Proposta

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De todas as hipóteses que imaginei, aquela afirmação realmente me surpreendeu. Pisquei os olhos algumas vezes esperando que a qualquer momento ele desse uma risada e esclarecesse que aquilo era uma brincadeira, mas não havia humor em sua expressão. Seus olhos estavam pesados e sombrios, como o de quem passou por tempos difíceis e soube imediatamente que ele estava falando a verdade.

– Bem, acho que essa reunião já pode terminar aqui, né? – Olhei para o Jay, buscando aprovação, mas ele apenas encarava o mais velho com uma expressão indecifrável.

– Vamos ouvir os motivos. – O Jay sugeriu e cruzei os braços fazendo bico como uma criança contrariada.

Apesar de querer sair dali o mais rápido possível, eu já tinha concordado em ouvi-lo, então apenas sinalizei para que ele continuasse. O mais velho encarou o café fumegante a sua frente e pareceu entrar em um túnel para o passado.

– Você se lembra da mãe da Sophie? – Ele perguntou e eu concordei, temendo o caminho que aquela conversa tomaria.

– Lembro, ela era quase tão insuportável quanto a filha. – Resmunguei lembrando de quando a menina desprezível grudou chiclete no meu cabelo.

– Bem, então você deve se lembrar também que sua mãe morria de ciúmes dela, não é? – Owen perguntou e eu dei de ombros.

– Ela tinha ciúmes de todas, até mesmo de mim. – Lembro e ele concorda, dando um pequeno sorriso, sem desviar seu olhar da xícara.

– Bem, no caso dela sua mãe tinha razão. Ela já tinha dado em cima de mim diversas vezes e não aceitou bem minhas recusas. Um dia ela deixou um recado com o vizinho da frente e me atraiu para o trailer dela dizendo que tinha um vazamento de gás. Quando eu cheguei lá a Sophie estava sozinha e poucos instantes depois, a mãe dela apareceu com um policial dizendo que eu estava tendo comportamentos impróprios com a menina e que eu sempre ia lá quando ela não estava. – Ele estava explicando, mas sua voz falhou e quando seus olhos cheios d’água se encontraram com os meus, pude sentir toda sua dor. – Eu nunca fiz nada disso, mas o vizinho que me deu o recado mentiu, dizendo que não tinha recado nenhum e eu não tive como me defender. Fui preso, mas logo me soltaram por falta de provas. – Ele suspirou, enxugando as lágrimas que rolaram pelo meu rosto.

– E porque você não me procurou quando saiu? – Perguntei e ele se inclinou pra frente com os olhos cheios de pesar.

– Eu tentei! Deus sabe como eu tentei, mas sua mãe já tinha sido envenenada por aquelas mentiras e disse que eu nunca mais ia chegar perto de você ou então ela me denunciaria. – Ele explicou e apesar dele parecer estar dizendo a verdade, ainda faltavam muitas peças nesse quebra cabeças.

– Mas espera, como você pode ser meu pai se minha mãe sempre te apresentou como namorado dela e eu só te conheci quando tinha quatro anos? – Perguntei e ele abaixou a cabeça.

– Eu terminei com sua mãe sem saber que ela estava grávida de você e ela nunca me contou sobre a sua existência. Fui saber anos depois e quando te vi, sabia que você era minha. – Ele explicou com um sorriso e não é a primeira vez que esse sorriso me desmontava.

– Quando fui atrás dela, querendo participar da sua vida e ser o pai que não fui antes, ela disse que vocês eram um pacote, que para ter uma eu precisaria aguentar a outra e impôs diversas regras para que eu tivesse contato com você. Uma delas é que eu só poderia revelar que era seu pai no momento certo, mas com isso que aconteceu, esse momento nunca chegou. – Ele explicou e abaixei a cabeça, sem saber no que acreditar.

– Isso realmente é a cara da minha mãe. – Confesso, relutante e ele sinto as mãos dele sobre as minhas me fazendo recuar por instinto.

– Desculpe, eu só queria te garantir que eu sempre quis estar por perto, Joaninha. Sempre amei você mais do que tudo, mesmo que de longe e não posso acreditar que finalmente estou tirando esse peso das minhas costas. – Ele confessou com a mão sobre seu peito, bem acima do coração e meus olhos arderam.

Brincando com FogoOnde histórias criam vida. Descubra agora