jogando nos ombros — Seria bom ter um médico com a gente, Akemi.


— Prefiro jogar sozinha — Ela falou tentando ser gentil enquanto caminhava até a saída — Não quero chorar por ter perdido um amigo.


♠ — ♠


A mulher olhava de um lugar distante o grupo conhecido partir, não sabia o motivo de estar gastando seu tempo ali, parada, vendo-os se afastarem de seu esconderijo enquanto seu coração pesava no peito. Ninguém carregava uma bolsa ou algo que demonstrasse que não voltariam para o esconderijo, logo ela os esperaria retornar.


Talvez um instinto tenha sido acionado, algum sentimento mais familiar que desse a ela a real necessidade de saber sobre o paradeiro e estado daquele pequeno, mas unido grupo. Akemi se sentou tentando pensar no que poderia estar a segurando ali, lembrou que certa vez uma colega disse que nos seus primeiros meses como enfermeira em um grande hospital ela sempre queria saber sobre o estado dos pacientes que atendia.


— Deve ser isso — Suspirou frustrada enquanto sua mão esquerda apoiava seu rosto cansado — Quando eles chegarem eu vou embora.


Mas eles não voltaram, nem depois da lua chegar ao topo do céu ou quando o sol apareceu no horizonte. Uma única lágrima desceu por seu rosto enquanto a realidade novamente batia na porta e esfregava a crueldade daquele mundo sobre sua face.


— Descansem em paz — Ela disse antes de jogar sua bolsa sobre os ombros e partir sem rumo. 

Raposa | Shuntaro ChishiyaOnde histórias criam vida. Descubra agora