Capítulo XIX

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O ronco do motor era o único som que seu cérebro precisava processar, o movimentar do automóvel que passava pelas ruas agora irregulares pelo abandono da espécie humana poderia vez ou outra causar certo desconforto, mas nenhum dos dois abriu a boca para falar sobre isso. Akemi escutou quando o carro diminuiu a velocidade logo parando, mas sem as luzes ou barulhos típicos da Praia, ela logo se sentou chamando a atenção do loiro que abria a porta do carro.


— Vai fugir? — Ela perguntou com a voz rouca, os olhos frios e solitários o encarando sair.


— Não sem as cartas —Respondeu aos poucos se afastando do carro — Já volto.


Akemi se jogou novamente no banco, os músculos molengas como se fossem apenas água, o estômago revirado em ânsia e no fundo uma leve dor persistente. Sua cabeça doía, os olhos querendo a todo instante se fechar, mas enquanto ele não voltasse, a mulher estaria totalmente vulnerável.


Chishiya abriu a porta do carro jogando uma sacola no banco do seu lado se sentando. Sem dar a partida, ele vasculhou dentro da sacola em busca de uma caixa de remédios que havia pegado e, destacando um dos comprimidos da embalagem, logo abriu a garrafinha para tomar.


— O que é isso? — Akemi questionou levemente curiosa, o corpo ainda jogado no banco enquanto os olhos iam até a figura masculina que novamente voltou a puxar da sacola algo que dessa vez foi jogado em sua direção. Olhando melhor, era uma caixinha de lentes de contato — Droga, eu esqueci que estava sem.


— Imaginei — O gato branco estava inerte em pensamentos, a voz sem muita importância para qualquer coisa que saísse dos lábios da mulher atrás dele.


— Por que pegou isso?


— Vai estragar o plano se aparecer na frente do Chapeleiro sem a lente — E dando partida no carro, voltou a estrada originalmente pertencente ao caminho que deveriam fazer.


— Nossa, meu olho é tão chamativo assim — Ela brincou abrindo calmamente a caixinha individual que seria do olho direito notando a cor exata — Oh, você pelo menos conseguiu acertar a cor.


— Não é tão difícil escolher uma lente — O som do motor era um pouco mais alto que sua voz, mas a dançarina mesmo assim conseguiu escutar.


— Meu olho é tão estranho assim — Akemi avançou em direção do espelho retrovisor interno vendo Chishiya se afastar para que os dois não tivessem contato — Ei, eu não vou transmitir doença pra você não.


— Seu olho direito parece de vidro — A mulher piscou algumas vezes para que a lente acompanhasse sua íris verde escondendo a cor.


— Vidro? Que descrição mais rude, Chishiya — E levando as mãos até a sacola, pescou a caixa aberta notando ser remédio para dor de cabeça. Sem sequer pedir, tomou a garrafinha que estava pela metade e se afundou no banco vendo o olhar de nojo que o homem lhe dava pelo retrovisor — O que foi?


Akemi destacou o comprimido e abriu a garrafinha dando longas goladas antes de secar os lábios molhados com as costas de sua mão direita. Os olhos vagaram para o horizonte enquanto suspirava torcendo que logo o efeito começasse.

Raposa | Shuntaro ChishiyaOnde histórias criam vida. Descubra agora