Chamado

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Durante todo o caminho para casa me preparei para o sermão que levaria do meu pai, ele nunca costumou pegar leve comigo e depois que o desobedeci e voei para Wyoming com o jatinho da empresa, sabia que isso teria consequências. Parte de mim entendia a preocupação dele, afinal de contas até um mês atrás eu era um irresponsável que não pensava em mais ninguém, mas eu tinha mudado, ou melhor, a Rachel tinha me mudado e eu estava decidido a fazê-lo entender o quanto a Rachel tem me feito bem.

– Pai, está no escritório? – Bati na porta de madeira e quando a abri não havia nem sinal do mais velho.

Após procurar por ele pela casa, encontrei minha mãe na cozinha fazendo Kimchi e pela forma que ela estava cortando as folhas eu sabia que estava nervosa. A faca batia incansavelmente sobre a tábua onde ela cortava as acelgas e por um momento hesitei, sem saber se falava ou não com ela. Desde que eu era pequeno, ela sempre descontou suas frustrações nas tarefas de casa, por isso mesmo tendo empregadas, ela sempre fez questão de fazer grande parte do serviço e a única para quem ela abria mão disso era a Rosita.

– Mãe, meu pai já chegou? – Pergunto e ela nega com a cabeça sem desviar o olhar das tiras de gengibre finíssimas que ela estava cortando.

– Ele disse que não viria para casa tão cedo, mas que você deveria esperar por ele, afinal de contas você tem casa. – Ela engrossou a voz em uma parte da frase e entendi que ela estava apenas o imitando e isso me fez rir, então ela também deu um pequeno sorriso. – Tem tempo que não te vejo em casa, quer experimentar o Kimchi? – Ela perguntou tirando uma tira da acelga apimentada e me deu.

–Que velho louco, disse que me queria aqui e agora não está. – Resmungo e experimento a comida. – Está uma delícia, mas acho que precisa de mais sal. – Instrui sentindo o gosto picante e delicioso em minha boca.

– Está querendo ensinar o padre a rezar a missa? Se eu colocar muito sal agora, depois que fermentar vai ficar salgado demais! – Ela explicou e eu assenti, mas logo ela suspirou massageando o próprio pescoço e fui até ela acariciando seus ombros ao notar que ela parecia cansada.

– Está tudo bem mamãe? – Pergunto e ela pausa, largando a faca sobre a bancada e suspirando.

– Você tem certeza de que quer entrar em guerra com o seu pai? – Ela pergunta e antes que eu possa responder, ela continua. – Digo, ao menos essa menina vale a pena tudo que você está fazendo por ela? – A mais velha pergunta e não preciso nem pensar muito para responder.

– Sim, ela vale. – Afirmo com toda a certeza que havia em meu ser e apoio meu queixo no ombro dela, sentindo ela se aconchegar e a abraço, pois sei que as coisas não devem estar fáceis para ela também, e o fato de eu nem ter parado para pensar nisso, trás uma angústia ao meu peito. – Ela é tudo para mim mãe, eu nem lembro mais quem eu era antes dela e sei que ela é a mulher com quem quero me casar! – Explico com a voz calma e ela se vira, me encarando com o olhar surpreso.

– Casar? Querido, você não é novo demais para pensar em casamento? – A mais velha questiona com um sorriso doce e acaricia meu rosto de forma terna como se eu fosse uma criança.

– Idade não significa nada quando eu sei que quero passar o resto da minha vida com aquela ruiva teimosa. – Afirmo com um sorriso no rosto e ela me encara um tanto chocada.

Seus olhos se enchem d’água e desde pequeno, ver minha mãe triste sempre me destruía, então me aproximo pegando seu rosto em minhas mãos e enxugo suas lágrimas com o polegar.

– O quê houve mãe? Eu disse algo errado? – Pergunto, preocupado e ela nega com a cabeça dando um sorriso, com os olhos brilhando enquanto as lágrimas rolavam por seu rosto.

Brincando com FogoOnde histórias criam vida. Descubra agora