Capítulo 35

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Ouço a risada de uma criança. Abro os olhos e me vejo no palácio, em Ignis. No jardim dos fundos. Olho em volta e encontro dois homens idênticos a Felipe, com os cabelos negros e olhos verdes conversando sérios. Logo um garoto pula da janela do castelo e grita enquanto caia em cima de um dos moços, o fazendo cair e espalhar os papeis que estavam em sua mão.

- Te assustei, papai? - O garoto loiro tinha os olhos verdes brilhantes e dentes afiados.

- Lógico, filho. Você está ficando bom.

- Sora, Felipe, parem de brincar, temos muito o que resolver.

O homem que estava de pé fala de forma ríspida, me surpreendendo. Era idêntico ao Felipe!

- Pare de ser carrancudo, Kai. – Retruca o irmão.

- Mamãe disse que o titio vai ficar com verrugas mais cedo. - Fala a criança e o pai ri alto.

- Este é mesmo seu filho, Sora! Agora vamos. Temos muito trabalho. - Fala o tio enquanto pega o menino e o ajuda a levantar.

- Não! Você prometeu brincar comigo, papai!

O pai se ajoelha na frente do filho, que estava com um bico fofo, antes de pegar sua coroa no chão e colocar na cabeça do pequeno.

- Um dia, você será rei, e precisará ser forte e responsável por todo seu povo. Enquanto isso, este é meu dever.

- Eu vou poder sair do palácio, papai?

O rei troca olhares com o irmão, parecendo preocupado e sorri torto para a criança.

- Sim... Filho. Algum dia. Quando você for maior.

- Poderei fazer amigos... E conhecer a feira finalmente... E... E...

O pai se levanta enquanto suspira alto e fica sério enquanto pega a coroa na cabeça do filho e a coloca em si.

- Algum dia, Filho. Algum dia.

Fala e volta a andar, deixando a criança para trás um pouco triste. Ele pareceu se lembrar de algo e corre para dentro do palácio. Eu decido segui-lo e fui até alguns andares acima, entrando em um quarto que ele entrou.

-Mamãe, mamãe! Eu consegui! Eu consegui assustar o papai.

Entro e encontro a linda moça da estátua da praça. A última rainha antes de mim. A mãe de Felipe. Ela tinha um enorme cabelo loiro, como linha de ouro e os olhos caramelos brilhantes e tristes. Sua pele era pálida e seus olhos fundos e cansados, mas ainda assim, sorria para o garoto animado.

- Que bom, meu filho. Não atrapalhou ele não, certo?

Ele gagueja e ela sorri.

- Você não para mesmo, não é meu filhote.

Fala o abraçando. Ela estava sentada, perto da janela e logo olhou para mim. Olho para trás e percebo que não tinha ninguém, volto a encará-la e a mesma sorri... Como se estivesse sorrindo para mim.

- Consegue me ver? - Pergunto e ela abraça mais forte Felipe até ele reclamar.

- Mamãe.

Ela o solta e sorri.

- Desculpa, querido.

- Já ia esquecendo. Papai disse que algum dia eu vou poder sair do palácio. Podemos ir juntos. Vamos poder ver a praça, a feira dos aldeões, comer muitos doces e eu vou fazer muitos amigos! - Fala ansioso e ela volta a me encarar novamente.

- Sei que vai, querido.

O menino olha para mim e faz careta.

- O que você tá vendo, mamãe?

- Sua felicidade, meu pequeno.

Fala e me assusto. Me aproximo, mas tudo fica preto. Ouço gritos e choros e depois vozes.

- O rei morreu em batalha, minha rainha. Eu sinto muito.

- Salvem o novo rei, Kai. Que Gaya guarde o novo imperador por toda eternidade!

Tento tampar meus ouvidos com tantas vozes, mas estava cada vez pior.

- Seja forte, seja temido! Você é um monstro poderoso, então precisa ser temido!

- A rainha faleceu.

Um sussurro.

- Sabe do que?

- Dizem que foi doença, mas todos que a serviam dizia o quanto ela estava triste desde o nascimento do príncipe. Dizem que ele é um híbrido.

- Que horror! Deve ser um monstro!

- Monstro! – Alguém grita.

- Não... – Falo baixo. – Não é verdade.

- Seja forte. Seja temido! - Novamente a voz do rei grita para mim e respiro rápido.

- Para... - Peço baixo e outras vozes.

- O rei morreu envenenado!

- O híbrido o matou. É o que os boatos dizem.

- O príncipe Felipe foi coroado.

- Esse é o fim de Ignis!

- Aposto que foi ele que matou todos da família!

- Ele é um monstro. Nunca sai do palácio.

- Soube que ele sai da mansão para matar a noite.

- Monstro!

- Monstro!

- Monstro!

- Monstro!

- Para! - Grito e ouço um forte rugido antes de abrir os olhos, chorando ofegante.

Percebo que eu tinha voltado ao jardim em frente ao lago e encaro Gaya.

- Por que... Porque deixou que ele sofresse tudo isso?!

Pergunto revoltada e saio de lá sem uma resposta. Eu precisava ficar sozinha e corro até o fim do jardim e sento em uma raiz de árvore e chorava sem parar.

Sua realeza, a FeraOnde histórias criam vida. Descubra agora