Quando tenho certeza que ela já estava distante, abro os olhos e penso o porque que eu fingi estar dormindo para ela. Meus músculos ficaram tensos, querendo abraçá-la, mas me segurei. Eu ainda não conseguia confiar completamente nela, mas meu peito sempre queimava quando ela se aproximava demais de mim.
Ando pensativo até meu quarto e abro a grande porta de vidro de minha varanda e penso em me transformar na minha fera, mas logo desisto ao recordar que eu não lembrava de nada na última vez que fiz isso. Tiro a capa de meus ombros e decido fazer a caminhada com meu corpo mesmo. Pulo da grande torre e caio agachado. Olho em volta não encontrando nenhum soldado e corro, escalando o muro do castelo e caindo no outro lado, na Floresta Verde. Ando sem pressa até o local que eu sempre ia. Uma árvore cortada e velha no meio de tantas outras jovens. Sento no local e olho para cima, deitando na árvore cortada e encarando as estrelas. Respiro fundo e relaxo, me sentindo vazio.
- Parece confuso novamente, pequena fera. – Uma voz de velha fala e logo me levanto, encontrando um esquilo na minha frente.
- Já nos vimos antes, senhora? – Questiono e ela suspira.
- Sim, meu querido. Não faz muito tempo. Estava triste e confuso na última vez, assim como agora, e por motivos parecidos.
- Qual foi esse motivo?
- A moça que mora em seu coração. Não se lembra? – Virou a cabeça e senti que ela estava mentindo.
- Sinto que você sabe de minha real situação, senhora. – Falo desconfiado e ela ri.
- Sim, mas a única coisa que posso fazer para você, é te dar essa flor. – Fala batendo seu pequeno pé no chão e a uma flor vermelha cresce.
Ela o arranca e me entrega. Me aproximo para pegar a flor e vejo seus olhos caramelos escuros, como os troncos das árvores em volta, e seu cheiro, como o pôr do sol. Encaro a flor e sinto-a familiar.
- Eu conheço essa flor. – Comento e ela confirma com a cabeça.
- Só cresce apenas em um reino, na qual você já esteve. – Explica e ouço correntes baterem alto, dentro de minha cabeça.
Flash de cenas embaçadas, sensações quentes e confusas. Solto a flor e me encolho com dor.
- Shi, tudo bem. Apenas respire. – Fala o esquilo e relaxo depois de um tempo.
- Porque... Porque eu não posso lembrar? – Reclamo e ela parecia triste.
- Eu queria tanto te ajudar, querido. Mas essa magia negra foi criada naquele momento. Eu não sei nem se ela tem alguma cura. – Fala com dor na voz e suspira alto, como se segurasse para não chorar. – Mas não dependa do seu passado para criar seu futuro, meu amor.
Fala e levanto a cabeça para encará-la. Seu jeito carinhoso era muito intenso, como se a gente já tivesse sido próximo alguma vez na vida.
- Senhora? – Pergunto ao perceber que ela não estava mais perto de mim.
- Aproveite a chance de se apaixonar novamente, meu querido... – Sua voz soa no vento e me levanto, a procurando.
- Espera! Já nos conhecemos? – Pergunto olhando em volta, mas seu cheiro rapidamente sumiu.
Desisto de procurar e olho para baixo, vendo e pegando a flor vermelha antes de voltar para meu quarto. Ao fechar as portas da varanda, descanso a flor no criado-mudo ao lado da cama e deito, a observando até o sono me atingir.
Acordo no dia seguinte com o sol esquentando meu rosto e suspiro alto, me levantando, tomando um banho no meu pequeno lago artificial e trocando de roupa antes de sair e encontrar dois guardas a espera da entrada do meu quarto, junto com Brian, que me encara neutro com várias papeladas em suas mãos.
- Bom dia, majestade... – Fala, mas logo o paro com um sinal com a mão.
- Antes de tudo, desjejum. Não quero ouvir nada de trabalho neste momento. – Comento sério e começo a andar até a sala de jantar.
No caminho, ouço uma voz cantarolar baixo e, ao virar a esquina, encontro os cabelos longos e castanhos de Cássia.
- Oh, bom dia majestade. – Brian fala um pouco alto e congelo.
Cássia vira para nós com um vestido azul simples e sorri para mim sem mostrar os dentes.
- Bom dia Brian. Bom dia, majestade. – Fala fazendo reverência para mim e desvio o olhar.
- Pare de falar formal comigo. Somos casados, não somos? – Pergunto deixando Cássia e Brian de queixo caído e apresso o passo, os deixando para trás.
Rapidamente chego na sala de jantar, onde a mesa já estava posta. Sento no lugar de sempre e vejo Cássia, com o rosto levemente vermelho, segurando um sorriso, sentando ao meu lado. Após alguns minutos de silêncio que estava começando a me incomodar, Cássia fala.
- Vou visitar as crianças hoje novamente. Gostaria de me acompanhar? – Pergunta um pouco tímida, mas desvio o olhar e foco na xícara em minha mão.
- Não. – Falo direto e a deixo surpresa. – Parece que ainda tenho muito trabalho para fazer, não poderei sair por algum tempo.
Falo tentando não ser ríspido e logo levanto o olhar, a vendo segurar um sorriso.
- Tudo bem, Fe. Acho que seria bom ter uma festa, o que acha? – Pergunta do nada e levanto uma sobrancelha.
- E o que iríamos festejar? – Pergunto irônico, já que não faz tanto tempo que fomos atacados.
- O começo de uma nova era. Quero chamar August e Sebastian com os meninos para a festa desta vez. O que acha?
- August?... – Paro e penso no nome familiar. – O rei dos humanos? – Pergunto não acreditando.
- Sim. – Fala animada. – Você pode não lembrar. Mas ele é nosso aliado desde que o salvamos de uma Celestial estranha e você concertou o domo dele.
- Espera. – Falo e levanto a mão para fazê-la ficar quieta. – Está me dizendo que, além de eu ter entrado em um país que nenhum anima entrou, ainda lutei contra um Celestial?!
Ela prende uma risada e confirma com a cabeça.
- Sei que é estranho, mas temos um amigo em comum que é um Celestial.
- Os rapazes me disseram isso... – Respondo não acreditando. – Me explique, como fiquei amigo de um Celestial?!
Pergunto completamente desacreditado e ela conta a história de como nos conhecemos em seu mundo e como eu conheci um velho chamado Will, que apareceu neste mundo na primeira festa que dei após meu retorno e dançou com ela. Ele apareceu aqui com a aparência de um Celestial. Não um Celestial qualquer, mas o grandioso Mercúrio, aquele que sentiu a ira de Gaya e sumiu por anos após dizimar uma espécie.
Aos poucos, os rapazes começaram a entrar na conversa, acrescentando detalhes que Cássia esquecia e não vimos o tempo passar até um empregado aparecer e limpar a garganta, roubando a atenção de todos.
- Perdoe o incomodo, majestades. Mas o barão Taurus está aguardando na sala de reunião.
Estalo a língua, incomodado. Eu esqueci completamente da reunião, e neste momento eu não queria sair desse ambiente tão calmo e aconchegante. Será que era assim que eu me sentia antes de me esquecer de tudo? Antes de sair, encaro Cássia.
- Soube que esteve fazendo meu trabalho quando estava inconsciente. – Ela confirma com a cabeça. – Então sabe como financiar uma festa, certo?
Ela arregala os olhos e pula.
- Sim! – Responde animada e se segura para não me abraçar. – Não vai se arrepender.
Fala animada e vira, correndo para fora da sala de jantar enquanto grita no corredor.
- Obrigada, Felipe! – Grita e some das minhas vistas.
Suspiro alto e ouço risadas abafadas. Viro para Brian e Lian, que sorriram para mim e voltaram a sua posição correta.
- Está amolecendo novamente, majestade. – Comenta Brian.
- Estamos aliviados em vê-lo assim novamente. – Fala Lian e ambos abaixam a cabeça como reverência e respeito.
Eu era assim com ela?
Apenas ignoro e volto a trabalhar.
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Sua realeza, a Fera
FantasyE se um imperador tirano de um mundo de fantasia viesse para o mundo real? Para salvar seu reino e seu futuro, Felipe, disfarçado de humano, foi jogada para outro mundo a fim de aprender a realidade do mundo moderno. Começando com um quase atropela...